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Autor de Quem Matou Sara?: “Último capítulo será inesquecível”

Em entrevista ao Metrópoles, José Ignacio Valenzuela analisou o sucesso da série da Netflix e fez comparações com as novelas brasileiras

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Quem Matou Sara? da Netflix
1 de 1 Quem Matou Sara? da Netflix - Foto: Netflix/Divulgação

“Novelizamos essa série gringa”. Foi assim que José Ignacio Valenzuela tentou explicar o sucesso de Quem Matou Sara?, que estreia sua segunda temporada nesta quarta-feira (19/5) na Netflix. A série, que tem todos os elementos do clássico folhetim latino-americano, virou um fenômeno mundial e foi assistida por 55 milhões de contas. A coluna bateu um papo com o escritor, que analisou o sucesso da série, fez comparações com as novelas brasileiras e ainda contou o que o telespectador pode esperar da segunda temporada da trama.

Quem Matou Sara? traz temáticas atuais e importantes como feminicídio, orientação sexual e uma sociedade extremamente conservadora. Qual a importância de abordá-los dentro da série e como você vê a repercussão desses debates?
Eu sempre escrevo sobre assuntos que não gosto. Não escrevo sobre o que gosto, porque o que me agrada já está resolvido na minha cabeça. Portanto, escrevo sobre a pedra no sapato, sobre o que me incomoda. A mim, particularmente, me incomoda a homofobia. Me incomoda a impunidade de pessoas abastadas que, por terem um sobrenome, sentem que as leis não os afetam, podendo fazer o que quiserem. Essas coisas me incomodam, por isso escrevo sobre elas. Mas também escrevi sobre esses temas porque sabia que a série seria exibida em 190 países. Então, comecei a analisar o que nos conectou, como cidadãos do mundo, nos últimos dois anos. É o descontentamento com as autoridades, com as elites. É também o abuso de poder dos que estão acima contra nós. Nos últimos dois anos, o mundo inteiro foi às ruas. O Brasil, Chile, México… o mundo inteiro. Com isso, pensei comigo: “quem sou eu para decidir o que é a globalidade? Nãotenho ideia”. Então, escrevi sim sobre o que me afeta e me incomoda, mas também escrevi sobre o que me conecta a alguém em Sydney, que me conecta a alguém em Brasília, que me conecta a alguém na Bolívia e que me une a alguém na Polônia. E decidi tratar sobre esses temas globais pensando em como poderiam significar como uma janela maior para Sara. E foi. De fato, se fala mais sobre esses aspectos da personagem Sara do que sobre seus próprios crimes. Houve mais repercussão sobre a figura de César Lazcano, esse empresário que faz o que quer porque sente que a justiça nunca o alcançará, do que sobre quem matou a Sara. Fala-se muito mais de como foi terrível para Chema e Lorenzo a decisão de ter um filho, e de como a homofobia da sociedade e de suas famílias os maltratou, do que sobre o que aconteceu com a Sara.

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Quem Matou Sara? é um retrato da sociedade universal, com temas universais, que todos estamos vivendo. Acredita que essa foi a razão para o sucesso global da série? Você trabalhou de alguma forma no storytelling, seguindo algum tipo de fórmula para chegar ao sucesso, ou tudo isso se dá pelo que acaba de dizer, sobre a tratativa de temas universais da sociedade?
Se eu soubesse que a série viria a ser um fenômeno, provavelmente teria ficado péssimo (risos). Eu ficaria muito nervoso. Acho que o que me fez sentir tão confortável escrevendo sobre Sara foi o fato de não saber o que iria acontecer. Trabalhei muito com meu chefe, Roberto Stopello. Durante um ano trabalhamos nos capítulos. Ida e volta, ida e volta, ida e volta. Corrigíamos até a última vírgula, até a última palavra, porque nos dava paixão, não porque foi uma fórmula. Estou muito ansioso para o lançamento da nova temporada porque não sei o que vai acontecer. Para mim, é muito difícil saber. Não existe fórmula ou bola de cristal. Nada disso existe, só a vontade de contar uma boa história e técnicas que você aplica para que essa história seja contada da melhor maneira possível.

Na sua opinião, qual é a importância de levar temas são sociais, tão importantes – e tão latino-americanos também -, para o mundo, já que a Netflix está em 190 países. A primeira temporada foi assistida por 55 milhões de pessoas, então podemos dizer que foi um sucesso mundial e, portanto, as pessoas puderam refletir sobre tudo que Sara trata. Para você, qual a importância de Sara ser uma série latino-americana para o mundo, nesse sentido?
Na minha visão, é um orgulho para a América Latina o fato de Quem Matou Sara? ter sido esse fenômeno. Em suas primeiras três semanas, 55 milhões de contas assistiram. Não pessoas, contas. Por exemplo, na minha casa, há uma conta da Netflix para quatro pessoas. Então, não sabemos quantas pessoas foram, mas dá pra multiplicar (risos). Para mim, é um orgulho e, ao mesmo tempo, uma responsabilidade muito grande porque espero que Quem Matou Sara? esteja abrindo portas para o mercado latino-americano no mundo. Estou certo de que isso vai acontecer. Por outro lado, para mim também é um triunfo pessoal enorme. Porque, por exemplo, existem países nos quais ser gay é motivo para pena de morte. Há poucos dias vimos um caso famoso: um rapaz de 20 anos foi decapitado no Irã. Seus irmãos e seus primos o decapitaram por ser gay. Isso aconteceu há três dias! Não é um caso de 50 anos atrás. E, no país onde ele foi decapitado, a série ficou em primeiro lugar e, na história, é apresentado o amor entre dois homens. Para mim, isso é muito importante. Em outro país, prenderam recentemente uma mulher por estar dirigindo. Quem Matou Sara? também ficou em primeiro neste país, e a série está cheia de mulheres empoderadas, que são donas de seus corpos, suas vidas e suas decisões. Para mim, é muito importante. E, pelo fato de estar saindo da América Latina, fica duplamente importante.

