Carta aberta ao Colégio Bandeirantes: reflexões e responsabilidade
Como educador, e sobretudo como ser humano, não posso deixar de responsabilizar a escola pelos atos violentos e rotineiros
atualizado
Compartilhar notícia
Prezada Comunidade Escolar do Colégio Bandeirantes,
Escrevo esta carta movido pela profunda dor e indignação que se abateram sobre parte do país, com a morte trágica de Pedro Henrique, um jovem de apenas 14 anos, cuja vida foi ceifada pela violência corrosiva do racismo. Como educador, e sobretudo como ser humano, não posso deixar de responsabilizar a escola, assim como cada um participante da comunidade educacional — educadores, responsáveis e alunos — pelos atos violentos e rotineiros e a omissão que resultou nessa irreparável perda.
A educação tem o poder de transformar, mas também pode destruir quando se permite ser conivente com as injustiças sociais. A segregação e a discriminação racial que se perpetuam em espaços que deveriam ser de acolhimento e crescimento estão matando nossas crianças e jovens. A morte de Pedro Henrique não pode ser dissociada do ambiente hostil e excludente que, segundo relatos, ele enfrentava diariamente. A escola, como instituição, tem a obrigação moral e social de combater essas mazelas, de ser um bastião na luta antirracista, e de não reproduzir as mesmas estruturas que marginalizam e destroem.
A decisão de revisar ou cancelar o programa de bolsas, como tem sido cogitado, é não apenas equivocada, mas perigosa. A diversidade dentro das salas de aula é essencial para a formação de cidadãos conscientes e para a construção de uma sociedade justa. A presença de alunos de diferentes origens, classes sociais e realidades é o que enriquece o ambiente escolar e combate a reprodução de preconceitos. Retirar essa possibilidade é acentuar ainda mais a segregação e o abismo social que separa os mais favorecidos daqueles que lutam por uma vida melhor.
O racismo não é apenas o ato explícito de discriminar, mas também o silêncio, a indiferença e a omissão diante da dor do outro. É não ensinar em casa e na escola que a igualdade não é uma escolha, mas uma obrigação. Cada um de nós tem a tarefa de educar para a diversidade, de ensinar a importância do respeito e da dignidade humana em todas as suas formas. A escola deve ser um espaço de transformação, onde a luta antirracista seja central e inegociável.
É preciso que o Colégio Bandeirantes reveja suas práticas, assuma suas deficiências, e se comprometa a ser um modelo na causa antirracista. Isso implica reconhecer que está falhando, que as estruturas que deveriam proteger e acolher estão, em vez disso, sufocando vidas. Somente a partir desse reconhecimento será possível construir um novo caminho, onde a escola não apenas acolha, mas também seja uma força ativa na transformação social.
À família de Pedro Henrique, meu mais profundo respeito e solidariedade. Nenhuma palavra pode aliviar a dor da perda de um filho.
É hora de mudar, de romper com a conivência silenciosa e de construir uma escola que verdadeiramente eduque para um mudo menos desumano. Que se possa fazer dessa instituição um exemplo de inclusão, respeito e transformação, para que outras vidas não sejam perdidas.
Acreditando na educação,
Rodrigo França.
INDICAÇÃO:
Livro O Enegrecer Psicopedagógico: um Mergulho Ancestral, por Clarissa Brito – Editora: Jandaira.
Clarissa Brito expõe os modos como a psicopedagogia pode oferecer recursos para o debate sobre o impacto do racismo estrutural na aprendizagem das crianças negras, propõe ferramentas para uma educação antirracista e para a construção de referências positivas para todas as crianças. Este é um livro essencial para educadores, psicopedagogos e todos interessados em lançar um olhar plural para a prática educacional.