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Está cada vez mais difícil explicar o Brasil a gringo

Um gringo me fez perguntas sobre aspectos delicados da vida nacional, eu respondi, mas ele não entendeu nada. É que não dá para explicar

atualizado

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Felipe Menezes/Metrópoles
foto colorida da esplanada dos ministérios em Brasília -- Metrópoles
1 de 1 foto colorida da esplanada dos ministérios em Brasília -- Metrópoles - Foto: Felipe Menezes/Metrópoles

Esse negócio de ter de explicar o Brasil a gringo está cada vez mais complicado. Outro dia, um deles me disse que ouviu dizer que, por aqui, havia gente presa há mais de ano sem condenação. Perguntou se era fake news.

Respondi que era verdade. O gringo fez cara de espanto, e mais espantado ficou quando eu disse que era por atentar contra o Estado de Direito. Eu e minha boca grande.

Quis mudar de assunto, mas o gringo resolveu aprofundar mais um metro a conversa. Ele também havia escutado que um brasileiro havia sido preso acusado de estar nos Estados Unidos no começo de 2023. Ele me perguntou se era crime estar nos Estados Unidos no começo de 2023.

Expliquei que não era crime ir aos Estados Unidos em qualquer época, mas que ele havia sido acusado de estar nos Estados Unidos junto com o ex-presidente da República, no começo de 2023, para tramar um golpe, segundo a Justiça, que resultou na invasão da Esplanada dos Ministérios, naquele 8 de janeiro, lembra?

O gringo fez cara de que não entendeu, e tudo bem, só que cometi a besteira de acrescentar que o sujeito preso havia provado, no entanto, que não estava nos Estados Unidos no começo de 2023. Aí o gringo fez uma enorme cara de como assim?

Pois é, continuei, eu até acho o sujeito um crápula, ficava espalhando um monte de mentiras lá do Palácio do Planalto, era simpatizante do fascismo e coisa e tal — mas era fato que ele não estava nos Estados Unidos junto com o ex-presidente no começo de 2023, conforme dizia a Justiça.

O grito me perguntou, então, como era possível um troço desses, se bastava acusar sem provas e pronto. Achei melhor responder que não sabia. Ele então indagou se o ônus da prova não era do acusador, porque lá no país dele era dessa forma. Respondi que sim, mas que… O gringo, muito intrigado, me interrompeu para perguntar — na sua cabeça, retoricamente — se não deveriam soltar o sujeito, já que ele havia provado que não estava nos Estados Unidos no começo de 2023.

Embatuquei, enquanto rezava  para o gringo não me perguntar sobre as penas de 17 anos de prisão que andavam sendo dadas a quem apenas pichou estátua na Esplanada dos Ministérios, por exemplo.

Para mudar de assunto, apelei ao meu amigo Montaigne, que está sempre à minha disposição. “Entendo o seu assombro, gringo, mas temos todos a predisposição de condenar tudo o que nos é estranho ou que não entendemos”, eu disse. E emendei:  “E as eleições na França, hein, que coisa, não?”. Terminamos a noite falando do Macron, ainda bem.

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