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Novo Ensino Médio coloca aluno como protagonista no processo de ensino

Na Escola Salesiana de Brasília, o objetivo é investir para que os jovens sejam cidadãos com pensamentos críticos e inovadores

Hugo Barreto/Metrópoles
Escola Salesiana de Brasília
1 de 1 Escola Salesiana de Brasília - Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

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Hoje, ainda se discute muito sobre as habilidades técnicas, conhecidas por hard skills. Desse modo, uma pessoa entra no mercado de trabalho com capacidade admirável para operar uma demanda, porém não consegue criar, relacionar-se e, sobretudo, trabalhar em equipe – capacidades essas chamadas de soft skills. Esse cenário é consequência de uma educação conteudista, em que o foco não é formar pessoas dotadas de pensamento crítico.

Essa abordagem, inclusive, gera outro problema. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) revela que garantir que os jovens brasileiros permaneçam na escola nos anos finais do Ensino Médio é um dos principais desafios do Brasil na área de Educação. O levantamento indica que, no terceiro trimestre de 2021, 407,4 mil adolescentes, com faixa etária entre 15 e 17 anos, estavam fora do colégio.

A fim de romper com a tradição curricular “decoreba” e despertar interesse real pelo estudo no aluno, o Ensino Médio foi reformado no país. Regulamentado pela Lei nº 13.415, de 2017, o novo modelo coloca o aluno como centro do processo pedagógico-educacional, protagonizando novas maneiras de pensar. As diretrizes da grade curricular, pautadas pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), correspondem às modernas competências exigidas pelo século 21, com ênfase ao pensamento crítico que atenda às emergências da sociedade.

Antigamente, o aluno era ensinado a sair de uma mesma reta, do ponto A ao ponto B. No fim, todo mundo fazia exatamente o mesmo percurso. Com a reforma, o estudante começa em uma estrada comum, mas enxerga uma série de saídas. Detalhe: ele que escolhe qual caminho seguir. Na Escola Salesiana Brasília (ESB), por exemplo, o foco é formar um novo profissional, com postura inovadora. Ou seja, o objetivo é investir para que os jovens sejam cidadãos com pensamentos diferentes, e é ele quem decide a área em que deseja intensificar os saberes.

Em 2021, a instituição de ensino produziu o primeiro Itinerário Formativo, nas áreas de Tecnologia e Matemática. Já este ano, o grupo elaborou o de Linguagens e Matemática. “Nos Itinerários Tecnologia e Comunicação (Linguagens, Matemática e Tecnologia), Itinerário Pessoas e Cultura (Ciências Sociais e Humanas) e Itinerário Mundo Natural (Ciências da Natureza), trouxemos olhares do que é produção, estatística, empreendedorismo, além de olhar para questões sociais”, explica a diretora-geral e pedagógica da Escola Salesiana Brasília, Neusa Bueno.

Neusa Bueno
Neusa Bueno, diretora da Escola Salesiana Brasília

Dentro do novo universo, os alunos também contam com as trilhas de aprendizagem, conhecidas como eletivas. Nesse escopo, são contempladas eletivas obrigatórias e optativas. A escola oferece quatro, e os estudantes podem escolher duas, entre Humanas e Ciências e Humanas e Matemática. “A opção de escolha está prevista para o primeiro e segundo anos. Já para o terceiro, as eletivas estão mais voltadas para a preparação do Programa de Avaliação Seriada (PAS)”, ressalta Neusa. “Os alunos devem entender que o Ensino Médio se tornou um espaço de experimentação. Ele faz escolhas e depois avalia se elas fazem sentido à sua vida; se ele está se adequando.”

“A gente se sente ouvido. Em nossos itinerários, temos momentos de conversa. Ao longo do processo, discutimos muitas ideias e, de repente, colocamos as ponderações no lugar e, se necessário, até nos dividimos em equipes para chegar ao mesmo propósito. Tudo isso com o objetivo de alcançar a mudança e fazer acontecer.”

Ana Heloísa, aluna do 2º ano do Ensino Médio da ESB

O que são os itinerários?