Falando agora de formatos, sabemos que as novelas fazem parte da tradição e cultura de países da América Latina. Quem Matou Sara? é uma série com perfil bem de novela. Como vê o espaço para esse tipo de conteúdo? Podemos dizer que as novelas no streaming estão ganhando cada vez mais audiência? Para onde acha que vai esse movimento?
Isso não está acontecendo apenas no streaming, está acontecendo no mundo. Passei muitos anos trabalhando nos Estados Unidos. Portanto, estou muito familiarizado e trabalhei muito com a estrutura clássica estadunidense. No caso da série, os ossos e Quem Matou Sara? são “gringos”: os quatro atos e toda estrutura que, para todo o mundo, é bem fácil de decodificar porque passamos 50 anos assistindo. Bewitched, Dallas, Dinastia, Lost… todas as séries gringas que você pensar têm a mesma estrutura dramática. Estudei essa estrutura na universidade e apliquei em Quem Matou Sara?. Nesse ossos gringos da série, coloquei pele latino-americana. O que significa isso? Significa que o ingrediente principal é o thriller e o melodrama. “Novelizamos” essa série gringa. E isso não está acontecendo só com Quem Matou Sara?. Hoje se vê o mesmo efeito acontecendo na televisão americana aberta. Ou seja, em programas como Ugly Betty, Jane the Virgin, Desperate Housewives. As séries de hoje em dia estão começando a inserir esse elemento de melodrama, essa capacidade de contar uma história com um ponto de vista mais exacerbado. Os americanos estão fazendo isso hoje em dia. Me parece fascinante que a Netflix esteja escolhendo esse tipo de histórias, que resgata o melhor dos dois mundos. Nós, latino-americanos, e isso inclui os brasileiros, somos melodramáticos. Nossos países são melodrama puro. Estamos lá em cima em um dia, mas, no seguinte, já estamos lá embaixo. Mas, basta chegar um campeonato de futebol e já somos os maiores do mundo. E, no dia seguinte, já somos os mais desgraçados mais uma vez. Isso está começando a encantar de alguma forma as audiências mais remotas. Ou seja, no fundo, tendo uma estrutura clássica, essas audiências remotas podem se identificar e podem decodificar muito mais facilmente o produto e, depois, o melodrama ao fundo. No fim, ficam todos encantados. É uma  combinação super explosiva.

Entrando mais na história de Quem Matou Sara?, tanto primeira quanto segunda temporada, para você qual foi o personagem mais desafiador, que te deu mais trabalho para construir seu perfil psicológico?
Sara. Evidentemente foi o personagem mais difícil, porque é o único personagem que não está no presente. Todos os outros estão no passado e no presente. Portanto, como a história é contada no presente, a audiência os vê hoje em dia fazendo tudo, atuando, mentindo, beijando, matando. A audiência os vê. Todos os personagens têm uma imagem diferente da de Sara. Para Alex, Sara é de uma maneira; para Chema, Sara é de outra maneira; para Rodolfo, Sara é de outra maneira; para César Lazcano, Sara é de outra maneira. Portanto, Sara é tudo e nada ao mesmo tempo. Não existe mais sobre a Sara além do que está na imaginação e recordações dos personagens. Por isso, é tão difícil escrever sobre essa Sara, que é tantas coisas ao mesmo tempo. Ao mesmo tempo, eu sabia que a Sara que eu estava contando na primeira temporada não era a Sara real. Portanto, precisava ser super específico para decidir quais cenas da personagem iríamos mostrar na temporada um, para mostrar que Sara foi uma boa menina e uma vítima. Na nova temporada, vamos ver outro lado da Sara, completamente distinta, e que eu sabia que existia mas não podia mostrar na primeira temporada. Foi muito difícil escrever esse personagem.

O que a audiência brasileira pode esperar da segunda temporada? E mais uma pergunta que imagino que todos os jornalistas já devem ter feito: quem matou Sara?
Eu matei a Sara. Isso é tudo que posso dizer (risos). Sou o responsável e o autor intelectual de sua morte. Não sou o autor material. Esse é um personagem que ninguém suspeita ainda, eu acho. Claro, não vou revelar. Muito provavelmente, nem o ator ou atriz que interpreta esse personagem sabe que a matou. Digamos que o autor intelectual sou eu, o material, vamos ver nos próximos dias. Sobre o que a audiência pode esperar, é muito difícil para mim explicar o que vem na segunda temporada sem dar spoilers. Portanto, vou tentar fazer uma imagem. Se na primeira temporada foi como subir em uma montanha russa a 100 km/hora, a segunda será como entrar em uma ainda maior, a 300 km/hora. Teremos o dobro de intensidade, mistério, paixão e suspense. Isso não é spoiler, mas vou dizer que acho que nunca poderão esquecer o último capítulo da segunda temporada. É um capítulo muito impactante! É muito inesperado e muda tudo de uma maneira muito atrativa. Tenham um pouquinho de vinho ao seu lado, chocolate ou qualquer outra coisa para tomar, porque assim será o último capítulo.

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