Kamala é quem tem menos a perder em eventual derrota para Trump
Não faltam nomes no Partido Democrata para concorrer contra Trump, mas Kamala, por já ser vice, é quem tem menos a perder se for derrotada
atualizado
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Joe Biden encarregou Kamala Harris de cuidar da imigração ilegal, um dos assuntos capitais da próxima eleição presidencial. Foi um desastre. Como vice-presidente, ela poderia ser apenas um figura apagada durante a maior parte do tempo, mas a sua risada histriônica e os seus comentários impróprios ou beirando a cretinice a fizeram personagem de memes.
Se vier mesmo a ser a substituta de Joe Biden como candidata do Partido Democrata, Kamala Harris não poderá criticar a administração da qual fez parte — que deixou um legado de inflação alta, além do descontrole imigratório— e terá muito pouco a defender, como o avanço na política climática.
Não é verdade que o partido esteja unido em torno do seu nome para a Casa Branca. Joe Biden renunciou a se candidatar e logo endossou Kamala Harris, mas não é que tivesse muita opção: afinal de contas, ela é a sua vice.
Barack Obama, cacique-mor, poderá vir a dar o seu endosso, mas até o momento prefere que haja disputa aberta pela candidatura na convenção democrata, em 19 de agosto, em Chicago. A chefona democrata Nancy Pelosi tem a mesma posição..
Nomes não faltam, mas é preciso ver quem estaria disposto, lá na frente, a enfrentar o ainda favorito Donald Trump. Kamala Harris, por já estar no lucro desde que Joe Biden a resgatou para a vice-presidência depois de uma tentativa frustrada de ser candidata a presidente, é quem tem menos a perder com uma eventual derrota na eleição presidencial.
Kamala Harris seria a primeira mulher a ser eleita presidente dos Estados Unidos. Mulher e negra. Esses dois fatores também tornam difícil, para a cúpula democrata, tirá-la do páreo, sob pena de causar divisões dentro do partido e o risco de parte dos eleitores virem nisso traços de racismo e misoginia.
Ser mulher e negra é, teoricamente, um bom ativo para conquistar o eleitorado feminino e negro. Outro ponto importante: Kamala Harris tem só 59 anos, contra os 78 anos de Donald Trump. Com o decrépito Joe Biden fora da disputa, a desvantagem da idade agora é do republicano.
Quando era procuradora, antes de ser senadora, a sua atuação teve contradições. Como procuradora de São Francisco, ela foi contra a pena de morte; como procuradora-geral da Califórnia, foi a favor. De qualquer forma, durante a campanha, será explorado o aspecto de que Kamala Harris construiu uma carreira como representante da lei, enquanto Donald Trump fez a sua como criminoso (a maioria dos eleitores acha mesmo que ele cometeu crimes).
Desde ontem, quando o atual presidente jogou a toalha e Kamala Harris disse estar pronta para concorrer no lugar dele, as doações para a campanha democrata, que estavam praticamente paralisadas havia um mês, dispararam. Money talks e, a depender do volume de doações, a vice-presidente poderá vencer rapidamente as resistências ao seu nome.
A cem dias da eleição presidencial, a disputa mudou e se tornou menos nublada para o Partido Democrata. Teria sido melhor para Donald Trump que Joe Biden fosse o candidato, mas ninguém deve subestimar o republicano. Inclusive porque os tiros no atentado contra ele ainda vão ressoar por muito tempo.
A última observação a ser feita é que o Partido Democrata e a imprensa amiga esconderam vergonhosamente a decrepitude de Joe Biden. Agora, com a sua desistência, fingem que o inquilino da Casa Branca deixou de ser um problema.
As razões circunstanciais de Joe Biden ter abandonado a disputa são conhecidas por todos, mas faltou dar nome ao motivo: Parkinson, Alzheimer, outro tipo de demência, senilidade? Qual é o diagnóstico não revelado pelo atual presidente e por seu partido?
A omissão ocorre porque, por razões partidário-eleitorais, Joe Biden precisa ser mantido na Casa Branca. Entre essas razões, está a de que, se a candidata for mesmo Kamala Harris, ela ficará mais livre para fazer campanha. É uma irresponsabilidade, para além de ser uma falta de compromisso com a transparência da democracia que a oposição a Donald Trump diz tanto defender.