PCC: quem é o desembargador que anulou prova contra policiais presos
Desembargador do TRF-3 invalidou conteúdo de celulares apreendidos que indicavam venda de 400 quilos de cocaína ao PCC por R$ 5 milhões
atualizado
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Integrante do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) desde 2014, o desembargador Maurício Kato anulou as provas usadas para incriminar três policiais civis de São Paulo pela venda de 400 quilos de cocaína para o Primeiro Comando da Capital (PCC). A droga foi apreendida em Cubatão (SP) e “devolvida” ao PCC mediante o pagamento de R$ 5 milhões.
As provas foram anuladas após o magistrado apontar que a apreensão de celulares, pela Polícia Federal, não seguiu os trâmites legais. Mesmo após as mensagens indicarem a negociação com o PCC, os agentes foram reintegrados à Polícia Civil.
Antes disso, o desembargador Maurício Kato já havia atuado em casos de grande repercussão, sobretudo na Lava Jato. Tanto pedidos da defesa de Lula quanto de Paulo Preto, acusado de ser o operador do PSDB em São Paulo, passaram pelas mãos do magistrado.
Em dezembro do ano passado, o magistrado anulou as condenações, que somavam 27 anos de prisão, contra Paulo Preto, ex-diretor da Dersa (Departamento Rodoviário SA). O desembargador entendeu que a 5ª Vara Federal Criminal de São Paulo era incompetente para julgar o caso.
Em 2021, Maurício Kato elaborou o voto que permitiu à defesa de Lula a prática conhecida como “investigação defensiva”. Os advogados do presidente puderam buscar provas em empresas e entidades privadas, atuando da mesma forma investigativa que o Ministério Público Federal. O magistrado justificou que, assim, a defesa teria as mesmas ferramentas para produção de elementos probatórios que o MPF.
Antes disso, em 2018, o desembargador federal contribuiu para manter a prisão de André Puccinelli (MDB), ex-governador do Mato Grosso do Sul acusado de receber propina da JBS para conceder benefícios fiscais à empresa entre 2007 e 2015. Integrante da 5ª Turma do TRF-3, Kato votou contra o relatório do desembargador Paulo Fontes, que defendia a libertação de Puccinelli, seu filho e outras 9 pessoas. O placar da votação foi de 2 a 1 pela manutenção da prisão.
Já no caso do ex-prefeito de Tietê (SP), Manoel David Korn de Carvalho, preso pela Polícia Federal em 2021 em uma investigação que apurou os crimes de lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e corrupção na prefeitura, Kato decidiu pela libertação dos acusados. Na operação, a PF cumpriu 22 mandados de busca e apreensão, confiscando R$ 30 milhões em imóveis e veículos. Na decisão, o desembargador alegou que a prisão preventiva não podia ser usada como “punição antecipada dos indiciados”.
Desembargador suspendeu investigação contra juiz
No ano passado, Maurício Kato suspendeu o inquérito da Polícia Federal que investigava denúncias de sonegação fiscal contra o juiz Aldo Ferreira da Silva Júnior, da 5ª Vara de Família e Sucessões de Campo Grande (MS). O magistrado foi denunciado em três ações penais na Operação Espada da Justiça, pelos crimes de corrupção, peculato, venda de sentença e organização criminosa. Em 2016, o juiz declarou uma renda de R$ 9,7 milhões no ano anterior, mas teve movimentação financeira de R$ 19,3 milhões.
No caso da sonegação, Kato decidiu suspender a investigação após verificar que “o inquérito policial em curso foi iniciado antes de eventual constituição do crédito tributário e, portanto, quando ainda não havia materialidade delitiva, já que primeiro instaurou-se o inquérito policial para, só então, determinar a abertura de processo administrativo fiscal em desfavor do paciente para apuração de eventual delito de sonegação fiscal”. Ele foi punido com a aposentadoria compulsória pelo Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul (TJMS).
Cocaína apreendida e revendida
No caso dos investigadores da Polícia Civil de São Paulo, Artur Oliveira Dalsin, Marcelo Inácio Vasconcelos Silva e Lucas Valente, a decisão de Kato foi tomada no inquérito resultante da Operação Diamante. As investigações se referiam ao traficante Vinicyus Soares dos Santos, conhecido como Evoque, integrante do PCC e suposto dono dos 400 quilos de cocaína desviados por eles.
Em 2022, a PF cumpriu mandado de prisão contra Evoque e mandados de busca e apreensão contra o advogado dele, João Manoel Armôa Junior. No celular do advogado, foram encontradas conversas que apontaram para a negociação entre os traficantes e os policiais para a venda da droga de volta para o PCC, usando Armôa Junior como intermediário.
De acordo com a denúncia do MPF, o conteúdo do celular indicava que “os policiais civis Artur Oliveira Dalsin, Marcelo Inácio Vasconcelos da Silva e Lucas Valente subtraíram, mantiveram em depósito e renegociaram grande parte dela com o traficante proprietário da droga (cerca de 400 kg de cocaína), por meio do advogado João Manoel Armôa Junior e Thainara Santos de Paula, ao preço de R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais), sendo que João Manoel reteve 10% (dez por cento) desse valor a título de ‘honorários’ após tratativas levadas a efeito via mensagens de WhatsApp”.
A investigação sobre o desvio das drogas pelos policiais foi separada do inquérito original da Operação Diamante. Os recursos referentes aos dois processos ficaram sob relatoria de Maurício Kato no TRF-3. O magistrado chegou a negar pedidos de habeas corpus impetrados pela defesa dos policiais, mas em um pedido feito por Armôa Junior, Kato acolheu os argumentos de que a apreensão dos celulares pela PF havia sido ilegal.
O desembargador considerou que os mandados de busca e apreensão se referiam apenas ao material apreendido no escritório do advogado. Os celulares estavam com ele no local da prisão de Evoque, um shopping de Santos (SP). Com a anulação das provas, não havia mais elementos que indicassem a conduta irregular dos três investigadores.
Dalsin, Vasconcelos e Valente foram reintegrados às funções na Polícia Civil de São Paulo na última sexta-feira (1º/11). Eles voltam a atuar no Departamento de Polícia Judiciária do Interior em Santos (Deinter 6), o mesmo no qual atuavam na época das investigações.