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A Rede é a linha auxiliar de Lula na oposição jurídica a Lira

O partido continua a usar o STF para fazer política e esvaziar o Legislativo. E ainda escolheu o juiz no caso do Bolsa Família fora do teto

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Lula e Randolfe Rodrigues conversam no evento
1 de 1 Lula e Randolfe Rodrigues conversam no evento - Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

O jogo está bruto. Na manhã desse domingo, Lula e Arthur Lira reuniram-se num hotel de Brasília, para tentar, mais uma vez, chegar a um acordo sobre a aprovação da PEC do Estouro. Saíram sem falar com a imprensa. Ato continuo, na noite de domingo, o ministro do STF Gilmar Mendes julgou procedente uma ação da Rede Sustentabilidade, linha auxiliar do PT, e decidiu que o governo Lula poderá furar o teto de gastos, para garantir o Bolsa Família de 600 reais. Ou seja, poderá editar uma Medida Provisória para a liberação de crédito extraordinário, sem ferir a Constituição, o que o torna muito menos dependente da aprovacão da PEC do Estouro, alavanca que Arthur Lira estava usando em troca da manutenção do orçamento secreto — peça importante para ele ser reconduzido à Presidência da Câmara.

A conversa de Lula e Arthur Lira não foi boa, haja vista a sequência de fatos. Na quinta-feira anterior, o ministro Ricardo Lewandowski havia proposto e levado a suspensão da sessão na qual a inconstitucionalidade do orçamento secreto vinha sendo declarada por 5 pontos contra 4. Como a conversa entre Lula e Arthur Lira não deu em nada e Gilmar Mendes falou e disse, Ricardo Lewandowski descartou a resolução do Congresso de dar mais “transparência” ao orçamento secreto, aprovada a toque de caixa, e hoje votou pela sua inconstitucionalidade. Não precisou “modular” nada. Depois de dar a decisão que beneficia o futuro governo Lula, o ministro Gilmar Mendes votou pela legalidade do orçamento secreto, guardadas as devidas modificações e coisa e tal. Voto que, ao fim e ao cabo, foi para inglês ver. Por 6 a 5, o STF decidiu que o orçamento secreto contraria a lei.

Contraria, mesmo. Só que, outra vez, o que esteve e está em jogo — bruto — é a disputa entre Lula e Arthur Lira. O primeiro não quer dar ministério importante ao segundo, entre outros desfavores, para reservar apenas aos seus o que é alheio (dos cidadãos). O atual presidente da Câmara tem a convicção de que o STF está do lado do presidente eleito contra ele, e essa convicção ficou ainda mais forte depois da decisão de Gilmar Mendes que lhe tirou das mãos o poder de barganhar com a PEC do Estouro. De acordo com o jornalista Igor Gadelha, do Metrópoles, Arthur Lira está irritadíssimo com o enredo e, agora, petistas procuram fazê-lo crer que Lula não está querendo lhe puxar o tapete, com a ajuda do STF. Divertido. Tendo a crer, repito, que, se Arthur Lira mantiver o seu protagonismo, Lula realmente poderá ter um novo Eduardo Cunha para chamar de seu.

Talvez a decisão de Gilmar Mendes tenha o condão de convencer o presidente da Câmara a fazer um recuo tático e, assim, dar o seu empurrão à aprovação da PEC do Estouro, exigindo menos mundos e fundos de Lula neste momento. A ver o que vai sair da reunião entre Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. No momento em que escrevo esta coluna, a votação da PEC do Estouro continuava marcada para amanhã, terça-feira.

O que mais me chama a atenção, contudo, é a situação geral dos poderes. Em primeiro lugar, temos a possibilidade de um único ministro do STF ser capaz de interferir no Poder Legislativo, não importa se com razão ou sem ela. Sem dizer de onde tirar o dinheiro, Gilmar Mendes resolveu que o governo Lula pode furar o teto de gastos com o Bolsa Família de 600 reais e estamos conversados, inclusive porque a maioria dos demais ministros chancelará a sua decisão liminar. É um troço extraordinário a que ponto chegamos em matéria de alargamento das atribuições de um Poder Judiciário que desconhece a autocontenção.

Está certo que Gilmar Mendes, como juiz, agiu depois de provocado, a acreditar que ele não participa de conchavos. O segundo ponto é exatamente este: a provocação. Mais uma vez, a Rede Sustentabilidade, do prestativo Randolfe Rodrigues, recorreu ao tapetão do STF para fazer oposição jurídica a quem contraria o partido ou o partido do qual é linha auxiliar, esvaziando ora o Poder Executivo, ora o Legislativo. Foi o que ela fez durante todo o tempo contra Jair Bolsonaro — e é o que ela está fazendo agora contra Arthur Lira. A provocação foi feita no âmbito de outra ação que já tinha Gilmar Mendes como relator e que foi julgada pelo STF no final de 2021. Nessa ação, o tribunal decidiu que o governo federal estava obrigado a estabelecer programas de renda básica a partir de 2022, independentemente de questões fiscais ou da lei eleitoral. A repórter Carolina Brígido foi precisa no seu comentário: 

Embora sejam assuntos conexos, o contexto de ambas as decisões é absolutamente diferente. Ao fazer esse pedido justamente na ação em que Gilmar Mendes era relator, a Rede acabou escolhendo qual ministro tomaria a decisão. Se entrasse com outra ação no Supremo, como seria o caminho mais tradicional, o caso poderia ser sorteado para qualquer outro ministro – e, dessa forma, o partido correria o risco de ser derrotado.”

A Rede Sustentabilidade faz oposição jurídica e ainda escolhe o juiz.

Jogo bruto.

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