Envelhecimento no Brasil e o desafio da inclusão na publicidade
Doutor em Comunicação defende a necessidade de desconstruir estereótipos relacionados aos idosos em campanhas publicitárias
atualizado
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Até 2030, a quinta população mais idosa do mundo será formada pelos brasileiros, segundo dados do Ministério da Saúde. A compreensão de que o Brasil está se tornando um país com uma população mais idosa é relativamente recente e a publicidade desempenha um papel fundamental na inserção da agenda do envelhecimento saudável no debate público.
Isso ocorre porque o consumo desempenha um papel crucial no modelo social em que vivemos. Grupos que se destacam entre os consumidores são os mais visíveis e lembrados. O poder de consumo se torna, portanto, um fator primordial para a compreensão da existência dessas pessoas no sentido mais amplo.
A publicidade desempenha um papel essencial na forma como essas pessoas são retratadas, desejadas e apresentadas a outras. Ela vende sonhos. Por isso, quando as agências e produtoras utilizam pessoas idosas em suas campanhas, estão vendendo também a ideia de um futuro possível, saudável e legítimo.
Embora ainda haja um longo caminho a percorrer em um país que envelhece rapidamente, já vemos avanços na representação de idosos em meios de comunicação, especialmente no streaming e na mídia audiovisual.
Um exemplo notável é a campanha da grife Reserva para o Dia dos Namorados de 2022, que apresentou casais idosos se beijando, se acariciando e se abraçando em fotografias e vídeos. Os anúncios repercutiram amplamente nas redes sociais e na imprensa.
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Essa campanha, com o mote “Amor não tem idade”, buscou de alguma forma trazer um apelo sentimental que raramente é explorado na publicidade, especialmente na publicidade de marcas voltada para jovens, como é o caso da Reserva.
Essa mudança de paradigma é tão recente que ainda causa estranheza em muitas pessoas, já que vivemos em uma sociedade que prioriza valores associados à juventude, deixando a velhice frequentemente invisível.
Contudo, esse avanço é fundamental, pois as campanhas publicitárias moldam desejos e refletem a importância de considerar os idosos como parte essencial de nosso público consumidor. Importante lembrar que durante a pandemia, muitas famílias que perderam suas fontes de renda devido ao fechamento de empresas foram sustentadas por membros idosos que estavam presentes com suas aposentadorias.
Isso mostra que o papel do idoso vai além do aspecto biológico e contribui significativamente para a geração de renda e sustento, especialmente em uma classe média que envelhece gradualmente. À medida que mais marcas promovam campanhas direcionadas a esse público, sem estigmatizá-lo, todos serão beneficiados.
Não podemos, porém, limitar a publicidade a produtos específicos, como dispositivos auditivos ou casas de repouso, mas sim refletir uma mudança paradigmática necessária. É importante considerar as diferentes faixas etárias e outros aspectos de diversidade, como gênero, raça e classe social.
A publicidade desempenha um papel crucial ao desafiar o ageísmo e etarismo em todos os níveis da sociedade, promovendo uma visão inclusiva que valoriza a riqueza trazida pelas diferentes faixas etárias e celebra a diversidade de nossa população.
O consumo é uma forma importante de inserção social já que estamos inseridos numa realidade muito pautada pelo desejo. Nesse sentido, é fundamental que a publicidade assuma essa responsabilidade de maneira mais abrangente e valorize como parte indispensável do dia a dia aqueles que trazem a idade estampada em seus cabelos brancos.
Valmir Moratelli é doutor em Comunicação e autor do livro A Invenção da Velhice Masculina, publicado pela Matrix Editora.