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De uvas e azeitonas à crise com Israel: Lula sem script é um perigo

No governo, há quem se mostre preocupado com as posições manifestadas por Lula nos últimos tempos. O difícil é achar quem diga isso a ele

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Ricardo Stuckert/Presidência da República
Em imagem colorida, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva planta oliveira no jardim da embaixada da Palestina em Brasília
1 de 1 Em imagem colorida, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva planta oliveira no jardim da embaixada da Palestina em Brasília - Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República

É cada vez maior, dentro do governo, a preocupação com os improvisos verbais do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

De pequenos deslizes a declarações capazes de detonar grandes crises diplomáticas, como aquela na qual comparou a ofensiva militar israelense em Gaza ao Holocausto, Lula tem errado no cálculo quando fala sem um discurso previamente elaborado por auxiliares ou se rende à pressão ideológica de seus seguidores.

Integrantes do governo demonstram, em privado e sob reserva, temor de que situações como a que detonou a crise com Israel se repitam e possam causar problemas ainda mais sérios daqui até o final do governo.

Outra preocupação é com a maneira como o presidente tem se mostrado permeável à influência de algumas pessoas que o cercam, em especial a primeira-dama Janja Lula da Silva, e repetido o que ouve sem antes consultar ou discutir os temas mais delicados com seus auxiliares.

Muitas vezes, as derrapadas envolvem temas caros à militância petista e de esquerda. Lula as pronuncia de viva voz como se falasse apenas para seu público, sem considerar os reflexos institucionais. É como se esquecesse que é presidente — e como se deixasse de lado o fato imperativo de que tudo o que fala tem implicações para o país.

Lula parece bem menos pragmático do que em outros tempos, mais exposto a influências de ordem ideológica para agradar as suas claques e, ainda, mais suscetível a gafes.

Nas declarações sobre a guerra em Gaza, no geral, e na comparação dos ataques de Israel ao Holocausto, em particular, há quem veja boa dose de influência de Janja.

É sabido que, sobre esse tema, a primeira-dama tem posições que a aproximam das franjas mais radicais da militância. Ela não esconde, por exemplo, que entende que a campanha de Israel em Gaza é genocídio. As falas de Lula têm refletido o que Janja pensa, observam esses mesmos integrantes do governo.

Além disso, há dedos apontados também para Celso Amorim, assessor especial do presidente para assuntos internacionais.

Super influente no Planalto desde o início do governo e com poderes comparáveis aos dos poderosos conselheiros de segurança nacional que servem aos presidentes americanos, Amorim tem se mostrado mais ideológico do que na época em que ocupou o cargo de chanceler, nos dois primeiros mandatos de Lula. Com frequência, suas posições atropelam o conhecido pragmatismo do Itamaraty. A ponto de Mauro Vieira, o chanceler oficial, ter que se curvar.

Condescendente com Putin e Maduro

No mesmo giro no qual fez a mais do que polêmica declaração sobre a guerra em Gaza, também falando de improviso, Lula derrapou ao responder perguntas sobre a morte de Alexei Navalny, o principal opositor de Vladimir Putin, e sobre a expulsão de observadores de direitos humanos da ONU pelo regime do ditador venezuelano Nicolás Maduro.

De Navalny, ele disse que é preciso primeiro aguardar o resultado das investigações, como se fosse possível esperar uma apuração diligente e séria do governo que já havia tentado matá-lo outras vezes.

“Senão você julga agora que foi não sei quem que mandou matar e não foi. Depois você vai pedir desculpas? Para que essa pressa de acusar alguém?”, respondeu.

Quando indagado sobre a decisão do regime de Maduro de mandar embora da Venezuela pelo menos doze funcionários do escritório local do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Lula saiu igualmente pela tangente.

“Não tenho as informações do que está acontecendo na Venezuela, a briga da Venezuela com a ONU”, declarou em Adis Abeba, capital da Etiópia, como se um político que a todo tempo se gaba como o grande líder sul-americano pudesse simplesmente não saber de algo tão relevante acontecendo ali do lado, em um país vizinho.

O risco da autoconfiança

Seja com declarações improvisadas que não embutem o fator diplomático, seja assumindo posições que levam mais em conta simpatias baseadas na ideologia (no caso de Maduro) ou em cálculos de outra ordem (no caso de Putin, parceiro nos Brics), Lula sem script virou uma preocupação até para seus mais próximos aliados pelo simples risco de deflagrar turbulências inesperadas.

Por mais que se saiba que é algo quase impossível, dado o conhecido grau de autoconfiança do petista, no entorno presidencial há quem entenda que ele deva cuidar melhor de suas aparições públicas.

Isso ajudaria não apenas a evitar crises, mas também gafes desagradáveis como a da semana retrasada, quando o presidente brasileiro foi convidado a plantar uma oliveira na embaixada da Palestina em Brasília.

Lula perguntou ao embaixador Ibrahim Alzeben quando nasceriam as uvas (veja aqui). O vídeo, publicado em seus perfis, viralizou nas redes e a cena virou motivo de piada. Ninguém disse a ele, no ato, que oliveiras dão azeitonas — e não uvas.

Assim como a falta de gente que possa avisar claramente quando se está errado, excesso de autoconfiança, quase sempre, tem consequências desagradáveis.

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