Ano Novo: ausência de dor é a melhor definição de felicidade

Há um lado bom na idade: se você tiver neurônios que ainda conversam entre si, você se torna menos sentimental. Ano Novo, por exemplo, não causa mais expectativa nenhuma para além da única que realmente importa.

A única expectativa que deveria existir para todo mundo, de qualquer idade, deveria ser a de sobreviver razoavelmente bem a cada um dos próximos 365 dias.

Sobreviver razoavelmente bem significa ausência de dor na maior parte do tempo. Dor física, dor psicológica, dor emocional. Ausência de dor é a melhor definição de felicidade. Ausência de dor é o que o sempre se buscou de essencial desde o alvorecer da humanidade.

Já padeci de grandes dores físicas, e sabe-se lá quantas ainda virão. Nada se iguala ao momento em que elas cessam.

O meu amigo Michel de Montaigne, francês que volta e meia dá as caras por aqui, sofria de cálculos renais. Ele estava em Roma, em dezembro de 1580, quando expeliu uma dessas pedras, do tamanho de uma pequena batata, depois de sofrer durante bom tempo.

“Haverá algo de tão doce como quando, repentinamente, após uma dor extrema, recupero, graças à expulsão da minha ‘pedra’, como que por um raio, a bela luz da minha saúde, tão livre e tão completa?”, escreveu Montaigne.

Filosofar é aprender a morrer, suportando estoicamente a sucessão de dores que nos acometem, e o meu amigo francês escreveu um belo e inspirador ensaio com esse título. Mas como esquecer a frase que Shakespeare colocou na boca de Leonato, em Muito Barulho por Nada? “Pois não houve ainda filósofo que suportasse a dor de dente com paciência”, diz o personagem, governador da Sicília, cenário da peça.

Neste 2025 que adentramos, portanto, desejo que você não sinta dor alguma ou que, se vier a sentir, ela passe logo e, principalmente, não seja a dor final. É um desejo de real e intensa felicidade.