Conheça a rotina de Marcola e outros presos na penitenciária de segurança máxima do DF
De 2019 até início de março de 2021, foram 1.227 movimentações, entre inclusão, transferências e exclusão de presos nos presídios federais
atualizado
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Com penitenciárias construídas em Porto Velho (RO), Brasília (DF), Campo Grande (MS), Mossoró (RN) e Catanduva (PR), o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) cuida dos criminosos mais perigosos do país. Os investimentos e a capacitação de servidores fizeram com que os complexos se tornassem fortalezas e transformassem os presídios em unidades de segurança máxima.
A transferência de presos para o Sistema Penitenciário Federal, do Depen, acontece com frequência por meio de escoltas terrestres e aéreas em todo o país. Desde 2019 até o início de março de 2021, foram 1.227 movimentações, entre inclusão, transferências e exclusão de presos nas penitenciárias federais.
De acordo com o Decreto nº 6.877, de 18 de junho de 2009, para ser transferido para um presídio federal, o custodiado deverá preencher alguns dos seguintes requisitos: ter desempenhado função de liderança ou participado de forma relevante em organização criminosa e ser membro de quadrilha ou bando, além de ter envolvimento na prática reiterada de crimes com violência ou grave ameaça, entre outros.
Assim, estará justificada a migração para o regime mais rigoroso de execução penal, referência no Brasil e em outros países por aplicar devidamente as previsões da Lei de Execução Penal (LEP). Os presos são incluídos no sistema por um prazo de até três anos, podendo sua permanência ser prorrogada quantas vezes forem necessárias com base em indícios de manutenção dos motivos que fizeram com que eles fossem transferidos, a partir de decisão judicial.
“Combater o crime organizado é prioridade do Ministério da Justiça e Segurança Pública. O Sistema Penitenciário Federal é referência em segurança máxima e isolamento de lideranças de organizações criminosas, com grande contribuição para a Segurança Pública do país”, destacou o ministro da Justiça, delegado Anderson Torres. “O isolamento das lideranças das facções criminosas é uma das estratégias do ministério para combater o crime organizado, juntamente com a descapitalização dessas organizações, a atuação conjunta das forças policiais e a destinação de bens apreendidos do crime para o fortalecimento da Segurança Pública”, ressaltou.
Rotina
A rotina de um detento no presídio federal é muito diferente daquela existente nas unidades prisionais tradicionais, à qual o preso estava acostumado. Por isso, ao chegar a unidade federal, o interno inicia um processo imediato de adaptação ao novo cotidiano.
Ao dar entrada no presídio, ele passa ao menos 20 dias em uma cela de inclusão, separada das celas definitivas. Nesse período os policiais penais federais explicam a nova rotina para o custodiado e entregam um documento impresso no qual constam os direitos e deveres do interno.
Na chegada à penitenciária federal, o preso recebe um kit com uniformes, contendo bermuda, calça, camiseta e blusa de frio, além de materiais de higiene pessoal, como escova, pasta de dente, sabonete, desodorante e toalha.
Na fase de inclusão, a equipe de assistência do sistema, formada por profissionais da saúde, avalia todo o quadro clínico do preso, a fim de identificar a necessidade de atendimentos especiais, como restrições alimentares e medicações; além de coletar material para exames laboratoriais. Os procedimentos de saúde também garantem a continuidade de tratamentos que ele fazia antes de chegar à unidade federal.
Nas penitenciárias federais, as visitas são restritas ao parlatório e podem ocorrer, ainda, por videoconferência. O preso tem atendimento de assistentes sociais servidores do Depen. A rotina do custodiado em presídio federal é de acordo com a agenda de atendimentos de saúde, educacionais e jurídicos, de visita e banho de sol.
Veja imagens do dia a dia dos custodiados:
O que estudam as lideranças?
Preso em Brasília, Marcolinha, como é conhecido Alejandro Juvenal Herbas Camacho Júnior – o irmão do líder máximo do Primeiro Comando da Capital (PCC), Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola –, faz curso de direitos humanos. Condenado a 40 anos de prisão, divide com o irmão a liderança da facção paulista.
O criminoso foi um dos protagonistas da fuga do Complexo do Carandiru, em 26 de novembro de 2001. Ele escapou da cadeia com mais 101 detentos por um túnel. Desde então, era um dos líderes mais procurados pela polícia brasileira.
Também na capital federal, Patric Velinton Salomão, o Forjado, faz especialização em atendimento ao público. Indicado por Marcola, Forjado assumiu posto de liderança no PCC entre 2017 e 2018. Sentenciado a 15 anos, cumpre pena por tráfico e associação para o tráfico de drogas, porte ilegal de arma, formação de quadrilha, roubo e homicídio.
