Caesb cobra taxa de esgoto em casas que têm apenas fossas
Mesmo sem a instalação das ligações no Trecho 1 do Sol Nascente, estatal emitiu faturas como se o serviço estivesse em pleno funcionamento
atualizado
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A cozinheira Jucilene Mendes da Silva (foto em destaque), 34 anos, irrita-se toda vez que olha para a conta de água. Ela integra um grupo de moradores do Setor Habitacional Sol Nascente, em Ceilândia, que está pagando tarifa de esgoto mesmo sem a prestação do serviço. Parte dos residentes da Chácara 34 do Trecho I ainda mantém fossas no quintal das casas. Ainda assim, a Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb) emitiu faturas com a cobrança.
Para Jucilene, o novo custo – cobrado há pelo menos quatro meses – pesou no bolso. Com renda familiar em torno de um salário mínimo (R$ 954), desembolsar R$ 73,94 a mais apertou ainda mais o orçamento. “É um gasto que a gente não espera. Esse valor faz falta para quem já vive no limite. Mas o que revolta mesmo é pagar por algo que não existe. Nunca fizeram instalação de rede de esgoto aqui”, reclama.No caso dela, que está em tratamento contra câncer no colo do útero, há um agravante: a ausência de água em boas condições para o consumo intensifica a queda da sua imunidade. “Eu queria mesmo continuar pagando e que realmente houvesse rede de esgoto, porque é uma questão de saúde também”, pondera.
A cobrança iniciada há quatro meses também consome parte da renda de Jucileide Carvalho de Novaes, 33, vizinha da cozinheira. Agora, além de precisar pagar R$ 150 a cada três meses para uma empresa esvaziar a fossa de sua residência com um caminhão-pipa, ela ainda se vê obrigada a arcar com um serviço a que nunca teve acesso. “Se tivesse esgoto, não estaríamos nesse sufoco com fossas. O pessoal da Caesb veio aqui, admitiu o erro e prometeu retirar a cobrança, mas ficou só no blá-blá-blá”, disse.
Risco à saúde
As obras de urbanização feitas no Sol Nascente ainda não contemplaram todos os moradores da segunda maior favela do Brasil, com 25.299 habitações – atrás apenas da Rocinha, no Rio de Janeiro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Sem rede de esgoto, muitas pessoas instalaram fossas nos quintais. O problema é que a maioria é construída de forma improvisada, sem revestimento interno. Trata-se das chamadas fossas negras, escavações nas quais os dejetos caem no terreno, infiltrando-se na superfície e contaminando o lençol freático.
Nesse caso, o mais indicado são as fossas sépticas, unidades primárias de tratamento de esgoto doméstico nas quais são feitas a separação e a transformação dos dejetos através de um poço absorvente.
Hidrômetro
Outra reclamação dos moradores da Chácara 43 do Sol Nascente é que a Caesb havia prometido não cobrar a instalação dos hidrômetros nas casas da localidade, pelo fato de eles integrarem famílias de baixa renda. Mas, para a surpresa de todos, a empresa pública enviou um boleto no valor de R$ 529.
“Simplesmente é um dinheiro que não tenho. Meu receio é cortarem a água. Já entramos em contato, ficaram de avaliar. Mas, até agora, nada”, teme Jucileide.
Outro lado
Em nota, a Caesb admitiu a cobrança indevida e garantiu que os problemas foram corrigidos, apesar de os moradores negarem ter havido qualquer tipo de abatimento até o momento. “As ligações de esgoto do Trecho 1 do Sol Nascente foram executadas, liberadas para uso dos moradores e para cobrança da ligação e da tarifa. Houve um problema de finalização de obra somente nos lotes 41 e 43”, destacou a estatal.
Ainda segundo a Caesb, por um erro, as contas dos dois locais foram emitidas com cobranças relacionadas a esgoto, mas posteriormente corrigidas, “sem prejuízo para os clientes”. “A Caesb pede desculpas aos moradores pelos transtornos causados e se coloca à disposição para mais esclarecimentos”, diz o texto.
Sobre o relato dos moradores de que haveria uma suposta promessa de retirada da cobrança pela instalação dos hidrômetros, a companhia respondeu desconhecer tal acordo. “A Caesb não faz promessa de isenção porque a empresa é proibida de fazer esse tipo de dispensa de pagamento. Para tanto, não há previsão legal. O que pode ser feito é o parcelamento do débito referente à ligação de água”, assinalou.
Segundo estudo da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), 56% dos domicílios do Pôr do Sol e do Sol Nascente têm fossa séptica, e 39%, rudimentar. Ainda de acordo com o relatório, outro serviço deficitário na região é a coleta de lixo, feita em apenas 26% das casas. Do total de moradores, 28% jogam os dejetos domésticos em lugar impróprio e 47% dão outro destino.