Banco recusou pagar seguro de R$ 1,5 mi a marido de médica morta no DF
Tratado inicialmente como suicídio, o óbito da cardiologista Sabrina Nominato é cercado de mistérios e pode sofrer reviravolta
atualizado
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O surgimento de novas informações sobre a morte da médica Sabrina Nominato Fernandes Villela, 37 anos, afasta, segundo familiares, cada vez mais a hipótese de a cardiologista ter tirado a própria vida, em 10 de outubro do ano passado. As apurações identificaram que o então marido da intensivista, o personal trainer André Reis Villela, 41, tentou resgatar R$ 1,5 milhão de uma apólice de seguro de vida logo após o falecimento da companheira.
De acordo com advogados que representam parentes da médica, o marido de Sabrina era o único beneficiário da apólice assinada no Sistema de Cooperativas de Crédito (Sicoob). O documento passou a ter validade em setembro do ano passado, um mês antes de a cardiologista ser encontrada morta pelo personal, na cama do casal, em uma casa alugada no condomínio Mini Chácaras, no Altiplano Leste.
Após o óbito da mulher, André Villela tentou sacar o dinheiro, mas o banco negou a liberação dos valores. O Metrópoles apurou que o pagamento não foi realizado em razão de o caso ainda estar em andamento na 6ª Delegacia de Polícia (Paranoá).
O caso
A morte de Sabrina permanece cercada de mistérios. Inicialmente tratado pelas autoridades como suicídio, o inquérito conduzido pela 6ª DP revela detalhes que, no mínimo, reduzem a possibilidade de que a cardiologista tenha tirado a própria vida. Contradições em depoimentos, indícios de violência doméstica, corpo com escoriações, duas costelas quebradas, e o próprio seguro de vida são alguns dos elementos que colocam a natureza da morte sob suspeita.
Sabrina foi encontrada morta de bruços, com o rosto contra um dos travesseiros, em uma posição que provoca asfixia. Roxa e com o corpo enrijecido, estava coberta e já sem vida. Uma ambulância do Corpo de Bombeiros foi acionada pelo personal trainer. Logo em seguida, a equipe de socorristas confirmou o óbito. A Polícia Civil foi chamada pelo porteiro do condomínio somente no dia seguinte, por volta das 16h.
Violência doméstica
No decorrer da investigação, a PCDF ouviu amigos e parentes da cardiologista. Dois deles revelaram indícios de que Sabrina sofria agressões físicas e tinha dificuldades de se livrar do suposto relacionamento abusivo. Uma enfermeira ouvida em termo de declaração afirmou que, em agosto do ano passado, a médica apareceu no trabalho com marcas no rosto semelhantes a unhadas. Na ocasião, Sabrina disse que havia sofrido um acidente no Uber.
Constantemente machucada, a cardiologista teria passado a usar roupas com mangas para esconder os sinais de violência. A testemunha ressaltou que, em março de 2020, Sabrina quebrou o braço, mas se recusou a dizer os motivos que provocaram a imobilização do membro. De acordo com a enfermeira, a médica tinha um comportamento alegre quando estava entre amigas e outro, totalmente subserviente, na presença do marido.
Em outro depoimento, uma advogada que teve contato com a cardiologista durante um jantar contou à polícia que Sabrina a chamou para uma conversa reservada e pediu conselhos sobre como lidar com a violência física e psicológica. A profissional de saúde chegou a revelar ter comprado uma arma de fogo e passado a treinar em uma escola de tiro. A pistola ficava guardada no cofre de sua residência.
De acordo com a testemunha ouvida no inquérito, a médica teria dito que pretendia ir até a Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam) para registrar ocorrência de violência doméstica, mas acabou desistindo. Na mesma ocasião, Sabrina desabafou com a amiga dizendo que tentava se livrar do relacionamento abusivo e pretendia se “separar o mais rapidamente possível” do então marido.
Costelas quebradas
O laudo produzido a partir do exame de necropsia feito no corpo de Sabrina apontou uma série de lesões, como duas costelas quebradas e várias escoriações no rosto e nos braços. Quatro dias após a morte dela, a PCDF pediu ao personal trainer que passasse por exame de corpo de delito no Instituto Médico Legal (IML), em razão de lesões apresentadas num dos braços.
De acordo com a advogada Sofia Coelho, que representa a família da cardiologista, existem pontos nebulosos na história, principalmente em relação ao depoimento prestado pelo marido da médica. “O André afirmou que teria deixado a residência por volta de 7h50 e chegado à academia por volta das 8h10, mas, na verdade, as câmeras o flagraram saindo às 8h23 do condomínio”, disse.
A advogada ainda contou que o próprio André admitiu brigas recorrentes com a esposa. “Ele narrou que teve discussão forte e áspera com a mulher dois meses antes da morte dela e que Sabrina gritava que estava sendo agredida na rua. Outro ponto confirmado por ele é que Sabrina nunca havia tentado suicídio ou falado sobre isso”, explicou.
Depoimento do personal
Acompanhado de um advogado, o personal trainer prestou depoimento na delegacia horas após o corpo da cardiologista ter sido encontrado. Villela afirmou que, no dia anterior, o casal havia participado do aniversário de uma amiga, em um restaurante na QI 5 do Lago Sul, entre 14h e 19h. Em seguida, foram para um bar na 202 Sul, onde Sabrina teria ingerido muita bebida alcoólica.
No local, a médica teria passado mal por sofrer com a síndrome de Vasovagal, doença que consiste na perda transitória da consciência, provocada pela diminuição da pressão arterial e dos batimentos cardíacos. De acordo com o marido, ela teria deitado no chão e levantado as perna. Sentindo-se melhor, teria voltado a beber.
O marido relatou em depoimento que Sabrina fazia uso diário de remédios para dormir. A médica tomaria até cinco comprimidos de uma vez e, em função disso, chegava a urinar na cama com regularidade, o que o deixava irritado. O personal trainer contou aos policiais que a esposa apresentava sinais de depressão e já havia sofrido dois abortos espontâneos. Na mesma oitiva, ele disse nunca ter visto a mulher falar sobre tirar a própria vida.
A reportagem não conseguiu localizar André Reis por meio dos contatos disponíveis no inquérito policial. O espaço permanece aberto para eventuais manifestações.