Precisamos de educação midiática para além do ambiente escolar
Professores e gestores não podem ser os únicos responsáveis pela educação de assuntos como desinformação e os desafios da era digital
atualizado
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Precisamos pensar a educação midiática para além do ambiente escolar. Embora as escolas sejam um ponto de partida essencial, as habilidades para avaliar, interpretar e questionar informações são cada vez mais necessárias para toda a sociedade, em todas as fases da vida.
É com esse propósito que iniciativas como a Semana Brasileira de Educação Midiática e a MIL Week, organizada pela Unesco, ganham relevância. No Brasil, essa segunda edição é da Semana promovida pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República traz uma programação com debates, conferências e convites para que atividades de educação midiática sejam realizadas em todo o país, ampliando o alcance e a importância do tema.
No entanto, mesmo com esses esforços, o desafio permanece: como alcançar quem já deixou as salas de aula, mas que também precisa dessas ferramentas críticas para navegar pelo volume de informações nas redes sociais, na mídia e em seu cotidiano?
De acordo com dados do último Global Digital Report, o Brasil é o segundo país em que os usuários passam mais tempo online, atrás somente da África do Sul. As cerca de nove horas que o brasileiro dedica ao ambiente online são atravessadas por uma série de riscos aos quais os usuários ficam expostos em redes sociais enquanto navegam por links suspeitos e conteúdos enganosos.
A alta exposição a uma oferta variada de conteúdos, aliado a um baixo letramento midiático, propiciam um ambiente fértil para golpes virtuais, desinformação e discursos de ódio. Neste contexto, alguns grupos ficam ainda mais vulneráveis, como idosos, pessoas de baixa renda, crianças e adolescentes, além de população negra e LGBTQIAP+.
No Brasil, 9,8 milhões de jovens de 15 a 29 anos não concluíram a educação básica e não frequentam escolas, segundo dados da pesquisa “Juventudes Fora da Escola”, desenvolvida pelo Itaú Educação e Trabalho e pela Fundação Roberto Marinho, com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2022.
A maior parte desses jovens (78%) são de famílias com renda per capita de até um salário mínimo e sete em cada dez são negros. A maioria (43%) não finalizou o Ensino Fundamental; 22% completaram o Ensino Fundamental mas não iniciaram o Médio; e 35% têm o Ensino Médio incompleto.
Fora do ciclo escolar
Precisamos olhar também para os idosos, público que está fora do ciclo escolar e precisa de políticas e iniciativas próprias. As Projeções de População do IBGE mostram que, de 2000 para 2023, a proporção de idosos (pessoas com 60 anos ou mais) na população brasileira quase duplicou, subindo de 8,7% para 15,6%.
Em números totais, a população idosa passou de 15,2 milhões para 33,0 milhões, no período. Em 2070, a perspectiva é de que cerca de 37,8% dos habitantes do país serão idosos, o que corresponderá a 75,3 milhões de pessoas com 60 anos ou mais de idade.
No início de outubro, o Instituto de Referência em Internet e Sociedade (Iris) lançou o “Mapeamento de Iniciativas de Educação Midiática”, que encontrou 83 iniciativas de educação midiática em todo o país. Entre os achados, as pesquisadoras mapearam 26 iniciativas promovidas pela comunidade escolar e somente três projetos voltados para o público 60+.
Não dá para deixar só na conta dos professores e gestores educacionais a solução para todos os problemas da sociedade contemporânea. Os desafios que envolvem o novo ecossistema informacional são complexos e, para além do incentivo à permanência da educação midiática como parte fundamental do currículo escolar, precisamos de iniciativas que consigam incluir outros atores da sociedade.
A Unesco está de olho neste aspecto e na MIL Week deste ano criou uma programação que prevê conversas sobre como a nova geração de criadores de conteúdo ocupa uma posição-chave na produção e na disseminação de informações de interesse público.
É preciso olhar para os influenciadores, convocar jornalistas, ocupar as empresas, repartições públicas, e levar a educação midiática para todos os espaços sociais. Quem sabe assim não teremos uma sociedade mais justa e igualitária, que garanta uma cidadania digital a todos os públicos, independentemente de onde esteja ou de quem seja.