Reinaldo Teixeira optou pelo mesmo curso que Forjado. Apelidado de Funchal, tem condenação superior a 66 anos. Ele foi o autor do homicídio do juiz Antônio José Machado Dias, em 2003, segundo o Ministério Público de São Paulo.
Cláudio Barbará da Silva, outro integrante da cúpula do PCC, faz curso de inglês. Nas ruas, exercia função de confiança. Contava com um elevado poder de decisão e chegou a determinar ataques em diversos estados.
Antônio José Müller Júnior, o Granada, dedica-se a aprender direito constitucional. Condenado pela Justiça de São Paulo a 30 anos de prisão por corrupção ativa e pelo fato de integrar o PCC, ele é considerado membro da alta cúpula da facção criminosa paulista. De acordo com o Ministério Público de SP, cabia a Granada coordenar o “conselho deliberativo” do grupo.
Condenado a uma pena que ultrapassa 300 anos, o líder do PCC concluiu um curso na área de saúde e também dedica o tempo na prisão à leitura de livros. No ano passado, Marcola leu a saga As Crônicas de Gelo e Fogo. Ele concluiu os três livros escritos por George R. R. Martin. A narrativa serviu como base para a série Game of Thrones (A Guerra dos Tronos).
Segurança
O detento do sistema prisional federal tem seis refeições ao dia, que é balanceada de acordo com as necessidades nutricionais de cada um. Consiste no desjejum, lanche da manhã, almoço, lanche da tarde, jantar e ceia. Todas servidas no turno previsto para o seu consumo e de acordo com restrições alimentares, conforme prescrições médicas, ou religiosas ou culturais.
Nas unidades prisionais, há câmeras de monitoramento em tempo real, além de policiais penais treinados constantemente para garantir a segurança de todos os envolvidos durante os procedimentos. Ainda como forma de garantir essa segurança, sempre que há a necessidade de sair das celas, os presos são informados verbalmente que passarão por revistas visuais.
Após a inclusão, ele será alocado em uma ala de vivência. As celas são individuais e há colchão, mesa de estudos, cama com jogo de cama completo e banheiro. Durante o banho de sol, toda a movimentação é acompanhada também por videomonitoramento.
Confira detalhes:
Saúde e educação
Quanto aos atendimentos de saúde, uma equipe composta por médico clínico geral, psiquiatria, enfermeiro, técnico em enfermagem, auxiliar de saúde bucal, psicólogo, odontólogo e farmacêutico realiza os procedimentos de acordo com agenda diária e na unidade de atendimento básica de saúde que há dentro da penitenciária federal.
Caso o custodiado queira solicitar algo, como um atendimento de saúde ou reposição de kit higiene ou uniforme, ele pode fazê-lo por meio do preenchimento de um requerimento.
As atividades educacionais também estão presentes no modelo prisional federal. São ofertados conteúdos da educação básica (alfabetização, ensino fundamental e ensino médio) na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA), bem como ensino profissionalizante, com acompanhamento de pedagogos, servidores do Depen. Os pedagogos também verificam o grau de escolarização para a inclusão de atividades.
Dentro da cela, é permitido que o preso mantenha os livros pedagógicos, de acordo com as matérias que está estudando na educação normal; um livro religioso, revista ou um livro da biblioteca, que pode ser utilizado para produção de resumos que servem para remição de pena. Até as 18h, todas as atividades do custodiado fora da cela são finalizadas, salvo casos emergenciais.
As cinco penitenciárias federais são equipadas com bibliotecas que disponibilizam milhares de obras literárias. A cada resumo de obra literária entregue pelo preso (obra lida e resumida), com aprovação do juiz corregedor, são reduzidos quatro dias de pena do condenado, com a limitação de até 48 dias de pena por ano.
Segundo dados do Depen, desde a implantação do sistema, já foram realizadas aproximadamente 3.500 matrículas de presos em cursos de iniciação profissional, alguns realizados em parceria com o Senai, com a oferta de mais de 20 cursos, como educação ambiental, empreendedorismo, legislação trabalhista, segurança do trabalho, tecnologia da informação e comunicação, propriedade intelectual, higiene de alimentos, confecção, química, logística e a cadeia de suprimentos, eletroeletrônica, celulose e papel, automação e sustentabilidade ambiental. É nesse contexto que os líderes de facções criminosas no país dedicam parte do dia em cursos.