Vamos acreditar no que eles dizem sobre corrupção e democracia
Acreditemos em tudo o que Lula e PT dizem sobre corrupção e liberdades, mas sem esquecer a frase do Marquês de Maricá sobre povo corrompido
atualizado
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Estava folheando um livro que lancei sete anos atrás, intitulado Cartas de um Antagonista, que reúne artigos escritos para uma newsletter do site fundado por mim. Era outro país, não melhor do que o de hoje, mas que nutria algumas ilusões sobre o combate à corrupção — o que faz o país de hoje parecer muito pior do que o de então.
Num dos artigos publicados no livro, transcrevi uma fala do escritor peruano Mario Vargas Llosa, prêmio Nobel de Literatura, na Assembleia da Associação Interamericana de Imprensa, em 2015:
“A corrupção é um problema grave, a maior ameaça para a democracia, especialmente com as novas e recentes democracias latino-americanas. O Brasil parecia ter decolado, mas o que o freou de repente e está provocando o retrocesso? A corrupção, que está de volta mais forte do que nunca, acima do pico de todos os níveis já alcançados, vinda de um governo que todos no mundo acreditavam exemplar: Lula implantou um governo profundamente corrupto.
Dá até vertigem os montantes bilionários roubados pelos grandes ladrões do governo Lula. A história da Petrobras é incrível. É uma indicação do que pode acontecer se não se combater a corrupção, que se manifesta na América Latina de maneira muito perturbadora. Já não são os guerrilheiros, utopias socialistas, os golpes. São todos ladrões, como os narcotraficantes. Seria terrível se a democracia continuasse a ser esmagada e sufocada pela corrupção.”
Quase uma década depois, vamos todos acreditar que Lula é inocente e foi vítima desse tipo de narrativa de Mario Vargas Llosa — assim como o venezuelano Nicolás Maduro é vítima da narrativa da ONU, dos Estados Unidos, da União Europeia, dos opositores do chavismo e dos 7 milhões de cidadãos que fugiram da Venezuela, segundo a qual ele é um ditador. Vamos todos acreditar que os procuradores e o juízes da Lava Jato é que são criminosos.
Vamos todos acreditar que Emilio Odebrecht, coitado, foi vítima da Lava Jato. Vamos todos acreditar que o objetivo da Lava Jato era inabilitar a candidatura de Lula e eleger Jair Bolsonaro. Vamos todos acreditar que foi Lula quem salvou a democracia brasileira daquele energúmeno chamado Jair Bolsonaro. Vamos todos acreditar que Lula e o PT são defensores da liberdade de imprensa independente, não da liberdade da imprensa sabuja. Vamos todos acreditar que não há perseguição política no Brasil contra quem colocou Lula e outros machuchos na cadeia pelos crimes de lavagem de dinheiro e de corrupção.
Vamos todos acreditar que corrupção, afinal de contas, não é problema grave, mas sem esquecer, por favor, a máxima do Marquês de Maricá: “Um povo corrompido não pode tolerar governo que não seja corrupto”.