“Pedras no caminho, guardo todas elas. Um dia construirei um castelo”. Esta frase, do brasileiro Nemo Nox, sempre foi uma grande inspiração para mim. Há exatos 22 anos, quando abri as portas da minha primeira agência, o frio na barriga era tão grande quanto a certeza de que daria certo. Quem é empreendedor sabe que o otimismo é uma proteção ingênua que a gente veste diariamente pra percorrer o caminho.

As primeiras pedras, eu encontrei na desconfiança de muitos que me cercavam. “Vai abrir uma empresa já no segundo ano da faculdade?”, “Por que você foi fazer Jornalismo, se queria ter uma agência?”, “Seu pai te deu dinheiro pra brincar?”.

Aos 17 anos, eu queria ser correspondente de guerra no Oriente Médio, mas doze meses de estágio numa agência e alguns meses apoiando meu professor a fechar a primeira página do Estadão foram o MBA que eu precisava pra entender que o que eu queria era ter o meu negócio de comunicação.

Hoje, com um filho que acaba de entrar na faculdade que sonhou, exatamente com a idade que eu tinha à época, parece meio absurdo, mesmo, querer ter o meu castelo. Mas eu queria. E mais: eu queria que esse castelo fosse imponente, desejado por muitos, temido por alguns, amado por quem nele vive e que fosse um espaço seguro de experimentação e de criação de novas formas de se fazer comunicação. Mas eu não sabia o que estava por vir.

Os primeiros clientes chegaram facilmente. Já conheciam e confiavam na dona do castelo. Posso dizer que só de olhar o brilho nos meus olhos, viram que suas contas estariam em boas mãos.

Mas nem sempre foi assim: “Seu sócio está chegando?”, “É você mesma quem toca a empresa?”, “Você é tão bonita. Se a gente fechar, é você que vai vir sempre nas reuniões?”. Definitivamente não seria uma jornada fácil. E eu jamais imaginei que ser mulher pudesse aumentar o número de pedras no caminho.

Eis que bate uma insegurança nessas horas, aquela que alguns chamam de Síndrome da Impostora. Onde eu estava com a cabeça ao achar que esse plano daria certo? E é aí que grande parte das mulheres desiste do sonho. Porque já não é fácil pra quem nem precisa se provar. Para combater a sensação de que eu era uma fraude a ser descoberta a qualquer momento, parti para o estudo. Pós-graduação, especialização, pós-MBA nos temas de Gestão de Negócios, Liderança, Governança, Inovação.

Mas isso nem sempre funciona: segundo o IBGE (pesquisa “Estatísticas de gênero: indicadores sociais das mulheres no Brasil”), embora elas tenham mais anos de estudo e frequentem mais a escola, 43% das mulheres não se sentem prontas pra empreender e, nas empresas, elas seguem recebendo apenas 77,7% do rendimento dos homens.

É, como é difícil comandar o castelo. Cada canto que a gente arruma desajusta o outro. Quando o time está azeitado, o cliente resolve se seduzir por outra proposta. Quando os dias estão calmos, mudam as regras do jogo. Quando você perde noites entregando concorrências sem fim, o orçamento delas desaparece. Quando você endireita o financeiro e respira, surpresas batem à porta. Quando sua ideia é imbatível, percebe que os créditos foram dados a outro castelo mais antigo e imponente…

Ninguém disse que seria fácil, mas ninguém tampouco contou que o ser humano era tão complexo de entender e que seriam 1581 horas ao ano, só para adequar o castelo às burocracias do nosso sistema. Ninguém disse que seria fácil, mas ninguém tampouco previu que quando o dia se mostrasse ensolarado e pleno, uma pandemia viria como um cavalo de Troia, sorrateira e devastadora.

Mas, no Mês das Mulheres, esse artigo jamais seria um muro das lamentações. É sim, um registro de orgulho e de gratidão a todos que cruzaram meu caminho e que ajudaram a erguer as pedras. A todos que me mostraram as pedras que valiam a pena e as que só precisavam ser desviadas, e a todos aqueles que fazem parte do sonho.

Se você é mulher e pensa ter o seu castelo, seria leviano dizer que será fácil. Seria uma mentira dizer que você será feliz 24 horas por dia e que jamais terá vontade de desistir. Mas nada é tão gratificante quanto ter a certeza de que você está escrevendo sua história e imprimindo seu nome na vida de uma pessoa e de uma marca, ou melhor, de muitas pessoas e de muitas marcas.

Se você é mulher, eu te desejo força e coragem pra enfrentar os momentos em que a jornada parecer perder o sentido. Eu te oriento a preocupar-se menos com os muros pra reter suas pessoas em seu castelo e cuidar mais do seu jardim, pra que seus talentos escolham ficar. Eu te aconselho a admirar os outros castelos e analisá-los de forma menos romântica, porque eles também têm seus dias de glória e de sangue. Eu te sugiro acreditar naquela famosa intuição feminina que prevê a chuva e o choro como só a gente sabe. Eu te conforto dizendo que não há equilíbrio constante e que você sempre faltará em algo e sobrará em outro lugar. E, por último, eu peço que compartilhe a sua chama com outras mulheres e repare que quando você acende outras velas, seu fogo só aumenta.

Daniela Graicar é fundadora e co-CEO da agência PROS e criadora do Movimento Aladas. Atualmente lidera um time de 90 profissionais.