De acordo com o mestrando em Educação pela Universidade de São Paulo (USP) e pós-graduando em Didáticas para implementação da BNCC, Valentino Ruy, desde o início deste ano, todas as escolas do Brasil, públicas e privadas, devem seguir o Novo Ensino Médio, começando pela 1ª série e atingindo todos os três anos até 2024. 

A reformulação, anunciada em 2017, mantém a base formada pelas disciplinas Português e Matemática (Itinerário Base) e projetos e/ou eletivas (Itinerários Formativos). 

A nova grade curricular aborda três principais mudanças: o estudante pode eleger parte das disciplinas, a carga horária mínima aumentou de 2400 para 3000 horas e há um olhar mais voltado às demandas do mercado, com a possibilidade de seguir uma formação técnica.  

De acordo com o Ministério da Educação, os Itinerários Formativos organizam-se a partir de quatro eixos estruturantes e complementares. São eles:

  • Investigação Científica: ampliar a capacidade dos estudantes de investigar a realidade.
  • Processos Criativos: aprender a propor, inventar e inovar. 
  • Mediação e Intervenção Sociocultural: apropriar os estudantes de conhecimentos e habilidades que os permitam atuar como agentes de mudanças e de construção de uma sociedade mais democrática.
  • Empreendedorismo: apropriar cada vez mais diferentes contextos e criar novas oportunidades para si e para os demais. 

Segundo o professor e matemático da Escola Salesiana Brasília, Elias Júnior, o ponto mais forte desse modelo é que a visão do professor será dada de um outro ângulo. “O antigo detentor do conteúdo sai desse papel, e o aluno passa a ser o protagonista do próprio conhecimento. Nesse novo processo, o estudante passa a escutar, a entender, a produzir e a interessar-se mais pelo conteúdo.”

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Estudantes do ensino médio
O formato permite que alunos dialoguem e produzam mais
Entre os itinerários, consta Ciências
Alunos em grupos para aulas mais "fora da caixinha" na Escola Salesiana Brasília
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O principal foco do novo modelo é sair da sala de aula e explorar o espaço da escola por completo

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Estudantes do ensino médio

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O formato permite que alunos dialoguem e produzam mais

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Entre os itinerários, consta Ciências

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Alunos em grupos para aulas mais "fora da caixinha" na Escola Salesiana Brasília

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O objetivo de toda a mudança não é só valorizar os interesses e aspirações dos estudantes, mas trazer um pouco da vida adulta; do pós-ensino básico para dentro da escola. “O ser humano do qual mais precisamos é de um ser capaz de se engajar, criticar e, mais que tudo, criar sua própria existência”, afirma Valentino Ruy.

E para tirar essa nova realidade do papel, o corpo docente da ESB participou de diferentes cursos, uma forma de capacitação pela própria rede. Além disso, os professores tiveram contato com palestras e análises referentes à BNCC. “Aprendemos, por exemplo, a como avaliar, elencar habilidades e competências dentro dessa nova grade. Uma capacitação bem forte, tanto teórica quanto prática, com oficinas”, esclarece Mayara Silva, professora de Português e Redação. 

Rompimento com a tradição enciclopédica

Na avaliação do especialista em Educação, Valentino Ruy, um dos pontos altos do Novo Ensino Médio é a interdisciplinaridade. Embora a integração de disciplinas já existisse no Ensino Fundamental, é no Médio que existe a real possibilidade de romper com a tradição enciclopédica de dividir o conhecimento. “Ao invés de uma aula de Filosofia, outra de História, e outra de Geografia, os estudantes enfrentarão desafios e experiências na área de Ciências Humanas, que pode conter essas disciplinas e muitas outras”, detalha.

Professor de Matemática, Elias Júnior avalia que essa nova reforma vem da desconstrução de uma educação que é bem tradicional; a mudança se voltou para uma metodologia mais prática para os estudantes. “A partir de agora, a escola passa a importar-se menos com a visão institucional e começa a importar-se mais com o projeto do aluno, ou seja, a potencialidade dele ganha peso nesse novo formato”, destaca.

