Clubes abandonados no DF viram ameaça sanitária com epidemia de dengue
Clubes luxuosos abandonados no centro do DF contam com ambiente propício para a reprodução do mosquito Aedes aegypti, que transmite a dengue
atualizado
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Empreendimentos luxuosos abandonados — que, antes, abrigavam restaurantes, salas de cinema e piscinas olímpicas — transformaram-se em grandes acumuladores de focos de dengue no Distrito Federal. Os espaços negligenciados no centro da capital do país contam com mata alta, lixo descartado de forma irresponsável e muita água parada.
Um dos mais conhecidos é a Academia de Tênis José Farani, conhecida como Academia de Tênis de Brasília, que fica no Setor de Clubes Esportivos Sul (SCES). Abandonado desde 2010, o local contava com quatro piscinas, 10 salas de cinema, 21 quadras de tênis e um hotel com 200 quartos e chalés que receberam muitas autoridades no passado. Atualmente, o ponto virou um abrigo para mosquitos e pequenos animais.
A Academia de Tênis de Brasília fica entre um conjunto de prédios com pequenos apartamentos e o Palácio do Jaburu, residência oficial do vice-presidente da República. Os problemas começaram em 2005, quando José Farani, proprietário do local, foi condenado pelo Tribunal Regional Federal a pagar uma dívida estimada em R$ 100 milhões. Entre disputas judiciais, escândalos e acusações de fraudes, Farani adoeceu e morreu três anos depois. O local luxuoso foi vendido para uma empresa e está inativo desde então.
Ao lado da antiga academia, também está localizado o Clube de Caça e Pesca de Brasília (Capeb) que apresenta vários indícios de abandono. Além da entrada cheia de mato alto, há também piscinas antigas que possuem água parada.
O antigo Clube dos Servidores tem placas caindo aos pedaços, piscinas com buracos esvaziados e um matagal. Além disso, imagens mostram que o telhado de boa parte das construções não existe mais e, com as intensas chuvas, há diversas poças de água.
Ao Metrópoles frequentadores dos espaços ao lado comentam que o clube apresenta indícios de abandono há cerca de 20 anos. Eles lamentam que um espaço com potencial para gerar lazer para a população tenha se tornado em “um berçário para os mosquitos”.
O Clube do Servidor fica a poucos quilômetros dos imóveis funcionais da Universidade de Brasília (UnB), que abrigam professores, servidores e estudantes. Em dezembro do ano passado, os habitantes da região já denunciavam uma explosão de casos de dengue na área. Na época, um porteiro apontou que o clube favorece a proliferação do inseto que ameaça a saúde pública.
O Clube da Imprensa é outro ponto que preocupa por possuir focos que possibilitam a multiplicação de Aedes aegypti. A localidade está à beira do Lago Paranoá e, apesar de ter algum movimento de trabalhadores, abriga piscinas cheias de água parada, mato alto e lodo.
Clube preocupa moradores de Taguatinga
Onilda Aparecida Gonçalves, de 62 anos, mora em Taguatinga Sul há seis décadas e se recorda da importância do Clube Primavera para a comunidade. Agora, ela e outros moradores estão preocupados com o abandono do local: “Lógico que dá medo. O rapaz aqui ficou duas semanas na UTI com dengue. Está se recuperando. Tem aqui outra casa com três [infectados com dengue]. A senhora só não está internada porque não tem vaga nos hospitais. A gente está querendo limpar, mas eles não deixam”.
A mulher comenta que a rua localizada de frente para o antigo clube sempre teve pessoas com dengue, mas neste ano há mais pessoas com a doença. “Dizem que lá no clube, lá dentro, onde tinha as piscinas, tem um buraco cheio de água. O pessoal aqui da rua, se liberasse para gente entrar pra dar uma olhada, poderia até limpar e aliviar a situação, mas falam que não pode entrar”, afirma Onilda.
As operações pararam nos anos 1990. A Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal (Terracap) retomou a propriedade que, aos poucos, virou um campo de ruínas, piscinas vazias, construções que servem de abrigo para moradores de rua, mato equivalente a uma área do tamanho de cinco campos de futebol.
Em 2015, o terreno chegou a ser utilizado pelo próprio GDF para abrigar integrantes do Movimento Resistência Popular (MRP), depois que eles saíram do Hotel Saint Peter, na Asa Norte. Cerca de 80 sem-teto permaneceram na área por 30 dias.
Desde 2016, a Terracap busca iniciar um plano de recuperação de áreas degradadas ou alteradas para a área do antigo Clube Primavera. No entanto, os moradores não viram mudança nos últimos anos.
Segundo Rita Barreto, 53 anos, o carro do fumacê também não passa na rua há alguns anos, o que acaba piorando ainda mais a situação. “Eu gostaria que as autoridades olhassem para essa questão do clube com respeito mesmo, porque não depende mais da gente, não é só da gente, depende deles também, a consciência de todos”, afirma a moradora de Taguatinga.
Procurada pela reportagem, a Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF) informou que alguns desses clubes são pontos estratégicos da vigilância ambiental, pois, como estão sem uso, precisam de um monitoramento com inspeção a cada 15 dias.
Denúncias de focos
Desde o início de fevereiro, o Governo do Distrito Federal (GDF) disponibiliza canais de atendimento para que a população denuncie possíveis locais que sejam foco do Aedes aegypti. O mosquito é o transmissor da dengue, doença que está em alta no Distrito Federal.
O cidadão que identificar locais com água parada ou com entulhos acumulados pode ligar nos telefones 199, 162 e 160.
Em entrevista ao Metrópoles, nessa quarta-feira (7/2), o secretário-chefe da Casa Civil do DF, Gustavo Rocha, contou que, desde a semana passada, a Secretaria de Proteção da Ordem Urbanística (DF Legal) faz uma operação para entrar em 79 prédios embargados por irregularidades e furar as lajes para escoar água.
Epidemia de dengue no DF
Até o último sábado (3/2), o Distrito Federal registrou 47.417 casos prováveis de dengue. Até o momento, a Secretaria de Saúde confirma 11 mortes.
Dos 11 mortos confirmados por dengue no DF em 2024, até o momento, oito são homens; três, mulheres. Morreu uma criança entre 5 e 9 anos, um adolescente de 15 a 19 anos, e três adultos de 20 a 49 anos.
Outras três vítimas da dengue na capital do país tinham entre 70 e 79 anos, duas eram da faixa etária de 60 a 69 anos e uma tinha 80 anos ou mais.