Jair Bolsonaro já está condenado como personagem de romance policial
A verdade já não importa no caso de Jair Bolsonaro, mesmo que venham a surgir provas contra ele que ultrapassem as circunstâncias
atualizado
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É evidente que Jair Bolsonaro já está condenado pela maioria dos ministros do STF. O que se faz, agora, é buscar justificativas formais para a sua condenação e inevitável prisão.
As provas contra ele nem precisam ser robustas para colocá-lo na cadeia, basta que a construção da chamada narrativa tenha um mínimo de verossimilhança e que conte com o bate-estaca da imprensa para fundá-la na cabeça dos cidadãos. Essas condições estão dadas.
Verossimilhança não significa verdade, necessariamente. Há relatos ficcionais com muita verossimilhança. A depender do tipo de ficção, aliás, a verossimilhança é exigida, como é o caso dos romances e filmes policiais. O necessário é que tudo seja crível, sob pena de leitor ou espectador não saírem convencidos de que o que leram e assistiram poderia ter ocorrido dentro de parâmetros mínimos de realidade.
Realidade e verdade nem sempre são coincidentes, e chega um momento no qual o investigador policial, na ausência de provas robustas da verdade, age como o autor de literatura policial, recorrendo a circunstâncias para provar apenas que a sua narrativa tem a possibilidade de ser espelho do real. Trata-se de substituir o que falta pelo que se tem de sobra.
O escritor americano Edgar Allan Poe foi o criador do gênero policial, no século XIX. A crítica literária concluiu que a sua sacada foi fazer com que as deduções e inferências do investigador tivessem interesse dramático e constituíssem a própria essência do enredo.
Com frequência, as investigações policiais são contaminadas por essa técnica da literatura policial, e caberia ao juiz julgar se a realidade emprestada dramaticamente ao enredo expressa a verdade crua dos fatos. Mas é impossível que isso ocorra quando o juiz é parte interessada no processo.
Não se está dizendo aqui que Jair Bolsonaro seja inocente das acusações que lhe são imputadas, nem que não possam surgir provas cabais da suas culpas, para além de todas as circunstâncias que apontam essa direção — friso que, pessoalmente, compartilho da opinião de que ele é um delinquente. Estou dizendo apenas que a verdade já não importa no seu caso. Ele está condenado de antemão porque se tornou personagem de romance policial.