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Eleito pela MIT Technology Review como um dos jovens mais inovadores do México em 2016, Daniel Vogel, CEO da Bitso, maior plataforma de criptomoedas da América Latina, está no Brasil há apenas dois meses. Com a missão de liderar a estratégia local da marca, o executivo quer impulsionar o mercado de criptomoedas no país e torná-lo mais acessível aos brasileiros.
Graduado em Ciência e Engenharia da Computação pela Universidade de Stanford com MBA em Administração de Negócios pela Harvard, o executivo se uniu à Bitso em 2015 após constatar o crescimento das moedas digitais ao redor do mundo e o potencial desse tipo de plataforma na inclusão de cidadãos aos serviços bancários.
Entusiasta da tecnologia blockchain e do conceito de descentralização que há por trás das criptomoedas, Vogel acredita que o mercado está apenas no começo e permite uma série de soluções que vão muito além da compra e venda de ativos digitais. Confira, a seguir, entrevista exclusiva:
Qual o panorama que você faz do cenário de moedas digitais nos últimos anos?
Temos visto muitas utilizações, além da mera compra e venda. Notamos o crescimento de funções como pagamento, operações transnacionais, o uso de stablecoins (tipo diferenciada de moeda digital que tem como objetivo oferecer menor volatilidade de preços por ser atrelada a um ou mais ativos de reserva), o envio de remessas. É um panorama bastante positivo, marcado por uma crescente adoção e muita inovação.
É comum vermos histórias de pessoas que compraram criptomoedas com valor baixo há 10 anos e hoje conseguiram uma rentabilidade dos sonhos. Ainda há espaço para lucros exponenciais neste setor?
Quando lançamos a empresa, estávamos focados no potencial que toda essa tecnologia poderia atingir. Ainda há uma perspectiva enorme a longo prazo. Tivemos a oportunidade de ver muitas coisas grandes acontecendo neste mercado, mas acredito que estamos apenas no início de uma longa corrida. A compra de moedas para fins especulativos e as aplicações seguirão crescendo, levando a cabo uma redefinição do sistema financeiro tradicional.
Veremos a chegada de novos produtos e serviços. Esta indústria ainda é muito pequena e tem um potencial gigantesco de expansão – muito maior até do que estamos vivendo.
Como a pandemia impactou o mercado de criptomoedas ao redor do mundo?
A pandemia trouxe insegurança em diversas áreas, e muitas pessoas passaram a defender a ideia de que o Bitcoin poderia ser uma alternativa interessante para proteger valores devido às incertezas que existia no mundo. Então, vimos um aumento de preço do Bitcoin e de outras moedas digitais. Também passamos a ver uma demanda grande por serviços financeiros digitais, pois as pessoas precisavam acessar soluções digitais globais, que operassem 24 horas por dia a partir do celular. Então, todo o mercado de criptomoedas cresceu muito.
Devido ao nervosismo causado pela pandemia, principalmente em como os governos iriam reagir a esse momento, notamos muitas pessoas dispostas a interagir com ativos que estivessem desconectados do sistema financeiro internacional.
Passamos por um processo bastante interessante no último ano, registrando alta de preços (nas moedas) nos últimos meses. Agora estamos vendo uma correção de valores – o que é comum para esse tipo de ativo, já que há bastante volatilidade, e as pessoas ainda estão tentando entender como funciona. O patamar mínimo alcançado pelo Bitcoin antes da pandemia, se não me engano, foi de US$ 3.200. Hoje estamos entre US$ 38 mil e US$ 40 mil. Ou seja, mesmo com a correção recente, a cotação ainda permanece muito acima daquela registrada há um ano.
O Banco Central do Brasil tem discutido a criação do chamado Real Digital, a criptomoeda brasileira. Como isso pode mexer com o setor no país?
Para nós, somente o fato de o Banco Central estar analisando a criação de uma criptomoeda já é uma enorme validação para a tecnologia. Há 10 anos, havia ceticismo sobre a tecnologia, se ela iria funcionar e se os paradigmas envolvidos eram corretos. Hoje, vemos empresas gigantescas como o Facebook lançando projetos próprios. Agora, até os Bancos Centrais estão se movimentando para criar seus ativos. Além de ser uma enorme validação, poderá melhorar de maneira importante o acesso a serviços financeiros. É uma forma de dar continuidade a esse grande passo que o Banco Central tem dado de adotar novas tecnologias e utilizá-las para o benefício da população brasileira.
