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Laranjas na eleição: partidos voltam a lançar candidatas só para cumprir exigência

De diaristas a massagista tântrica, siglas recrutam mulheres de última hora para preencher a cota de candidaturas femininas exigida por lei

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Fotografia de uma urna eletrônica - Metrópoles
1 de 1 Fotografia de uma urna eletrônica - Metrópoles - Foto: Gustavo Moreno/Metrópoles

Foco de denúncias nas eleições de 2018, o esquema de candidaturas laranjas lançadas pelos partidos apenas para preencher a cota de 30% de candidatas mulheres exigida por lei ganhou destaque na primeira sessão do Tribunal Superior Eleitoral sob o comando do ministro Alexandre de Moraes, na última quinta-feira.

Sem meias palavras, o novo presidente do TSE afirmou que não irá permitir candidaturas laranjas “simplesmente para fingir que as mulheres estão sendo candidatas” e que se a prática for comprovada neste ano, chapas inteiras de candidatos serão impedidas de concorrer.

Há quatro anos, quando o esquema veio à tona com candidatas do PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro à época, constatou-se que havia um denominador comum nas candidaturas suspeitas de serem de fachada. Todas tiveram pouquíssimos votos nas urnas e os repasses que recebiam do fundão eleitoral, a verba pública a que os partidos têm direito para financiar seus candidatos,  destoavam dos demais concorrentes: ou recebiam valores expressivos, a depender de quem as indicava, a ajuda era nenhuma.

Normalmente, os alvos desse tipo de prática são mulheres que desconhecem como funciona a política e são iludidas com o sonho de se elegerem ou simplesmente enganadas por lideranças partidárias locais. Há também aquelas que topam fazer o jogo a pedido de algum político a quem são ligadas de alguma maneira.

Das mulheres acusadas no suposto esquema do PSL em Minas Gerais e Pernambuco nas eleições de 2018, apenas Mariana Nunes se lançou novamente candidata pelo União Brasil, partido comandado pelo deputado Luciano Bivar, que presidia o PSL naquele ano. Ambos chegaram a ser indiciados pela Polícia Federal em 2019, mas o caso resultou em absolvição na Justiça Eleitoral, em junho deste ano.

Embora a campanha eleitoral deste ano esteja apenas no início, já é possível identificar nas mais de 9 mil candidaturas de mulheres registradas no TSE algumas candidatas a serem as novas “laranjas” desta eleição. A seguir, alguns casos reunidos pela coluna.

 

 

Entre as oito candidatas que o PL lançou para disputar uma vaga na Assembleia Legislativa de Rondônia está Rosana Lobo, de 34 anos, que também foi candidata a vereadora na capital de Rondônia há dois anos e recebeu apenas 33 votos. Na ocasião, ela usou um outro sobrenome na urna e gastou os R$ 4 mil que recebeu do fundo eleitoral com tesoureiro e contador de campanha — nada foi investido em material de divulgação. Agora, também não há nenhuma propaganda da candidatura dela em rede social. Procurada, Rosana desligou o telefone ao ser questionada sobre a candidatura a deputada.

As domésticas recrutadas pelo Agir

No Acre, outro estado do Norte do país, a solução encontrada pelo partido Agir, antigo PTC, que já teve o senador Fernando Collor entre seus filiados, foi recrutar empregadas domésticas para conseguir atingir o mínimo de 30% de mulheres na chapa de candidatos a deputado estadual. Uma delas é Adriana Andrade, de 41 anos, que ganha R$ 1,2 mil por mês trabalhando como diarista e como servente em um restaurante de beira de estrada na capital Rio Branco. Ela conta que aceitou o “desafio” de ser candidata em uma conversa com o presidente do partido no estado, mesmo sem saber o que faz um deputado na Assembleia Legislativa.

“Pra ser bem sincera, eu realmente nunca nem pensei (em me candidatar), nunca passou pela minha cabeça, mas veio essa proposta pra mim e eu aceitei esse desafio”, disse à coluna. Ela conta que foi prometida uma ajuda financeira para a campanha, com valor ainda não definido, e que ainda está se informando sobre as atribuições de um parlamentar estadual. “Sei dizer que eles têm que apoiar mais as pessoas carentes. Fazer o que tem que fazer. Tentar ajudar, não atrapalhar, né?”, disse Adriana, uma das sete candidatas mulheres do Agir, que lançou 21 nomes para a Assembleia (ouça abaixo).

Para atingir a cota de 30% o partido também convenceu a empregada doméstica Maria Zuila dos Santos Silva, de 57 anos, a repetir a dose nesta eleição, após ter sido praticamente abandonada há dois anos pelo PSDB, partido pelo qual disputou o cargo de vereadora na cidade de Acrelândia, no interior do estado. Na ocasião, ela recebeu cerca de R$ 300 em santinhos do partido e obteve apenas três votos. “Pra uns é pouco, mas para Deus é muito”, disse à coluna. Segundo ela, o cenário pode se repetir nesta eleição porque até agora o Agir não deu nenhuma garantia de que irá repassar dinheiro do fundo eleitoral para todas as campanhas.

Responsável por recrutar as candidatas, o presidente do partido no estado e candidato a governador, David Hall, responsabilizou as mulheres pelo que classifica como “pouco engajamento” político. “Nós saímos procurando candidatas em potencial, mas não com esse objetivo exclusivo de cumprir a cota”, disse. “Na verdade, isso (desconhecimento sobre a política) está se revelando agora. Quando eu fiz o convite eu não estava convidando para ser candidata laranja. Eu achei que elas toparam porque elas realmente queriam ser deputadas para representar a população”, completou o dirigente, que vai receber R$ 100 mil do fundo eleitoral para depois dividir com outros 31 candidatos do partido. Ao todo, o Agir terá R$ 23 milhões do fundão para bancar campanhas em todo o país.

A candidata de um voto que não pode falar

Partido mais rico do país depois da fusão do DEM com o PSL, o União Brasil também arregimentou uma candidata que não tem voto — e nem autonomia para falar — para compor sua chapa de deputados estaduais. Apesar de jovem, Amanda Bentes, de 26 anos, pode ser considerada uma veterana em eleições. Concorreu a vereadora em 2016 e 2020 e a deputada em 2018, pelo antigo DEM. Somando a votação das três disputas, ela obteve 18 votos. O pior desempenho foi há quatro anos, quando recebeu um único voto na urna.

A coluna entrou em contato com Amanda pelo telefone, mas a conversa foi interrompida por um homem que se identificou como coordenador da campanha da candidata. Ele se identificou como Amaro, e tomou a frente da conversa. Sem deixar que a própria Amanda falasse, alegou que a candidata a deputada estadual sempre se interessou pela política e conseguiu concretizar sua candidatura por meio de seu pai, que tinha contatos dentro do DEM. Na última eleição, quando concorreu a uma vaga na Câmara Municipal de Macapá, ela recebeu R$ 25 mil do partido e gastou a verba com produção de santinhos em gráfica, aluguel de carro, um motorista, um coordenador de campanha e um coordenador. Conseguiu 15 votos.

Indagado sobre os motivos pelos quais Amanda voltou a se candidatar a deputada estadual nas eleições deste ano, o homem que se apresenta como coordenador da campanha disse que em “todo pleito existe sempre essa demanda (por candidaturas femininas)” e que, “como temos que cumprir essas exigências, é por isso que às vezes o pessoal repete os nomes”. Segundo ele, o partido irá avaliar as reais possibilidades de Amanda ser eleita 15 dias depois do início de sua campanha, que começou oficialmente na última terça-feira.

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