Há dois países no Brasil: o que xinga e o que orgulha no palco
O Brasil que dá orgulho no palco é o da bailarina Luciana Sagioro, de 18 anos, a primeira brasileira a integrar o Balé da Ópera de Paris
atualizado
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No Brasil, convivem dois países diametralmente opostos. O primeiro país é aquele onde a mulher do presidente da República, a primeira-dama Janja, xinga no palco um empresário estrangeiro e futuro integrante do governo americano que lhe é desafeto.
O segundo país é o que produz uma bailarina como Luciana Sagioro, de 18 anos, a primeira brasileira a integrar o Balé da Ópera de Paris, uma das maiores e mais tradicionais companhias do mundo, joia da cultura francesa fundada há 355 anos, pelo rei Luís XIV. É país que não xinga no palco, mas dá orgulho no palco.
Luciana Sagioro pode ser vista no espetáculo Mayerling, em cartaz no Palais Garnier, a sede do balé parisiense. É uma coreografia em três atos, criada pelo britânico Kenneth MacMillan, a partir da história da morte do príncipe austríaco Rudolph, herdeiro dos Habsburgo, que se suicidou com a amante Marie Vetsera no pavilhão de caça cujo nome dá título à coreografia.
A bailarina brasileira deu entrevista à jornalista Paula Bonelli. No corpo da entrevista, há um vídeo de Luciana fazendo um solo em 2021, ainda como competidora do Prix de Lausanne, tido como a Olimpíada do balé clássico. Uma maravilha. Ela já era uma das 12 melhores bailarinas do mundo, conquistou o terceiro lugar na competição e foi aclamada a preferida do público.
A moça é de Juiz de Fora, em Minas Gerais, e começou a dançar aos três anos. A sua família é de classe média, mas há muita superação na história de Luciana. Em busca de aperfeiçoamento, aos 9 anos, ela se mudou, sem pai nem mãe, para o Rio de Janeiro, e a partir daí, graças ao seu talento, foi abrindo portas internacionais.
Com o sucesso em Lausanne, Luciana recebeu convites das principais companhias do mundo e escolheu o Balé da Ópera de Paris, porque lá não seria mais uma brasileira, mas faria história como a primeira brasileira a fazer parte dele. O seu contrato é vitalício, o que significa que ela terá lugar no balé francês até completar 42 anos, quando será aposentada compulsoriamente, em regime especial.
Por ocasião da reforma da previdência na França, colocou-se em discussão os regimes especiais de aposentadoria. Eram 42 no total, entre os quais a dos bailarinos da Ópera de Paris. Pelo que me lembro, o salário inicial era de 1.800 euros líquidos, não muito mais do que o mínimo francês.
Para ganhar mais, Luciana deverá se esforçar para ser promovida. Se tudo der certo, dentro de alguns anos, ela será uma das estrelas da companhia e passará a receber em torno de 3.000 euros mensais. Não é muito dinheiro na França. Há ainda os valores pagos, a título de bônus, pela participação em determinadas coreografias. Nada que faça ninguém rico.
No país da primeira-dama Janja, por sua vez, ela pode tirar da cachola um festival de música para abrir uma cúpula de chefes de Estado, chamar a coisa de Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, levar R$ 33,5 milhões em patrocínio de duas empresas estatais, Itaipu e Petrobras, e ainda aproveitar o palco para mandar Elon Musk se foder. Mas quem se fode mesmo é o país de Janja.