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RS: enterrem os mortos, cuidem dos vivos e atenção aos muito vivos

Espero que os próprios gaúchos controlem o dinheiro a ser gasto no reerguimento do RS. Se terceirizaram a tarefa, a garantia é de desvios

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Ricardo Stuckert/PR
Lula, em visita ao Rio Grande do Sul, ao lado do governador Eduardo Leite - Metrópoles
1 de 1 Lula, em visita ao Rio Grande do Sul, ao lado do governador Eduardo Leite - Metrópoles - Foto: Ricardo Stuckert/PR

Não foi uma inundação qualquer: dois terços do Rio Grande do Sul  submergiram ao verdadeiro tsunami que varreu o estado. A contabilidade macabra registra, até o momento, 83 mortes,111 desaparecidos, 20 mil desabrigados e 122 mil desalojados. Quase 1 milhão de pessoas foram afetadas, em maior ou menor grau. O RS virou SOS.

Dos 497 municípios gaúchos, 345 foram atingidos pela tempestade de dimensões bíblicas e consequente cheia dos rios. As cenas do centro histórico de Porto Alegre sendo invadido pelas águas do Guaíba são de filme de catástrofe.

O Rio Grande do Sul é o estado mais afetado pelas mudanças climáticas. Em menos de um ano, os gaúchos tiveram de enfrentar três chuvas apocalípticas e inundações devastadoras. Mas esta agora é, de longe, a pior. E não há garantia de que o ainda pior esteja para acontecer.

Trata-se agora de enterrar os mortos e de cuidar dos vivos, para usar a frase atribuída ao Marquês de Pombal em relação à destruição causada pelo terremoto que arrasou Lisboa, em 1755. Eu acrescentaria que é o caso também de prestar atenção aos muito vivos.

O governo do Rio Grande do Sul e os cidadãos precisam de ajuda urgente para reerguer o estado, reconstruir as suas vidas e executar obras que diminuam o impacto dos eventos climáticos extremos. 

A reconstrução, por si só, vai custar, em um primeiro cálculo, 20 bilhões de reais. Como disse o governador Eduardo Leite, será necessário criar uma espécie de Plano Marshall, guardadas as devidas diferenças em relação ao auxílio americano à Europa depois da Segunda Guerra.

O governo federal prometeu retirar os entraves burocráticos para a liberação de dinheiro, renegociar a dívida do estado — e já se fala em “orçamento de guerra” para socorrer os gaúchos, assim como feito durante a pandemia. Os guerreiros da esbórnia fiscal já estão indóceis para ir à luta, mas deixemos isso de lado em momento tão difícil.

Antevejo o problema de o dinheiro não chegar a quem precisa. Quem vai controlar que os recursos federais sejam aplicados corretamente? O TCU. Sei. E recursos estaduais, e recursos municipais? Sei e sei. 

Com o dinheiro gasto para combater a seca no Nordeste, ao longo de décadas, o Saara teria deixado de ser um deserto, mas na planície avermelhada os juazeiros continuam a alargar manchas verdades, enquanto os infelizes caminham o dia inteiro, cansados e famintos, como na célebre frase inicial de Graciliano Ramos, em Vidas Secas.

Diante de tantos precedentes, o Nordeste é só mais um, espero que os próprios gaúchos, lá na ponta, controlem o dinheiro a ser gasto no reerguimento do estado. Estou falando do que se costuma chamar de sociedade civil, a mesma que se mobilizou na emergência para salvar vidas. Se terceirizarem a tarefa para órgãos governamentais, a garantia é de desvios.

Corte para outro ângulo.

Depois de se dar conta de que a tragédia no Rio Grande do Sul era bem mais do que o mais do mesmo, Lula voltou ao estado. Na sua grandeza moral, ele disse o seguinte: 

“Os gaúchos têm um viés de gostar de campo, de gostar do trabalho. Às vezes muito maior do que outras pessoas. Eu acho que é por causa da origem do DNA. E graças a Deus é assim.”

Se fosse Jair Bolsonaro a emitir esse achismo, seria tachado de racista, mas, como é Lula, a militância petista e os camaradas da imprensa independente fingem que não ouviram. A planície é avermelhada.

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