Caesb contrata seguro para blindar bens de gestores em ações judiciais
Presidente, diretores, conselheiros e outros executivos serão incluídos na proteção. Seguradora poderá pagar custo de advogado e indenização
atualizado
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Por meio da contratação de um seguro de responsabilidade civil, a Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb) protegerá, com dinheiro público, bens dos gestores em caso de processo administrativo e judicial. Eles podem ser blindados se forem considerados culpados por atos tomados em nome do órgão que causaram danos involuntários a terceiros.
No total, 800 pessoas serão amparadas, entre elas, o presidente Maurício Luduvice, diretores, 19 membros do Conselho Administrativo e Fiscal, e outros empregados que ocupem cargos com poder de decisão. A garantia valerá por 20 anos, mesmo que os gestores não estejam mais em suas funções.A previsão é que o contrato, no valor de R$ 150 mil e com vigência de um ano, seja assinado com a AXA Seguros na próxima semana. O resultado do pregão eletrônico foi publicado na edição de 14 de fevereiro do Diário Oficial do Distrito Federal (DODF).
Os membros da cúpula da Caesb são também os detentores dos maiores salários: dois chefes têm remuneração fixa de R$ 55 mil e R$ 48,2 mil, por exemplo. São eles, respectivamente, os diretores de Comercialização, Marcelo Antônio Teixeira Pinto, e de Suporte ao Negócio, Fábio Albernaz Ferreira.
Segundo o Termo de Referência da licitação, o seguro cobre: custos advocatícios; despesas decorrentes de decisões judiciais, administrativas ou arbitrais; acordos feitos pela Justiça ou de forma extrajudicial; danos morais e corporais; Termo de Compromisso; Termo de Ajustamento de Conduta (TAC); indenizações; e acompanhamento de processos no exterior, entre outros itens. O limite máximo de garantia é de R$ 5 milhões.
Ficam de fora atos dolosos, ilícitos, reclamações anteriores ao início da vigência da apólice e atos lesivos contra a administração pública.
Em nota, o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgotos do Distrito Federal (Sindágua-DF) não poupou críticas à nova contratação. “Seguros feitos dessa forma, retroativa, com tamanha amplitude e valor, são um incentivo ao cometimento de irregularidades. Quando feitos com dinheiro público, é ainda mais absurda a situação”, dispara.
A entidade informou que acionará o Ministério Público para apurar a legalidade do acordo. “A administração pública deve se preocupar e focar o não cometimento de ações irregulares, e não seguros para se proteger de ações de responsabilidade”, defende.
Avaliação de especialistas
O mestre em direito e professor de responsabilidade civil do Centro Universitário de Brasília (UniCeub) Ricardo Bastos esclarece que a proteção dos executivos em estatais tem se expandido. Segundo ele, os processos duvidosos não devem ser abrangidos pela seguradora. “Os próprios seguros não preveem indenização em caso de atos dolosos, em qualquer infração penal, que sejam de ilegalidade ou de má-fé”, pontua.
Já o doutor em custos aplicados ao setor público e docente da Universidade de Brasília (UnB) Marilson Dantas acredita que resguardar os gestores é um bom negócio. “Se você não tem o seguro, o gestor se sente sem proteção, e a tendência é tomar decisões que sejam de um risco menor, e essa não necessariamente é a melhor decisão”, opina.
Este é o desafio: sem o seguro, eu, gestor, tomo decisões preservando a mim e, por vezes, posso não tomar a melhor para a empresa pública.
Marilson Dantas, professor da UnB
O outro lado
Em nota, a Caesb explica tratar-se de um seguro nos moldes do D&O (Director and Officers Liability), regulado pela Superintendência de Seguros Privados (Susep). “Visa proteger quaisquer empregados com poder de gestão, conselho deliberativo e fiscal e diretores, quando responsabilizados pessoalmente por decisões que causaram danos involuntários a terceiros, na prática de suas atividades”, detalha.
A Caesb ainda contesta a informação segundo a qual o seguro abarcará gestores que já não desempenham funções de comando. “O contrato não é retroativo, e essa afirmação do sindicato demonstra que ele age por questões ideológicas, não para defender o interesse da empresa e dos empregados”, frisa a estatal.
A empresa pública defende tal garantia como uma modalidade “difundida no Brasil”. “A contratação está amparada pela Lei n° 13.303, de 30 de junho de 2016 (Lei das Estatais), e pelo estatuto social da Caesb”, diz. A companhia ainda destaca que a norma discrimina “desde atos fraudulentos e irregularidades em contratações públicas até aqueles empreendidos com objetivos de obtenção de vantagens e interesses pessoais”.
O Sindágua-DF rebateu a informação de que o estatuto social da Caesb preveja essa modalidade de contrato em relação a seguros. Segundo o sindicato, não há amparo para esse tipo de situação, “o que torna o processo viciado e ilegal”.