Polícia aciona Justiça sobre membro do Conselho de Lula: “Investigado”
Delegacia de Investigações sobre Crimes Contra a Administração e Combate a Corrupção questionou Justiça sobre membro do Conselhão de Lula
atualizado
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A Polícia Civil de São Paulo pediu informações à Justiça sobre o empresário José Garcia Netto, membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável, conhecido como o “Conselhão” de Lula. No comunicado, o delegado Tiago Correia informou que Netto é investigado por lavagem de dinheiro pela Divisão de Investigações sobre Crimes Contra a Administração, Combate a Corrupção e Lavagem.
A polícia tem indícios de que Netto seria sócio oculto da Transportes Suzano LTDA, a Suzantur, que pertencia ao irmão dele, Ângelo Garcia, e hoje é administrada oficialmente por Claudinei Brogilatto. Ou seja: os investigadores querem saber se Netto botou um laranja no comando da empresa. O suposto crime financeiro tem como pano de fundo o milionário processo de falência da viação Itapemerim, empresa que já chegou a ser a maior do Brasil no setor e fechou as portas em 2022.
Ao juiz João Rodrigues Filho, da Vara de Falências e Recuperações Judiciais, o delegado perguntou se Netto ou o banco Caruana são credores da Itapemerim. O ofício foi enviado em março deste ano. Um mês antes, a coluna revelou que Netto é alvo de um inquérito aberto pela Polícia Federal (PF) que apura uma outra irregularidade: fraude milionária ao sistema financeiro.
No Conselhão de Lula, Netto é descrito como “empresário do setor de mobilidade urbana, formado em administração de empresas”, fundador de uma instituição financeira – a Caruana Financeira S.A. – “especializada no financiamento de inovações voltadas para o transporte de passageiros”. É exatamente por essa “especialidade” que o empresário está sendo investigado pela Polícia Civil. Recentemente, Lula convocou o Conselhão para debater a situação do Rio Grande do Sul.
Com a Caruana, Netto financiou a compra de ônibus para a Suzantur em uma parceria iniciada em 2013, quando a empresa passou a ser administrada por Brogliatto. No mesmo ano, a Suzantur foi contratada de forma emergencial pela prefeitura de Mauá (SP) para prestar o serviço de transporte público no município. Em 2014, a empresa venceu a licitação e passou a operar de forma regular.
A Caruana passou a controlar o sistema de bilhetagem do transporte público de Mauá. O mesmo cartão usado como vale-transporte podia ser usado como cartão de crédito no comércio local, com as linhas de crédito comercializadas pela empresa de José Garcia Netto. Assim, o lucro da Caruana na parceria com a Suzantur passou de R$ 6,8 milhões em 2015 para R$ 13,1 milhões em 2018.
Em setembro de 2022, a Suzantur arrendou por 12 meses toda a estrutura da Itapemirim – que teve sentença de falência proferida pela Justiça de São Paulo -, começando a operar a marca em março de 2023. Em abril deste ano, a Suzantur conseguiu aprovar a renovação do arrendamento da Itapemirim.
Segundo relatório apresentado à massa falida sobre o primeiro período de arrendamento, até janeiro de 2024 a operação havia gerado R$ 96,5 milhões de Receita Bruta Real e R$ 79,2 milhões de Receita Líquida Real. A Suzantur pagou à massa falida, durante o arrendamento, R$ 200 mil mensais e 1,5% extra pelas vendas de passagens.
A negociação chamou a atenção da Polícia Civil de São Paulo, que já investigava suspeitas de lavagem de dinheiro envolvendo José Garcia Netto e a Suzantur. Em ofício enviado à 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo em março deste ano, a Polícia comunicou o andamento do inquérito e pediu informações sobre a fiscalização das atividades de arrendamento.
Diretor-presidente da Caruana S.A., José Garcia Netto é apontado pela PCSP como “sócio oculto” da Transportes Suzano Ltda, ou Suzantur, que pertencia ao irmão do empresário, Ângelo Roque Garcia, e hoje é administrada por Claudinei Brogliatto.
Fraude ao sistema financeiro
Além das investigações da PCSP, José Garcia Netto é alvo da Polícia Federal pela suspeita de fraude ao sistema financeiro. Nesse caso, a Caruana S.A. foi denunciada pelo Banco Central por manipular, entre 2017 e 2019, a análise cadastral de 31 empresas para que elas obtivessem empréstimos muito acima da sua capacidade de pagamento.
Os técnicos do BC também apontaram uma “maquiagem” nos cálculos feitos pela Caruana para disfarçar prejuízos. As manobras fiscais tinham o objetivo de mascarar um rombo de R$ 143 milhões nas contas da financeira.
“O Banco Central, no exercício de suas funções, apurou a existência de irregularidades praticadas por dirigentes no âmbito da Caruana consistentes na realização de operações de crédito em desacordo com os princípios da seletividade, garantia e liquidez, bem como estruturação contábil em desacordo com a legislação vigente e elaboração de demonstrações financeiras e contábeis que não refletiam com fidedignidade e clareza a sua real condição econômico-financeira”, alega a denúncia do BC.
Presunção de inocência
Em fevereiro, questionado pela coluna, o Palácio do Planalto informou que Netto continuará participando do Conselhão. A governo recorreu ao princípio da constitucional da presunção da inocência para justificar a permanência de Netto no colegiado.
Leia abaixo a íntegra da nota do Palácio do Planalto:
“A constituição brasileira consagra a presunção de inocência para todos que não tenham sido sujeitos a um julgamento transitado em julgado, e a liberdade dos poderes e das instituições implica que qualquer brasileiro esteja sujeito a investigações e apurações, na forma da lei.
Assim, o fato de a empresa e seu respectivo acionista passarem por processo investigatório não contraria, a priori, nenhuma regra ética e de conformidade que impliquem alguma ação por parte do Conselho do Desenvolvimento Econômico Social Sustentável. O Conselhão, que é um órgão consultivo, não gere recursos nem processos licitatórios, reúne personalidades com a presunção de inocência.
Ele é amplo, diverso e formado por pessoas que atuam em suas áreas profissionais e incidem em vários setores da economia do país, e é deste lugar que foram convidados para colaborar com o país, pelo diálogo que o Conselhão proporciona. Eventuais provas ou indícios que indiquem incompatibilidade com a função pública assumida, caso consistentes e estabilizadas, serão analisadas pela Secretaria-Executiva do Conselho.”
Procurado pela coluna, Netto não retornou o contato. O espaço segue aberto à manifestação.