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A rotina desafiadora para quem convive com a Atrofia Muscular Espinhal (AME) demanda mobilização social para ampliar o acesso aos cuidados necessários para o ganho de autonomia e qualidade de vida para os cerca de 1,4 mil pacientes, entre bebês, crianças e adultos, que estão com esta condição no Brasil. Os dados são do Instituto Nacional da Atrofia Muscular Espinhal (Iname).
Para ampliar o debate sobre o tema, o portal Metrópoles, em parceria com a Roche, realizou na última terça-feira (26/10) a live #AmeTodoDia: Desafios nos cuidados da Atrofia Muscular Espinhal, com a presença de especialistas e uma paciente que compartilharam informações e histórias sobre a doença molecular.
Considerada rara, por acometer 1 a cada 10 mil nascidos vivos, a AME é uma doença genética, determinada por alterações no DNA, que afeta as células nervosas da medula espinhal que controlam os músculos, a ponto de deixar os pacientes sem forças para andar, engolir e até respirar.
Os principais sintomas são fraqueza e atrofia dos músculos, pernas, braços e tronco. A AME é classificada em cinco tipos (0, 1, 2, 3 e 4) de acordo com a idade de início dos sintomas e a força muscular máxima que o paciente adquire. Quanto menor o tipo, mais grave a doença.
A grande maioria dos casos é identificada na infância por meio de um exame clínico. Se detectados os primeiros sinais de alerta, o paciente é encaminhado ao teste genético. Por tratar-se de uma doença progressiva, é fundamental o diagnóstico precoce e preciso. “Estamos falando de neurônios que se degeneram e não voltam mais. Portanto, quanto mais cedo for tratado, melhor é a evolução do paciente. Com o avanço da medicina e com as terapias que interferem na base genética da doença, conseguimos estabilizar o quadro”, esclarece Rodrigo de Holanda, médico neurologista do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Além de ser uma doença rara, o tratamento é de alto custo – não só com os medicamentos, mas também para a atenção multidisciplinar e os valores gastos em deslocamentos às consultas e internações. O valor com deslocamento pode chegar a R$ 4.895 por ano, segundo recente estudo do Jornal Brasileiro de Economia da Saúde (JBES). Além disso, o tratamento ainda engloba terapias de suporte, tais como fisioterapia, fonoterapia, terapia ocupacional e o acompanhamento de nutricionistas, elevando as despesas para os pacientes e suas famílias.
A fisioterapeuta especializada em neurologia, Cristina Iwabe, lida com pacientes com AME há 15 anos. “É necessário contar com profissionais que atendam, não somente para as partes de reabilitação motora e fisiorespiratoria, mas também terapeutas e uma equipe multidisciplinar, uma vez que os pacientes podem ter dificuldade de engolir e mastigar. Também é fundamental o acompanhamento de um terapeuta ocupacional, considerando que a AME tipo 2, 3 e 4 exige da pessoa uma maior destreza em funcionalidade e no movimento superior”, explica.
Avanços e desafios
No Brasil, os cuidados assistenciais, multidisciplinares e de suporte para os pacientes com a doença têm evoluído e contribuído para o ganho de sobrevida dos pacientes. Mas, apesar da aprovação regulatória para terapias inovadoras, nem todas as tecnologias estão incorporadas ao Sistema Único de Saúde.
Atualmente, o SUS oferta tratamento apenas aos pacientes com AME tipo 1, que não fazem uso de ventilação mecânica contínua. Após a aprovação do novo protocolo clínico e diretrizes terapêuticas (PCDT) serão contemplados pacientes até 12 anos de idade com AME tipo 2. Para os demais, o tratamento ainda não está disponível.
Juliane Godoi, diretora do INAME (Instituto Nacional da Atrofia Muscular Espinhal) e mãe do pequeno André, de cinco anos, diagnosticado com AME tipo 1 aos 40 dias de vida, diz que os maiores desafios das famílias que procuram o Instituto envolvem os impactos emocional e financeiro, além do acesso aos tratamentos nos centros de referência credenciados. “Muitos pais optam por se mudar de cidade para estar em um local mais próximo do centro de referência. Largam a família e o emprego para cuidar da saúde do filho e ter apoio no hospital”, conta.
AME na fase adolescente e adulta
Apesar da criança ser o principal perfil conhecido de paciente, a AME é progressiva e pode atingir, mesmo em menor proporção, os mais velhos. Os sintomas da forma menos grave da doença, o tipo 4, podem ter início depois dos 18 anos de idade.
Paralelamente, há pacientes na fase adulta que convivem com a AME desde pequenos. Eles são, na grande maioria, pacientes diagnosticados na infância com os tipos 2 ou 3 e que seguem convivendo com a AME e com todas as limitações impostas pela doença.
É o caso da Natália Barnabé, psicóloga e psicanalista, diagnosticada com AME tipo 2 quando tinha um ano de idade. Quando iniciou o tratamento medicamentoso e multidisciplinar em 2016, a jovem – que dependia totalmente da cadeira de rodas, não conseguia mais sustentar o pescoço e estava com os movimentos dos braços e pernas enfraquecidos – apresentou melhoras significativas: ganhou estabilidade respiratória e de tronco, passou a firmar o pescoço, escrever, comer sozinha e mexer os braços.
“A manutenção das minhas capacidades já significa muito. Com a capacidade humana de adaptação, tenho vivido os meus 26 anos fazendo o que eu gostaria de fazer com a minha condição e ajudando pessoas nesse processo”, reforça. Atualmente, Natália realiza atendimentos clínicos e dá palestras sobre saúde mental, inteligência emocional, inclusão e acessibilidade.
Apoie a causa
O interesse em contribuir para que os melhores tratamentos de doenças raras, incluindo AME, sejam disponibilizados para todos é cada vez maior. Isso porque pacientes, médicos, gestores ou pessoas que têm algum tipo de contato com a doença podem ajudar nas tomadas de decisão do Sistema Único de Saúde (SUS) sobre a incorporação de novas tecnologias. De que forma? Participando de consultas e audiências públicas divulgadas pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (CONITEC). Para que os pacientes possam, no dia a dia, ter acesso aos cuidados de saúde necessários, a comunidade pode contribuir nas consultas e audiências públicas da Conitec, opinando sobre o processo de incorporação, compartilhando conteúdos científicos ou enviando relatos sobre o convívio com as doenças degenerativas e as limitações que ela traz no dia a dia, desde o trabalho, ao impacto social e à qualidade de vida.
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