Autista agredido em Águas Claras tem rejeição de prótese ocular e sangramentos nasais
Em lançamento da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos dos Autistas, jovem relatou drama que enfrenta desde que foi agredido, em janeiro
atualizado
Compartilhar notícia
As noites continuam a ser doloridas para Wtsherdhay Gonçalves dos Santos, 22 anos. O jovem negro e autista perdeu um dos olhos após ser barbaramente espancado em Águas Claras, no Distrito Federal, em 2 de janeiro de 2023. Além de precisar de uma cirurgia reparatória no nariz, ele chegou a receber uma prótese ocular, mas o organismo rejeitou o item.
Por enquanto, Wtsherdhay vive dias de aflição e indignação, porque os agressores continuam livres e impunes. O jovem conversou com o Metrópoles na noite de segunda-feira (3/4), na Câmara Legislativa (CLDF), após o lançamento da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos das Pessoas com Autismo.
Assista ao depoimento de Wtsherdhay:
A notícia da possibilidade de uso de uma prótese pelo jovem levou alívio à família. No entanto, após a colocação do item, a cavidade ocular de Wtsherdhay ficou tomada por secreção e dor. “Minha vida não está bem. Meu olho dói para dormir”, diz.
O jovem encontrou na arte uma forma de conforto. Além de voltar a frequentar festas com a família, começou a aprender a tocar instrumentos musicais com ajuda da banda Segunda da Resenha. “Música é tudo na minha vida. Fico alegre e faço a alegria de todo mundo”, conta.
Devido à lesão sofrida, o que provoca dores e sangramentos, Wtsherdhay precisa de uma cirurgia reparatória.
O jovem foi espancado após defender o irmão mais novo, Solomon Gonçalves Chwukuemeka Maha, e sofreu ferimentos em diversas partes do corpo, inclusive com perda da cartilagem do nariz.
Crises de choro
Mãe do jovem, Wheda Gonçalves dos Santos descreve a situação como “muito complicada”. Além de não conseguir dormir bem, Wtsherdhay tem vivido crises de ansiedade. Em algumas noites, ele chora e pede ajuda para ter um olho novamente. Ao lado do filho, ela ora e lamenta a situação.
“Ele teve duas crises de choro, e fiquei desesperada. Tive de levá-lo para o hospital. Ele entrou no box [do banheiro], gritava e chorava muito. Sentou-se no chão e deu murros na parede. Creio que ele tenha de mudar os medicamentos, mas não tenho condição de pagar”, desabafa Wheda.
A mãe considera que recebeu uma pena “prisão perpétua” após o ocorrido, mas os autores do crime seguem impunes. “Quem cometeu o crime com o meu filho, que arrancou o olho, quebrou o nariz, rachou a testa, perfurou o pé dele com um canivete está solto e feliz da vida. Eu não. Eu estou presa para o resta minha vida. A Justiça não vai devolver o olho do meu filho”, completa Wheda.
O presidente da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos das Pessoas com Autismo, deputado distrital Eduardo Pedrosa (União Brasil), promete buscar justiça para a família. “O caso do Wtsherdhay foi muito emblemático. Precisamos mostrar que quem agir com preconceito vai pagar pelo que fez”, ressalta.
Rede de ensino
Para o parlamentar, mesmo com direitos previstos na legislação brasileira, autistas enfrentam exclusão e abandono nos serviços públicos. A criação da frente parlamentar visa garantir acolhimento e respeito a pessoas com essa condição, segundo o deputado distrital.
Diretor-presidente do Movimento Orgulho Autista Brasil (Moab), o advogado Edilson Barbosa cobra a abertura de ao menos um centro de referência em tratamento a autistas em cada região administrativa do Distrito Federal, assim como ocorre com as Unidades Básicas de Saúde (UBSs).
Outro desafio é ampliar a oferta de monitores e salas de recursos e educação precoce para estudantes com deficiência (PCDs) nas escolas públicas.
Atualmente, esses colégios têm, aproximadamente, 7 mil estudantes diagnosticados como PCDs. “A rede ainda não está assistida. Há [acompanhamento adequado] em alguns lugares, e parabenizamos os profissionais que estão lá, auxiliando estudantes autistas e pessoas com deficiência, mas precisamos melhorar. Temos de ter um núcleo em cada regional de ensino”, enfatiza Edilson Barbosa.