O que Arthur Lira quer de Lula
Para que o Centrão apoie o governo, presidente da Câmara deseja ter o Ministério da Saúde e outros cargos importantes da máquina federal
atualizado
Compartilhar notícia
Entra governo, sai governo, os movimentos dos partidos do Centrão são sempre os mesmos. O plano, independentemente de quem está no poder, sempre é abocanhar cargos relevantes com verbas polpudas em troca de apoio no Congresso Nacional.
Até o fim do governo de Jair Bolsonaro, as legendas que integram essa porção mais fisiológica do Parlamento estavam fechadas com o Palácio do Planalto. Em troca, tinham tudo o que queriam — exemplo maior disso é o generoso orçamento secreto.
Agora, com Lula diante da necessidade premente de montar uma base mínima de apoio para aprovar suas propostas, uma parcela significativa do Centrão, incluídos aí parlamentares que até outro dia faziam juras de amor a Bolsonaro, dá mostras explícitas de que topa apoiar o novo governo desde que receba algo em troca.
É essa lógica, a mesma que levou a escândalos grandiosos como o mensalão e o petrolão, que tem guiado os movimentos de Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados e um dos “donos” do PP, ou Progressistas, partido que funciona como pilar do Centrão.
Nas últimas semanas, Lira passou a falar grosso na direção de Lula. Fez questão de dizer que o governo, hoje, não tem votos para aprovar nem mesmo um projeto de lei, que depende de um númeo de votos muito menor, por exemplo, que uma emenda constitucional. O quadro, frisou, é o mesmo na Câmara e no Senado.
A mensagem é clara: se quiser fazer suas propostas andarem, o governo precisa sentar para negociar apoio.
A fatura
Ao mesmo tempo, Lira faz chegar ao Planalto o tamanho da fatura. Como chefe do Centrão, ele exerce liderança não apenas no PP, que conta com outros 48 deputados federais, mas também sobre bancadas de outros partidos, como o União Brasil, que ganhou três ministérios de Lula mas ainda não entregou o apoio supostamente prometido.
Neste momento, o presidente da Câmara tem demonstrado interesse especial pelo Ministério da Saúde, hoje ocupado por Nísia Trindade, da cota do PT.
A pasta, que já foi comandada num passado bem recente pelo PP em associação com outras legendas do Centrão, é uma das joias da coroa da administração federal, com orçamento anual de cerca de R$ 150 bilhões.
Caso Lula ceda, Arthur Lira e seus parceiros terão alguém para, mais do que depressa, assumir a cadeira. Mas não será suficiente. A lista de demandas inclui, ainda, cargos de segundo escalão e posições estratégicas em bancos públicos, como a Caixa e o Banco do Brasil.
Um aliado de Lira diz, sob reserva, que ele tem jogado duro porque só assim o novo governo dará valor aos votos que seu grupo político pode entregar — a lógica de sempre, portanto.
Encarregado de atuar na linha de frente da negociação, o líder do governo na Câmara, o deputado petista José Guimarães, tem se queixado das dificuldades.
Na quarta-feira da semana passada, na sala de espera do gabinete de Lira, ele se queixava da falta de gestos mais concretos do presidente da Câmara em direção ao Planalto.
Guerra fria
Guimarães e o governo esperam, obviamente, sinais de boa vontade no lugar das tentativas de emparedamento. Não é, porém, o que Lira e seus aliados pretendem fazer: em resposta, eles têm dito que é o governo que precisa apresentar propostas para garantir a adesão do Centrão.
Embora aliados admitam a possibilidade de Lula, mais cedo ou mais tarde, fazer ajustes na equipe de governo para equacionar as demandas e, assim, ter uma base de apoio mínima para aprovar propostas no Congresso, Guimarães ensaia um jogo duro similar ao que é feito pelo outro lado.
Nos últimos dias, ele chegou a dizer que insistiria somente por mais algumas semanas na negociação de apoio no atacado com Lira. Caso não tenha êxito, prometeu, passará a buscar apoios “no varejo”, tanto no PP quanto em outros partidos.
O próprio líder do governo, porém, é visto como um entrave para que o acerto saia. Arthur Lira e outros deputados do Centrão dizem que ele é inconfiável, que não respeita acordos, que acerta algo num dia e, no outro, tudo muda.
Ao que tudo indica, será uma questão para Lula resolver pessoalmente. A que preço, ainda não se sabe. A única certeza que há é que barato não sairá.