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Sobre cigarros, o escritor Paul Auster (e o STF)

O cigarro matou Paul Auster, mas lhe deu algo em troca; o cigarro fere a reputação do STF e nos dá como retorno mais despesas no SUS

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Foto mostra jovem branca com um cigarro na boca a fumar olhando para a câmera -- Metrópoles
1 de 1 Foto mostra jovem branca com um cigarro na boca a fumar olhando para a câmera -- Metrópoles - Foto: Westend61/Getty Images

O escritor americano Paul Auster morreu ontem, aos 77 anos, de câncer de pulmão. Li o seu A Invenção da Solidão na ocasião do meu (primeiro) divórcio. No livro, Auster está às voltas com a perda do pai; eu estava às voltas com a perda de uma família. Paul Auster me ajudou a reinventar a minha solidão.

Não me abandone: este não é um artigo sobre literatura ou reminiscências pessoais. É sobre cigarro. Perdemos Paul Auster para o cigarro. Ele havia deixado o tabaco para fumar cigarros eletrônicos. Antes de lhe causar um câncer, o tabaco lhe proporcionou o roteiro de um filme: Smoke, de 1995, dirigido por Wayne Wang e pelo próprio escritor.

O filme estrelado por Harvey Keitel e William Hurt gira em torno do dono de uma tabacaria no Brooklyn, o bairro de Nova York onde morava Paul Auster e a partir do qual ele construiu o seu universo literário.

Paul Auster era admirado nos Estados Unidos, mas a França, país de fumantes inveterados, é que o reconheceu como um grande escritor. Ele morou em Paris. Ninguém sai incólume depois de morar em Paris. Se você é bom em alguma coisa, sai melhor; se você é ruim em alguma coisa, sai pior. Paul Auster deve ter fumado ainda mais em Paris, tanto para o bem da sua literatura, como para o mal da sua saúde.

Ao pensar neste artigo, lembrei que Linus Pauling, o químico célebre, havia dito algo sobre cigarros. Fui pesquisar e achei a frase:

“Fico perturbado quando vejo um cigarro entre os lábios ou os dedos de alguma pessoa importante de cuja inteligência e julgamento depende em parte o bem-estar do mundo.”

É o julgamento severo de um químico que sabia da nocividade do tabaco. Da minha parte, fico perturbado quando vejo como a indústria do tabaco continua forte e dando as cartas em vários pedaços.

O cigarro me leva a pular de Paul Auster para o STF. O jornalista Weslley Gazo informa que aquele evento chique organizado em Londres por um certo Grupo Voto, que diz ter como missão promover “diplomacia empresarial e relações institucionais” (ou seja, lobby), teve patrocínio da  British American Tobacco, a ex-Souza Cruz.

O evento contou com a participação de três ministros do STF, tribunal onde a British American Tobacco está pendurada em dois processos, pelo menos. Em um terceiro, a empresa é parte interessada. O relator desse terceiro processo é um dos ministros que foi a Londres a convite desse tal Grupo Voto. E, coincidentemente, o governo agora quer instituir o “imposto do  pecado” sobre produtos como o cigarro. A coisa pode ser judicializada.

O cigarro matou Paul Auster, mas lhe deu algo em troca; o  cigarro fere a reputação do STF e não nos dá nada como retorno, a não ser mais despesas no SUS com doentes de câncer de pulmão.

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