Acreditamos que pode trazer um impacto essencial para a inclusão financeira. Esse tipo de moedas digitais, chamadas pela indústria de central bank digital currencies (ou moedas digitais emitidas por Banco Central), pode ser um complemento importante para o mercado financeiro, em geral.
É preciso haver a participação de mais players neste mercado. E os bancos centrais, que são especializados em sistemas de pagamentos, e sobretudo o Brasil, que obteve, recentemente, um estrondoso sucesso com o Pix, podem colaborar.
Não achamos que as central bank digital currencies sejam uma substituta perfeita para tudo o que estamos vendo nas criptomoedas do ponto de vista de descentralização, mas acreditamos que isso siga empurrando a indústria para frente. O Bitcoin é muito importante porque está separado de mecanismos inflacionários e de controles de câmbio, então, acredito que as central bank digital currencies têm um lugar e podem gerar, sim, um impacto muito positivo na população. Além disso, outras criptomoedas como o Ethereum também são altamente relevantes, já que têm por trás propostas de valor importantes que permitem as funcionalidades de aplicativos e contratos inteligentes.
Há uma expectativa pela chegada de grandes investidores neste mercado, como fundos de pensões, bancos, etc. Você acredita que o ingresso desses players poderá colocar as moedas digitais em outro patamar?
100%. Quando entram esses tipos de players, o que vemos é um incremento na adoção, na participação e nos investimentos em todo o ecossistema. Há mais gente atuando para educar o mercado, então, tudo ao redor começa a crescer. Para nós, ver a chegada desses players é emocionante, pois atrai mais gente para o setor, e isso é importante. Nos Estados Unidos, vemos empresas como Robinhood (corretora on-line) e Pay Pal (sistema de pagamentos) começarem a blindar o acesso, e isso permite que a indústria cresça. Vemos também que esses investidores institucionais começam a ter mais abertura para tomar posições relacionadas ao Bitcoin ou em outros criptos.
Isso é importante, pois, em um futuro próximo, as moedas digitais terão que ser parte fundamental de quase qualquer portfólio de investimento. Os retornos têm sido bem claros, e a promessa segue sendo grande.
Acho que essa adoção institucional aumenta a credibilidade da indústria, dos players e irá gerar oportunidades para uma maior regulamentação e investimentos.
O que a pessoa deve fazer para conseguir distinguir informações relevantes que circulam dentro do mercado de moedas digitais de meras especulações?
É importante acessar veículos locais e internacionais com boa reputação. Ainda há muita informação de má qualidade a respeito deste universo, porém, contamos com meios especializados em criptomoedas e blockchain, que oferecem informações atualizadas e com sofisticação necessária para distinguir projetos legítimos daqueles que não são. Entender a proposta de valor de cada moeda é entender de onde ela vem, o que pretende fazer e quais os objetivos das pessoas que estão por trás dela.
Há uma frase no mundo do cripto que é “Do your own research” (DYOR) (faça sua própria pesquisa, em tradução). Ou seja, não confie no que as pessoas dizem na internet, nas redes sociais. Faça sua própria análise.
Nos próximos anos, veremos as criptomoedas cada vez mais presentes em nosso dia a dia? Que papel esse tipo de ativo poderá desempenhar no futuro?
Estamos vendo criptoativos sendo utilizados, em grande parte, para três coisas: investimentos (também podemos chamar de especulação); reserva de valores (há muitas pessoas ao redor do mundo que mantêm dólares nas redes de Ethereum. Gente que deseja guardar dólares, mas não debaixo do colchão. Vemos esse comportamento, especialmente, na América Latina, onde as moedas locais têm muita volatilidade e há muita perda de poder aquisitivo); e como fonte de solução financeira comum, como função de pagamento, envio de remessas, obtenção de créditos. Podemos acompanhar uma série de criações de produtos e serviços. Isso é muito emocionante, mas ainda falta muito o que fazer.
A meta que temos como empresa é fazer com que criptomoedas sejam úteis, e que as pessoas possam utilizá-las no dia-a-dia, além de somente um elemento de investimento ou especulação.
Bitso
Aplicativo: Bitso App
Plataforma: Bitso Alpha