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A história do táxi dá a medida da palermice dos golpistas

O ridículo diminui a gravidade do fato? Não diria que diminui, mas dá a medida da palermice dos golpistas. Tendo a crer que não é atenuante

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Jair Bolsonaro, fazendo sinal de positivo -- Metrópoles
1 de 1 Jair Bolsonaro, fazendo sinal de positivo -- Metrópoles - Foto: Igo Estrela/Metrópoles

A logística das perigosas cabecinhas golpistas que ameaçaram o regime democrático como nunca antes neste país, na avaliação serena da maioria dos colegas jornalistas, era extremamente sofisticada.

Em 15 de dezembro de 2022, o major de codinome Gana, destacado para monitorar o ministro Alexandre de Moraes, que os trapalhões queriam sequestrar, comunicou os seu parceiros que estava com um problema para ir até o ponto de encontro no estacionamento de um shopping, depois que a missão foi abortada. Ele não conseguia pegar um táxi em Brasília — que também serviria para Gana resgatar Japão.

“Cara, acabei de chegar [a] um ponto de táxi aqui. Tinha um maluco, só que ele falou que ‘tava’ indo buscar um passageiro e ia chamar um táxi aqui ‘pra’ mim, ‘tá’ ligado? [Vou] ‘dá’ uns cinco ‘minutinho’ aqui, ‘pra’ ver se chega. Eu acho que agora vai resolver, mas tá pica, mané. Essa hora não tem táxi em lugar nenhum, né?”, explicou Gana, em áudio enviado ao grupo.

O planejamento era tão pica, que eles abortaram o sequestro porque leram no Metrópoles que a votação no STF sobre o orçamento secreto, depois da qual eles sequestrariam Alexandre de Moraes, havia sido adiada. Bom saber que a imprensa ainda tem serventia.

O ridículo da situação diminui a gravidade do fato? Eu não diria que diminui, mas dá a medida da palermice dessa gente. Tendo a crer que ser palerma ainda não é atenuante para a Justiça brasileira, ao contrário do que acredita Jair Bolsonaro. “Golpe agora não se dá mais com tanque, né? Se dá com táxi. E parece que o sequestro não saiu porque não tinha um táxi na hora… Ah, pelo amor de Deus, isso é uma piada, essa PF criativa do Alexandre de Moraes”, disse o ex-presidente, em uma live enquanto cortava o cabelo.

Há algo de ridículo em algumas tragédias, o que não as tornam menos trágicas. Dois exemplos: Em Antígona, de Sófocles, o arrependimento do rei Creonte foi tardio para salvar a sobrinha da morte a que ele a condenou, bem como para impedir os suicídios do seu filho, Hémon, e da sua mulher, Eurídice. É como se tivesse faltado táxi para avisar os envolvidos que Creonte havia mudado de ideia.

Em Romeu e Julieta, de William Shakespeare, não deixa de ser burlesco que ele tenha se matado por achar que ela estava morta, envenenada, quando Julieta, na verdade, havia tomado uma poção apenas para parecer que havia se matado — atitude extrema que ela só toma depois de se deparar com Romeu morto. O rapaz foi cretinamente precipitado.

Aliás, qual veneno seria usado pelos golpistas trapalhões para envenenar Lula e Geraldo Alckmin? A dúvida foi levantada por Fernando Gabeira:

“Há pontos ainda obscuros. O projeto era matar e envenenar. Matar a tiros — usando fuzis, pistolas e até um lança-granadas — é uma coisa. Envenenar é outra, em termos de planejamento. Você não lança uma granada envenenada; de um modo geral, usa outros métodos. A mais avançada prática no mundo talvez seja a da Rússia. Um simples chá pode destruir o oposicionista. Tanto o polônio-210 quanto o tálio são muito usados pela polícia política de Putin. Eis a pergunta sobre o envenenamento: qual era o plano, qual sua viabilidade no tempo escolhido, o mês antes da posse?”

O jornalista também contabiliza o número de vezes que o general Mário Fernandes, aparentemente o cérebro executivo do golpe que não houve, repetir a palavra “porra”: 53. “Se continuasse produzindo textos, acabaria aumentando o índice de natalidade nacional”, escreve Fernando Gabeira.

Na Grécia Antiga e na Inglaterra elisabetana, o ridículo ensejou clássicos da literatura; no Brasil, produziu isto aí, porra.

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