CGU apura pedalada, distorção e conflito no Fundo Constitucional do DF
Auditoria anual realizada pela Controladoria-Geral da União nas contas de 2017 identificou problemas na gestão do montante de R$ 12,83 bi
atualizado
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Uma das principais fontes de recursos da capital da República, o Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) foi alvo de auditoria anual de contas da Controladoria-Geral da União (CGU). O órgão decidiu investigar a gestão das verbas em 2017 e encontrou falhas, como distorção em demonstrativos contábeis, falta de transparência, bloqueio inadequado de créditos e remanejamento indevido de pagamentos, a famosa “pedalada”.
Só no ano investigado, foram executados R$ 12,83 bilhões do FCDF – criado com recursos da União para subsidiar a Segurança e prestar assistência financeira à Saúde e Educação local –, o que representa cerca de 38% do total das receitas públicas aplicadas na cidade. No entanto, para a CGU, a gestão de todo esse valor está sob suspeita devido à “falta de clareza na estratégia do fundo e o conflito de competências no controle dos órgãos e dos recursos disponíveis”.
“A efetividade da gestão do FCDF tem sido comprometida devido à ausência de um sistema de governança formal para o Fundo, havendo necessidade de melhoria regulatória e na divulgação de informações relevantes para a sociedade (princípio da transparência)”, aponta a Controladoria em suas conclusões.
Segundo a CGU, diversas unidades do Governo do Distrito Federal (GDF) têm ingerência no processo. Aliado a isso, não há definição dos papéis de cada um dos órgãos executores e fiscalizadores locais e federais, “o que poderia evitar duplicidade de esforços, retrabalho e ineficiência administrativa”.
Um dos problemas encontrados pela Controladoria foi a distorção nos demonstrativos contábeis relativos às contribuições previdenciárias dos servidores da Polícia Civil (PCDF). De acordo com o relatório, há uma diferença de R$ 140,6 milhões nas contas devido à falta de registro desses recursos como receita do fundo.
Em vez de seguir o modelo de contribuição da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros, que é feito por meio de guia de recolhimento da União (GRU), a contribuição da PCDF é recolhida através de documento de arrecadação de receitas federais (Darf). Com isso, a verba é contabilizada diretamente como receita do Tesouro, descumprindo decisão do Tribunal de Contas da União (TCU). “Contribuições previdenciárias deverão ser alocadas em rubrica própria e terão finalidade específica atinente ao custeio de aposentadorias e pensões das Forças de Segurança”, diz o relatório.
Pedaladas
Outra falha na execução do Fundo Constitucional apontada pela CGU está na postergação de lançamentos de um ano para o outro. “Verificou-se um elevado montante de despesas de exercícios anteriores no primeiro mês de cada exercício decorrente de pagamentos realizados em janeiro relativos à folha de pessoal do mês de dezembro do ano anterior, sendo que, em alguns casos, o pagamento não se deu como reconhecimento de dívida, mas sim como despesa do próprio exercício”, denuncia.
A prática de empurrar as contas de um exercício para o outro é conhecida como pedalada. Segundo a Controladoria, a medida camufla as despesas reais do ano e causa distorção na aplicação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). De acordo com o GDF, a manobra sempre foi realizada, desde a criação do fundo, em 2002.
Além dos problemas apontados, a auditoria também questionou os bloqueios de créditos para as forças de segurança realizados pela Secretaria de Fazenda. Segundo os controladores, os contingenciamentos de cerca de 30% das despesas de custeio e investimentos para a área “impactam as atividades de segurança pública”. Esse montante foi utilizado para a folha salarial da Educação e da Saúde, uma medida que acabava driblando as limitações da LRF.
“Ressalta-se que este modus operandi é empreendido pelo GDF para ‘administrar’ o cumprimento dos limites de despesas com pessoal dispostos na LRF, postergando a sensibilização dos aumentos de despesas de pessoal no Relatório de Gestão Fiscal.”
A CGU encaminhou o resultado da auditoria aos órgãos competentes. Ao final, fez quatro recomendações:
- ao Fundo Constitucional do Distrito Federal em conjunto com a Subsecretaria de Planejamento, Orçamento e Administração do Ministério da Fazenda, que passe a reter e recolher ao FCDF as contribuições previdenciárias relativas aos servidores da Polícia Civil do Distrito Federal, de modo que os valores transitem pelos demonstrativos contábeis do FCDF;
- ao Fundo Constitucional do Distrito Federal que adote as medidas necessárias para que os valores relativos à folha de dezembro sejam apropriados no próprio mês, em aderência ao princípio da competência e, consequentemente, não impactando a apuração da despesa total com pessoal do relatório de gestão fiscal (RGF) e seus limites;
- ao Fundo Constitucional do Distrito Federal que subsidie a Secretaria do Tesouro Nacional no levantamento dos impactos da apropriação no mês de janeiro da folha de dezembro do ano anterior, para fins de elaboração do RGF, enquanto a questão da apropriação por regime de competência das despesas com pessoal não esteja solucionada pelo FCDF;
- à Subsecretaria de Planejamento, Orçamento e Administração do Ministério da Fazenda que restitua ao FCDF os valores retidos indevidamente a título de desvinculação de receitas da União (DRU) sobre as contribuições sociais dos servidores da Polícia Civil do Distrito Federal, tendo em vista a determinação constante do item 9.3 do Acórdão TCU nº 1.633/2016 – Plenário.
Providências
Em 13 de dezembro de 2018, o TCU acolheu relatório do ministro José Múcio Monteiro que aponta a necessidade de maior controle nos gastos do FCDF. A Corte também determinou aos gestores providências para estancar os gastos excessivos com pagamento de servidores e sugere ao governo federal limitar gastos de pessoal da reserva que paga os salários de policiais civis e militares, além do Corpo de Bombeiros. Segundo o ministro, atualmente, 91% da verba do FCDF são destinados ao custeio de pessoal.
O teor do documento, que tramitava em sigilo, foi revelado pelo Metrópoles. O relatório alerta que, caso o governo local continue com os acréscimos de penduricalhos, haverá necessidade de aporte adicional de recursos daqui a cinco anos.