Após pizzas e bolos, Iges-DF determina cancelamento de cartão corporativo
Decisão ocorreu após o Metrópoles revelar o uso do instrumento para compras alheias à atividade fim da entidade. CLDF também investiga
atualizado
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O Instituto de Gestão Estratégica de Saúde (Iges-DF) determinou, nesta terça-feira (13/10), o cancelamento de um dos cartões corporativos da entidade. A decisão ocorreu após a coluna Janela Indiscreta ter revelado que o instrumento, criado para custear exclusivamente despesas emergenciais, serviu também para arcar com um pedido de R$ 600 em uma pizzaria do Núcleo Bandeirante e, ainda, para a compra de bolos de brigadeiro, salgadinhos, refrigerantes, além da aquisição de uma urna funerária.
O pedido para anular a tarjeta partiu da própria diretora de Inovação, Ensino e Pesquisa, Emanuela Dourado Ferraz, que, à época, era a superintendente Operacional do instituto, setor interno responsável por autorizar as despesas.
Na solicitação, a gestora pede “o imediato cancelamento do cartão corporativo junto ao BRB, bandeira Visa”. Ela ainda requereu o comprovante da operação que finaliza as transações do instrumento bancário.
Ainda nesta terça-feira, o deputado distrital Leandro Grass (Rede) protocolou um requerimento para que o instituto justifique a compra, considerada questionável pelo parlamentar. A entidade terá de responder aos questionamentos da Câmara Legislativa (CLDF) em até 30 dias.
“O Iges-DF precisa explicar imediatamente por que o dinheiro do cidadão, da cidadã do Distrito Federal está sendo usado para financiar confraternização de servidores. Certamente não é para isso que todos nós pagamos os nossos impostos. A gente paga para que não faltem medicamento, insumo, leito de UTI, como infelizmente tem faltado no DF. É uma denúncia gravíssima e que tem que ser apurada, mesmo que o valor seja pequeno, porque isso é um escárnio com a população, especialmente durante um período de pandemia”, disse o distrital ao Metrópoles.
Procurado, o Iges-DF confirmou o cancelamento do cartão. Em nota encaminhada pela assessoria de imprensa, a entidade frisou que “a nova gestão do instituto vem adotando uma política mais rigorosa em relação à redução de gastos, redefinindo critérios sobre despesas prioritárias. Para a nova gestão, o cartão corporativo é um instrumento importante para execução de necessárias compras emergenciais. Por isso mesmo, sua utilização deve ser alinhada com as reais necessidades da instituição”.
Ainda de acordo com o texto enviado à reportagem, “foi com esse espírito público que a dra. Emanuela Ferraz, comprometida com as políticas da nova gestão, teve a iniciativa de solicitar o cancelamento do cartão corporativo, o qual sempre foi por ela usado seguindo todos os preceitos da moralidade, transparência e legalidade estabelecidos pelo Regulamento de Compras [do instituto] e não há registro de qualquer prejuízo ao Iges-DF em decorrência das compras feitas com o cartão em questão.”
Uso restrito
O uso de cartões corporativos não é comum dentro da estrutura administrativa do Governo do Distrito Federal (GDF). O modelo usado para aquisições emergenciais é restrito, e secretários, por exemplo, não têm o direito ao benefício, apenas alguns dirigentes de estatais de capital mista. Na esfera federal, o benefício já foi alvo de inúmeros questionamentos sobre gastos considerados discutíveis.
No caso do Iges-DF, a compra na pizzaria foi realizada no dia 16 de maio de 2020, um sábado, às 16h26, e entregue por delivery na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Núcleo Bandeirante. Foram 12 pizzas grandes (sendo seis de frango com catupiry e as outras de calabresa), além de 13 refrigerantes de 1,5 litro cada e serviu para homenagear 70 colaboradores que trabalharam na montagem de 42 leitos exclusivos para pacientes com a Covid-19. (veja nota abaixo)
O pedido do lanche partiu da Superintendência Pré-Hospitalar, responsável pela gestão das UPAs, e foi autorizado pela Superintendência Operacional, responsável pelos gastos com o cartão corporativo.
Na mesma fatura há, ainda, a compra de mais de R$ 200 em padarias da região, com bolos de brigadeiro, coxinhas, quibes, sucos e mais refrigerantes para os funcionários das UPAs do próprio Núcleo Bandeirante e também do Recanto das Emas e de Samambaia. Também houve a aquisição, em maio, de uma urna funerária no valor de R$ 2,7 mil.
O pedido para quitar a fatura foi feito no dia 3 de junho. Com outros produtos de uso interno, como extintores de incêndio e campainhas de pilha, o valor do boleto naquele período chegou a R$ 6.013,22.
Crise financeira
As compras vêm à tona justamente quando a entidade vive uma verdadeira crise financeira, que resultou em desabastecimento de insumos – o que inclui papel higiênico – e também no atraso dos salários de colaboradores. Todos os casos foram revelados pelo Metrópoles. Contas de água e luz do instituto também estão em atraso.
Para tentar minimizar os contratempos ocasionados pela falta de insumo, os trabalhadores do local organizaram uma vaquinha para obter os produtos. Nos últimos dias, fornecedores da entidade também passaram a cobrar as encomendas feitas e não quitadas.
Diante da crise que vive o Hospital de Base, o superintendente da unidade de Saúde, Lucas Seixas, encaminhou mensagem aos trabalhadores para tentar acalmá-los: “Nesses momentos de crise, podemos reclamar, falar, etc. No entanto, o melhor é unir e agir”.
O gestor ainda confirmou o desabastecimento e os atrasos temporários de salários, além de pagamentos a empresas fornecedoras. “Como sabemos, mas não custa lembrar, o Iges-DF (Instituto de Gestão Estratégica) controla todos os pagamentos dos fornecedores do HBDF, HRSM e UPAs. A gestão está lutando para resolver com celeridade esses pagamentos e assim normalizar a reposição de todos os itens necessários à assistência segura e com qualidade”, disse.
O que disse o Iges-DF?
Em nota encaminhada à reportagem, o Instituto de Gestão Estratégica de Saúde do DF (Iges-DF) confirmou que no dia 16 de maio de 2020 foi paga, com cartão corporativo da instituição, uma conta de R$ 600 à empresa Igglus Serviços de Delivery Ltda. “Foi referente ao fornecimento de pizzas para atender um evento oficial, organizado em homenagem a 70 colaboradores que, exaustivamente, trabalharam na montagem de 42 leitos para receber pacientes com Covid-19 na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Núcleo Bandeirante.”
De acordo com a entidade, o pedido do alimento foi solicitado pela Superintendência Pré-Hospitalar, responsável pela gestão das UPAs, à Superintendência Operacional, a quem compete utilizar o cartão corporativo para realizar compras do Iges-DF.
“A superintendência adquiriu os alimentos seguindo todos os preceitos da moralidade, transparência e legalidade, prestando contas das despesas nos prazos e ditames estabelecidos pelo Regulamento de Compras do Iges-DF. Não houve, portanto, nenhum ato ilegal ou lesivo aos cofres públicos”, garantiu.
Colaborou Isadora Teixeira