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A Covid-19 esteve no foco do mundo inteiro durante mais de dois anos de pandemia. Sufocou os hospitais, matou mais de 6 milhões de pessoas e mobilizou grande parte das pesquisas científicas. Mas epidemiologistas enxergam que, em pouco tempo, estaremos livres da paralisia que a doença nos causou e nos acostumaremos com a existência dela numa forma mais leve, combatida facilmente por vacinas e formas de prevenções.
Então, a próxima gestão, que assumirá o Brasil a partir de 1º de janeiro de 2023, deverá ser marcada pela retomada da economia, com investimentos na educação, na segurança pública e, principalmente, na saúde.
Os problemas para os próximos quatro anos vão do básico, como a recuperação da cobertura vacinal contras doenças como a pólio e o sarampo, até questões mais complexas, como a melhoria do atendimento de pacientes com doenças raras e de câncer.
Isso tudo com um orçamento cada vez mais enxuto. Neste ano de 2022, por exemplo, o caixa do Ministério da Saúde diminuiu em 20%, mesmo com o país ainda dentro da pandemia.
Para levantar as pautas que o próximo presidente deverá enfrentar, o Metrópoles promoveu o webinar “Desatando nós na saúde” com representantes de setores público, privado, ONGs e sociedades médicas.
A jornalista Natália André mediou o debate que contou com a participação de Antoine Daher, presidente da Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras; Márcio Reis, diretor de Acesso à Saúde da Pfizer; Paulo Hoff, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica; e Wanderson Oliveira, ex-secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde.
Legados da pandemia
Na visão do doutor Paulo Hoff, além da tragédia de tantas mortes, o mundo terá de batalhar para acabar com o negacionismo que sempre existiu e piorou nos últimos meses.
“Esse negacionismo transbordou. Nós vemos números baixíssimos na vacinação contra outras doenças e talvez essa seja uma tragédia futura que teremos que evitar”
O ex-secretário Wanderson afirma que, quando assumiu o posto no Ministério da Saúde, ainda na gestão Luiz Henrique Mandetta, a situação já era preocupante, mesmo sem a pandemia.
“As coberturas globais vinham caindo desde 2015 e a única que se mantinha acima dos limites esperados era a de tuberculose, com a aplicação da BCG (composta pelo bacilo de Calmette-Guérin) ao nascer. Mas a pandemia trouxe um volume muito grande de informações verdadeiras e falsas misturadas através das mídias sociais e tudo piorou”, ressaltou Oliveira.
Para ele, atualmente as doenças mais preocupantes são a pólio, o sarampo e a rubéola.
Problemas básicos
Todos concordaram que o Brasil ainda não conseguiu resolver problemas básicos como a melhoria na formação de novos médicos.
No caso das doenças raras, por exemplo, mais de 80% têm origem genética, e, portanto, os especialistas são os geneticistas, porém, esses especialistas tendem a ser os últimos consultados durante o diagnóstico da enfermidade. Para Antoine, a capacitação dos profissionais da saúde é ainda mais preocupante do que as questões materiais e estruturais.
“As pessoas demoram mais de um ano para conseguirem uma consulta com um especialista. E quando ele atende, não conhece doenças raras e encaminha para outro, que também não conhece. É por isso que muitos morrem antes do diagnóstico, que demora mais de cinco anos. Nós não temos uma disciplina que ensine doenças raras nos cursos de medicina”
Antoine Daher
Para ele, é fundamental a criação de uma secretaria no Ministério da Saúde para mapear as doenças raras no Brasil. O secretário Wanderson concorda.
“Existem conhecimentos que são muito específicos. É muito importante, portanto, que tenhamos a personificação através de uma secretaria. No entanto, o governo federal tem limites para estabelecer verbas e cargos. Então, dentro da atual realidade, dá para primeiro reforçar a atenção primária e a vigilância para qualificarmos as informações que já temos dos pacientes. Precisamos fortalecer o SUS como um todo, mesmo sendo legítimas as demandas específicas”, explanou Wanderson.
Orçamento e tecnologia
Um dos principais assuntos da live foi a dificuldade de se fazer todas essas melhorias com um orçamento cada vez mais limitado. Todos concordaram que uma saída seria equilibrar três pontos: financiamento do SUS, alocação de recursos e regionalização.
“Uma boa solução é seguir o modelo de remuneração mais focado no resultado do que, propriamente, pelo atendimento realizado”
Wanderson Oliveira
A ajuda da iniciativa privada também foi mencionada durante a discussão. Não apenas com investimentos e parcerias, mas, sobretudo, com o compartilhamento de informações.
“A gente teve um exemplo muito bom na gestão do Mandetta, que foi um compartilhamento de risco de um produto para doenças raras. Esse é um caminho, mas alguns passos precisam ser tomados do ponto de vista legal, além da estrutura do Ministério da Saúde”
Márcio Reis
Vale ressaltar que essa junção de forças do público e do privado foi fundamental para a produção em tempo recorde de vacinas contra a Covid-19. E isso deve continuar acontecendo. “Na Pfizer, a gente repensou as maneiras de fazer as pesquisas para conseguirmos acelerar os processos, porém, contamos com as agências reguladoras ao nosso lado para darmos conta da urgência. A ideia sempre foi sermos mais rápidos, mas sem perder a qualidade”, encerrou Márcio.
Assista ao webinar na íntegra: