Não poderia faltar Bolsonaro na festa do PT: Lula voltou graças a ele
Lula e o ex-presidente mantinham uma relação de parasitismo, como carrapatos, prejudicando-se um ao outro. Agora, virou mutualismo
atualizado
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Na festa de 44 anos do PT, a atração mais interessante foi Jair Bolsonaro e Carluxo. As imagens dos dois, como “a cara do golpe”, compuseram o conjunto de fotos projetadas em telão, ao lado de registros de momentos importantes da história do PT. Trechos de lives do ex-presidente foram mostradas, além de cenas do vandalismo na Praça dos Três Poderes, em 8 de janeiro.
É sintomático: o PT só existe como contraponto a Jair Bolsonaro. Deixou de ser o partido que veio para mudar tudo para ser o partido garantidor de que tudo vai permanecer como sempre foi.
As alopragens de Jair Bolsonaro resultaram na ressurreição de Lula, e o chefão petista, assim como o seu partido, só permanecerá vivo politicamente enquanto o ex-presidente for brandido como ameaça à democracia. Da mesma forma, Jair Bolsonaro depende do antilulismo para existir.
A princípio, Lula e o ex-presidente mantinham uma relação de parasitismo, como carrapatos, prejudicando-se um ao outro. Agora, a relação ecológica evoluiu para o mutualismo: eles têm uma associação de dependência recíproca essencial para a sobrevivência de ambos.
Ainda há a questão pessoal: Lula não suporta a ideia de que haja um líder popular que possa rivalizar com ele. Até Jair Bolsonaro se tornar um fenômeno político, ninguém ombreava com o chefão petista em matéria de apelo popular. Hoje, já não é assim, e Lula ainda enfrenta um declínio na sua popularidade que se deve apenas a ele próprio e que parece ir além das dificuldades circunstanciais expressas nas pesquisas.
O que temos também é um duelo permanente que adentra o terreno do narcisismo puro e simples. Lembra a novela de Joseph Conrad intitulada The Point of Honor, na qual o diretor Rydley Scott se baseou para fazer o filme Os Duelistas. Dois hussardos no exército de Napoleão, Feraud e D’Hubert, batem-se continuamente por quinze anos, a partir de um incidente menor que desperta a obsessão de Feraud em derrotar D’Hubert e, desse modo, recuperar a honra que julga perdida.
Nem Lula nem Jair Bolsonaro têm a complexidade psicológica dos personagens de Joseph Conrad, mas a matéria bruta é a mesma.