Lula precisa falar grosso com a Venezuela
Mas Lula parece não sair da mesa de bar. As más escolhas pesam. Além de apoiador de Maduro, ele colocou o Brasil ao lado de China e Rússia
atualizado
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Em referendo feito sob medida para exacerbar o último refúgio dos canalhas, o nacionalismo patriota, Nicolás Maduro, o amigão de Lula, obteve o aval da maioria esmagadora dos venezuelanos para anexar a região de Essequibo, que representa simplesmente 70% do território da vizinha Guiana.
Essequibo é motivo de disputa entre os dois países há mais de século, desde que a a Guina era colônia inglesa. Hugo Chávez havia deixado essa história de lado, mas Nicolás Maduro a reavivou depois da descoberta, em 2015, de uma imensa reserva de petróleo e gás na região — que já se sabia rica em ouro e outros minérios.
Graças à exploração do petróleo de Essequibo, principalmente na sua costa, a economia da Guina vem crescendo a taxas impressionantes, enquanto a economia da Venezuela permanece aquele deserto bolivariano, não por falta de petróleo. Os venezuelanos têm as maiores reservas do mundo: 303 bilhões de barris, o que equivale a 27 vezes do que foi encontrado até agora em Essequibo, 11 bilhões de barris.
Nicolás Maduro acertou com a oposição, sob bênção de Brasil e Estados Unidos, que haverá eleição presidencial limpa no ano que vem. Em troca, os americanos levantariam as sanções comerciais à Venezuela. Eleição limpa na Venezuela é como acreditar em Papai Noel, mas digamos que Papai Noel pudesse existir, apesar de o regime já ter impugnado a candidatura adversária mais forte. Uma guerra jogaria a eleição para as calendas e manteria o ditador no poder, em nome da segurança nacional. Um autogolpe com a ajuda da oposição, que estupidamente apoia a anexação de Essequibo (mas era contra o referendo, ah, bom…).
A criação de inimigos externos é tática manjada de ditadores, com ou sem Papai Noel, para perpetuar-se e tentar desviar a atenção dos cidadãos de desastres econômicos internos — na Venezuela, particularmente, os desastres são ferroviários. Foi o que ocorreu no caso argentino da Guerra das Malvinas, exemplo também de que a tática não costuma dar certo.
A Guiana vai recorrer aos Estados Unidos, e os Estados Unidos mostrarão o seu porrete a Nicolás Maduro. Como ex-colônia do Reino Unido, a Guiana faz parte da Commonwealth. Não é uma aliança militar, mas propicia que os britânicos não deixem barato a invasão do país. Do lado da Venezuela, há dois amigos peso-pesados: Rússia, fornecedora de armas e “conselheiros militares” para o regime de Nicolás Maduro, e China, importadora de petróleo venezuelano, ávida pelos minérios de Essequibo e grande credora de Caracas. Ambas potências interessadas também em criar focos de tensão no Hemisfério Ocidental para testar a capacidade americana de agir militarmente em vários frontes.
Uma guerra, e internacionalizada, causaria muita desestabilização na fronteira norte do Brasil e mostraria que somos um gigante com pés de barro. Em relação às Forças Armadas venezuelanas, as brasileiras são inferiores em quantidade e qualidade de equipamento para evitar eventuais transbordamentos do conflito.
Antes que o eventual primeiro tiro seja dado, no entanto, o Brasil tem como fazer valer o seu peso específico (tamanho da economia, capacidade industrial e ser a única passagem terrestre para a Venezuela invadir a Guiana). O governo Lula deveria aumentar imediatamente o tom contra as pretensões de Nicolás Maduro. Mas, até agora, o presidente da República está dando uma no cravo e outra na ferradura, com o perdão do lugar-comum apropriado a quadrúpedes, sem condenar o potencial agressor e defender o potencial agredido. Pede “conversa”, assim como faz em relação à Guerra da Ucrânia e à guerra de Israel contra o Hamas.
Lula parece não sair da mesa do bar — por cálculo, incompetência ou as duas coisas juntas. ”O que a América do Sul não está precisando é de confusão. Não se pode ficar pensando em briga. Espero que o bom senso prevaleça, do lado da Venezuela e do lado da Guiana”, disse Lula. “A humanidade deveria ter medo de guerra. Só faz guerra quando falta bom senso. Vale mais a pena uma conversa do que uma guerra”.
As más escolhas do petista pesam no contexto. Além de apoiador histórico da ditadura bolivariana, o presidente da República e o seu entourage diplomático antiamericano vêm se posicionando fortemente ao lado de China e Rússia.
Sob Lula, orbitamos, se é que já não fazemos parte dele, o Eixo do Mal, o que faz pressupor que o Brasil poderá estar do lado errado, o da neutralidade, se a Venezuela resolver invadir a Guiana — e como João Bobo. A guerra é improvável, dizem diplomatas, mas a distância entre o improvável e o possível encurtou tremendamente nos útimos anos.