atualizado
A população trans, de forma inédita no país, tem atendimento de saúde especializado e gratuito em São Paulo.
A Rede Sampa Trans conta com 43 unidades de saúde básica em todas as regiões da capital, e uma unidade com médicos especialistas no centro da cidade. Em 2023, a rede fez 5.000 atendimentos ao longo do ano.
A sigla LGBTIA+ se refere a lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, pessoas não binárias, intersexo, assexuais, entre outras identificações.
Nas unidades da rede, essas pessoas vão encontrar serviços e ações para promoção e vigilância em saúde. A linha de cuidados inclui avaliação com a equipe multiprofissional e encaminhamento para atendimentos específicos. A porta de entrada é pela Unidade Básica de Saúde da região onde a pessoa mora.
A partir de lá, ela será encaminhada para a rede especializada.
Saúde integral para pessoas trans
Além das unidades básicas de Saúde, a rede conta com o Centro de Referência de Saúde Integral para a População de Travestis e Transexuais – Janaína Lima, conhecido pela sigla CR POP TT.
Inaugurado, no ano passado, o local leva o nome da primeira trans a assumir a presidência do Conselho Municipal de Atenção à Diversidade Sexual, em 2012. Ela morreu de infarto em 2021, aos 45 anos.
A unidade tem uma variedade de profissionais dedicados ao trabalho focado nesse público. São médicos, enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos, nutricionistas, fonoaudiólogos e outros especialistas com preparo para cuidar e acolher de forma integral esta população, sem risco de constrangimentos ou violências.
Ao todo, são 33 profissionais e 11 consultórios.
O fonoaudiólogo, por exemplo, pode ajudar na imposição de voz para quem tem a vontade de se expressar de acordo com o gênero que se identifica. O médico ginecologista vai olhar os órgãos reprodutores do homem trans com o preparo que a situação exige.
A rede também oferece o tratamento de hormonização (uso de hormônios) para pessoas transexuais e travestis. Entre todos os atendimentos feitos no ano passado, 70% buscavam a hormonização.
Há também encaminhamento para quem deseja fazer a cirurgia de redesignação sexual, histerectomia e mamoplastia. As operações são indicadas após dois anos de acompanhamento, conforme portaria do governo.
O trabalho evita que o preconceito e o medo da violência afastem as pessoas trans dos serviços de saúde, o que as coloca em risco.
‘Divisor de águas’
O comediante de stand-up João Gabriel Bubiz, de 30 anos, passa por atendimento na rede desde novembro do ano passado. João se identifica como homem trans porque nasceu com o sexo biológico feminino, mas não se identifica com o gênero.
Se assumiu lésbica, aos 20 anos e, ao ver um homem trans descrever como se sentia, identificou-se com os mesmos sentimentos. Tinha 27 anos.
“A descoberta me deu alívio, uma voz dentro de mim dizia: você se achou. Mas eu perdi tudo que tinha: família, dinheiro, amigos”, afirma.
“Muitos diziam que eu estava transicionando para chamar a atenção. Faltou muita empatia”, declara.
O caminho da identificação não foi fácil. João conta que não teve apoio familiar, sofreu internação compulsória, tentativa de suicídio e passou por transfobia em atendimentos médicos do plano de saúde quando foi buscar ginecologista e endocrinologista, que se recusaram a atendê-lo.
Por isso, para ele, o atendimento na Rede Sampa Trans foi um “divisor de águas” na vida.
“Eu me sentia péssimo, um impostor, mas o psicólogo da Rede foi um divisor de águas da minha vida. Estamos falando de qualidade, são profissionais capacitados. Você se sente abraçado e não tem medo de alguém chamar ‘João Gabriel’, se levantar e falarem que você parece mulher”, afirma.