Cobra criada? Donos de serpentes legais no DF repudiam tráfico de animais
É possível ser proprietário de cobras no DF de maneira legalizada. Há vários criadouros no Brasil autorizados pelo Ibama com certificado
atualizado
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A polêmica envolvendo o estudante de veterinária Pedro Henrique Santos Krambeck Lehmkuhl, picado por uma Naja kaouthia e suspeito de integrar um esquema de tráfico de animais, chamou atenção pela quantidade e variedade de espécies de cobras ilegais que estavam sendo criadas no DF. Isso não significa, no entanto, que é proibido criar serpentes na capital.
Desde que com procedência comprovada em revendedores autorizados pelo Ibama, um animal não peçonhento pode ser cuidado como animal de estimação.
O biólogo Christian Lucas Américo, 22, é um desses apaixonados pelos répteis. Desde pequeno fascinado por esses animais, com 12 anos ele ganhou a primeira jiboia da Amazônia. “Sempre tive muita curiosidade com relação a esses animais. Era uma paixão”, conta.
Com a oportunidade de criar e ter de perto uma serpente em casa, o respeito só aumentou. “Quando pude pegar e entender melhor a vida delas, passei a defender ainda mais os animais”, relata.
Tanta vontade de acompanhar as cobras fez com que Christian comprasse mais uma jiboia da mesma espécie no fim de 2016. Hoje, na casa dele, são duas serpentes: uma de dois metros e outra de 75 centímetros.
“Elas ficam em um terrário com cerca de 2 m². Tem galho para ela se enroscar e uma placa para se aquecer, uma vez que os répteis não produzem o próprio calor. De vez em quando, eu também abro a porta e deixo elas passearem em casa um pouco”, explica.
A alimentação, diz o biólogo, é mais fácil que em relação a gatos ou cachorros. O grande diferencial está na frequência que serpentes precisam comer. “Geralmente, isso acontece uma ou duas vezes por mês. Compro ratos abatidos e dou para elas. Depois disso, elas também defecam ou urinam só uma ou duas vezes e pronto”, aponta.
Para ele, não faz sentido dizer que gosta dos animais e não garantir que eles tenham sido criados de forma legal. “Com certificado, você garante que outras cobras dessa espécie que você compra continuem na natureza, sem o prejuízo”, defende.
Proibidas
Outro apaixonado por serpentes que faz questão de ter os animais legalizados é o estudante de veterinária Rafael Lacerda, 19. “Desde o início da criação, eu vi a possibilidade de se conseguir alguma cobra proibida. Chegaram a me oferecer uma cobra do milho (corn snake). Ao ver que era proibida, não quis. Para mim, compactuar com o tráfico é contribuir para a extinção de animais”, opina.
Dessa forma, ele preferiu ir atrás de uma jiboia arco-íris da caatinga em 2015. E, em 2018, obteve uma jiboia da Amazônia. As duas contam com certificado de procedência e nota fiscal. “A variedade de coloração, a personalidade das cobras, o jeito que elas se comportam: tudo isso me chama a atenção”, conta o estudante.
As duas cobras têm cerca de 1,70 metro cada uma. Também criadas em um terrário com espaço e possibilidade de se aquecerem, a diferença da criação entre Rafael e Cristian está na alimentação. “Prefiro eu mesmo criar os ratos e dar vivo para elas matarem e comerem. Creio que seja uma dieta mais equilibrada para elas”, pondera.
Cobras precisam de cuidados especiais
A médica veterinária Luisa Gonçalves cuida de pelo menos 10 cobras regularmente no DF. Acostumada a doenças e problemas que as serpentes podem apresentar, ela destaca que é importante pesquisar sobre os hábitos de cada espécie antes de comprar. “É necessário ver se dentro da casa tem espaço e condições de se montar um terrário ou uma caixa que reproduza o habitat natural delas”, destaca.
A falta de um pote com água, por exemplo, pode causar uma dermatite nas serpentes. “Mesmo que ela não esteja consumindo a água com frequência, o importante é ter lá para manter a umidade do ambiente”, diz. Outro ponto importante é dispor diferentes superfícies, uma vez que a troca de pele é feita quando ela se esfrega em outros lugares.
Luisa também recrimina a prática de tráfico de animais ilegais, alertando para o perigo que é manter cobras tanto da fauna brasileira como de outros lugares do mundo. “Se ela é nativa, mexe com o bioma. Se não for pode trazer uma doença que não existia aqui”, lamenta.
Fiscalização no DF
Apesar de não ter registro de quantas cobras são criadas atualmente no DF, o Brasília Ambiental (Ibram) é o órgão responsável por emitir licenças para a criação de animais silvestres na capital. Segundo representantes do órgão, a falta de dados se justifica por não haver criador autorizado para comercializar o animal na capital.
Dessa forma, o Ibram atua para combater a manutenção de serpentes ilegais. Conforme divulgado em nota sobre o assunto, o instituto informou que “não é emitida nenhuma autorização para criação de serpentes peçonhentas com finalidade de estimação. Porém, cabe destacar que criar uma serpente como animal de estimação é permitido no Brasil, desde que cumpridas as exigências dos órgãos de controle de fauna”.
Cobras venenosas só são autorizadas em casos específicos. “Desde que para finalidade diversa à de estimação, como para pesquisa, exposição em jardins zoológicos, extração de veneno para produção de soro antiofídico ou venda de matéria prima para indústria farmacêutica, por exemplo”.
De acordo com o diretor de fiscalização responsável pela fauna e maus tratos a animais do Brasília Ambiental, Victor Santos, o trabalho deles tem acontecido de maneira a reprimir a criação irregular. “Normalmente, denúncias de vizinhos ou conhecidos nos ajudam bastante”, pontua.
Para não sofrer com a fiscalização, basta comprar a cobra de um local licenciado pelo Ibama e manter nota fiscal e certificado de origem. “Dessa forma a gente confere os dados e não haverá problema nenhum”, explica Santos.