“Como consultor da ESB, a ideia que criamos e estamos implementando é de discussões sérias e integradas, que impulsionem alunos e professores a mobilizar conhecimentos das mais diversas origens para analisar criticamente a realidade, a fim de criar soluções para os desafios que emergem na sociedade.”

Valentino Ruy, mestrando em Educação pela Universidade de São Paulo (USP) e pós-graduando em Didáticas para implementação da BNCC

Contudo, como exames avaliativos, como o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e o Programa de Avaliação Seriada (PAS), ainda estão sendo moldados para acompanhar a evolução da nova componente curricular do Ensino Médio, a escola promove aulões de preparação aos testes.

Assim, o grande diferencial da Rede Salesiana é já estar com o currículo todo estruturado. “No nosso caso, já que somos uma rede, estamos com o componente pronto desde março deste ano. Além disso, nosso material didático também está alinhado às novas diretrizes”, salienta Neusa.

“No ano passado, eu comecei a estudar Comunicação, e neste ano eu continuei, porque achei muito interessante desenvolver minha fala e aprender a perder o medo de falar em público, já que quero cursar Direito. Na hora de argumentar, eu preciso passar segurança naquilo que estou falando”, pontua a aluna do 2º ano Ana Heloíza.

Para o estudante do 2º ano do Ensino Médio, Brenno Gomes, tem sido bem positivo o processo de adaptação. De acordo com ele, o novo método é melhor porque se desliga daquele antigo formato de “só entregar” e agora entra em campo a possibilidade de colocar a mão na massa e pensar junto com a turma. “Agora, eu consigo aprender de forma mais dinâmica”, comenta.

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Processo de confecção de absorvente sustentável, do Projeto Rosa Esperança
Aluna do segundo ano do Ensino Médio, Ana Heloíza
TCU aponta deficiências no MEC
Aluno Brenno Gomes levando material didático para sala de aula
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Uma das principais propostas do novo Ensino Médio é tirar os alunos da sala para explorarem todo o espaço escolar

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Processo de confecção de absorvente sustentável, do Projeto Rosa Esperança

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Aluna do segundo ano do Ensino Médio, Ana Heloíza

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TCU aponta deficiências no MEC

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Aluno Brenno Gomes levando material didático para sala de aula

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Inclusive, o professor Elias Júnior trabalha em sala com o Minecraft Education. “Adequei. Tive essa oportunidade de trazer um jogo para dentro do âmbito escolar, e os meninos trabalharem as habilidades para o século 21 por meio do game”, conta. Na prática, o docente lança uma pergunta, e os alunos, dentro do jogo, respondem dentro de um contexto. “Por exemplo, um dia trabalhamos a questão da importância do Nobel da Paz”, exemplifica.

Em outra frente, a professora Mayara Silva conduz o projeto Rosa Esperança, cujo tema é a pobreza menstrual, uma problemática emergente no país. “Rosa” simboliza a delicadeza ou sensibilidade feminina. Já “Esperança”, remete ao fato de a sociedade lutar por direitos femininos, sobretudo a garantia do básico, como componentes higiênicos, para as mais vulneráveis. 

No Brasil, 713 mil meninas vivem sem acesso a banheiro ou chuveiro em casa. De acordo com o Unicef, mais de 4 milhões não têm acesso a itens mínimos de cuidados menstruais nas escolas. Essa foi a mola propulsora para que alunos da Escola Salesiana desenvolvessem o projeto. O objetivo é criar uma máquina que produz absorventes. Mas, para isso, é preciso descobrir os diferentes elementos que permeiam a fabricação do acessório e, também, o impacto dele tanto no meio social quanto no ambiental. 

Antes de chegar lá, os alunos estão aprendendo a elaborar absorventes com os materiais que têm na própria casa. Isso contribui tanto para a redução de lixo, a partir do reaproveitamento de material, quanto para a redução de gastos. “A partir de pesquisas e discussões, optamos por construir o absorvente lavável. Já conseguimos construir os protótipos, por exemplo”, afirma Mayara Silva.

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