Atraso em novo edital de gestão ameaça funcionamento do Cine Brasília
Sem publicação de edital para gestão do Cine Brasília em 2024, comunidade cultural teme problemas no funcionamento a partir de fevereiro
atualizado
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Os amantes de cinema do Distrito Federal temem a possibilidade de fechamento do Cine Brasília, em fevereiro deste ano, quando se encerra o atual edital da administração compartilhada do tradicional equipamento cultural da cidade. Isso porque, segundo a comunidade cinéfila, até o momento, não foi publicado um novo documento para a renovação do contrato ou seleção de nova gestão para 2024.
Um dos mais importantes equipamentos culturais de exibição cinematográfica da América Latina, o Cine Brasília, inaugurado em 1960, possui o título de Patrimônio Mundial da Humanidade, bem como de Patrimônio Cultural de Brasília. Sua dimensão histórica se confunde com a trajetória do cinema local e nacional.
Atualmente, o espaço projetado por Oscar Niemeyer e que conta com 607 lugares, é gerido pela Box Cultural – uma organização da sociedade civil (OSC) – de forma compartilhada com a Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa do Distrito Federal (SECEC-DF).
A Box Cultural é uma entidade de estudo, pesquisa, produção, montagem e apresentação de peças teatrais, shows musicais, obras cinematográficas, obras fotográficas, obras audiovisuais fundada em 1997.
O presente contrato com a organização, no valor de R$ 2,5 milhões, segue em vigor até fevereiro, quando completará 19 meses de execução. A programação se encerra no dia 7 de fevereiro e as atividades administrativas no dia 29 do mesmo mês.
A partir daí, um novo chamamento público de responsabilidade da SECEC-DF definirá a empresa que será responsável pela gestão do Cine Brasília. O temor do setor cultural é que, como o edital ainda não foi publicado e não tem previsão, o cinema feche as portas até que os trâmites burocráticos sejam concluídos.
A partir da assinatura do termo de colaboração, as atividades realizadas pela OSC devem contemplar, além da programação de filmes, eventos complementares, como lançamento de livros voltados à temática audiovisual, exposições de fotografias e de cartazes, e as já frequentes mostras de cinema em parceria com embaixadas, normalmente gratuitas.
Para a Sara Rocha, diretora da Box Cultural e responsável pela gestão compartilhada com a secretaria, o atraso na divulgação de um novo edital já indica uma potencial interrupção da programação no Cine Brasília.
“Estamos consternados com o cronograma. A programação demanda tempo e planejamento junto às distribuidoras e quanto ao atendimento à sociedade civil para a avaliação e definição de mostras e sessões especiais. Mas seguimos no trabalho até o dia 7 de fevereiro, aguardando o novo edital, ao qual temos todo interesse em submeter proposta, pelo amor e engajamento histórico que temos por esse cinema”, declarou Sara.
O artista visual e designer gráfico, Silvino Mendonça, conta que frequenta o espaço há quase duas décadas. Recentemente, ele exibiu no local o curta-metragem Paisagem em Chamas, sobre o abandono dos cinemas de Brasília.
Segundo ele, o atraso na publicação do edital é motivo de apreensão para o setor cultural, visto que não há transparência por parte da Secretaria de Cultura gerando uma situação indefinida.
“É essa falta de perspectiva que me preocupa, pois já vi aquele espaço ser abandonado muitas vezes ao longo dos últimos anos. Infelizmente, não há projeto a longo prazo para o Cine Brasília. Uma boa gestão compartilhada já não é garantia de bom funcionamento duradouro. De um mês para o outro, podemos perder o acesso a uma programação de cinema de qualidade no DF”, alega Silvino.
Na avaliação dele, a gestão compartilhada em 2023 rendeu bons frutos para o cinema da capital do país. “Aproximadamente 400 filmes foram exibidos lá. Foi um bom ano para o Cine Brasília, com boa variedade de títulos em cartaz e bom aproveitamento da grade horária semanal”, avalia.
A diretora e roteirista do documentário Rodas de Gigante, Catarina Accioly defende que a gestão compartilhada do cinema abriu espaço para uma programação ininterrupta, engajada com o que é de melhor no cinema brasileiro e internacional.
“Espero que a Secretaria de Cultura se apresse com a divulgação desse edital. Se não houver celeridade na publicação e continuidade da gestão, o cinema da capital perde muitíssimo, principalmente o cinema autoral, como é o caso do meu filme. Como essas produções vão ser vistas aqui em Brasília?”, indaga Catarina.
Festival de Brasília
Essa não é a primeira vez que a classe cinematográfica cobra por atraso na publicação de edital de chamamento por parte da SECEC-DF.
Em agosto do ano passado, cineastas e produtores culturais se reuniram em frente ao Cine Brasília para manifestar sobre o atraso na divulgação do documento para escolha da gestão que seria responsável pela 56ª edição do tradicional Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.
Na época, a categoria alegava que, o edital geralmente publicado no início do ano, não havia sido divulgado até o início do segundo semestre do ano.
O atraso, segundo a classe, trouxe problemas em relação à prazos inviáveis para inscrição, seleção dos filmes e divulgação do evento. Além disso, por conta do curto prazo, a maioria dos filmes foi exibido sem audiodescrição e legendas descritivas, bem como mau uso da grade horária aos fins de semana.
O que diz a Secretaria de Cultura
A reportagem do Metrópoles entrou em contato com a Secretaria de Cultura do DF, que respondeu por meio de nota. Leia na íntegra:
“A Secretaria de Cultura e Economia Criativa do DF informa que não procede quaisquer informações sobre encerramento ou interrupção de atividades do Cine Brasília.
O equipamento cultural será beneficiado pelos recursos da Lei Paulo Gustavo, onde estão reservados e garantidos R$ 1,5 milhão para reforma do Cine Brasília e, também, um projeto para o Cine Itapuã.
O Cine Brasília passará por uma breve reforma, com o Termo de Referência para início da obra já em andamento na Secretaria de Cultura e logo será publicado. Durante esse período um novo edital de chamamento para gestão do espaço será lançado e consolidado para que já na entrega da obra a OSC vencedora inicie as atividades culturais. A proposta da Secretaria de Cultura, em análise jurídica, é de que o novo contrato de gestão tenha duração de pelo menos 3 anos, garantindo assim um plano de ações com metas a curto e médio prazo“.