Como a LGPD pode influenciar no sucesso de uma marca?
Tatiana Campello e Cecília Cunha, do Demarest Advogados, afirmam que as empresas devem estar atentas aos valores do cliente
atualizado
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Entre dezembro de 2020 e fevereiro de 2021, a Accenture conduziu seu 16º estudo anual Global Consumer Pulse1 a fim de compreender as preferências, as crenças e os comportamentos de consumidores do mundo todo.
A pesquisa envolveu 25.444 pessoas maiores de 18 anos e de 22 países para identificar de que forma as expectativas dos consumidores estão evoluindo e como as empresas podem capitalizar essa evolução para atingir novos níveis de crescimento e vantagem competitiva.
O estudo revelou que cinco áreas distintas estão cada vez mais presentes nas decisões de compra dos consumidores. Esses fatores vão além de preço e qualidade e incluem aspectos como saúde e segurança, serviços e cuidados pessoais, facilidade e conveniência, origem do produto, confiança e reputação.
Não à toa, uma das penalidades previstas em caso do cometimento de infrações às normas previstas na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei 13.709/18 ou LGPD) que pode gerar mais dor de cabeça para as empresas é justamente a que afeta diretamente a confiança e a reputação: tornar pública a ocorrência da infração, quando devidamente apurada e confirmada.
Todo mundo já ouviu que uma empresa pode perder em um segundo a credibilidade conquistada em anos. Mas, então, será que a LGPD pode influenciar no sucesso de uma marca, por meio de ações proativas na mesma medida em que pode contribuir para a perda do seu prestígio no mercado, no caso de descumprimento das normas previstas?
O pensamento para se responder a essa questão é muito simples e vai ao encontro do resultado da pesquisa referida. Isso porque a LGPD é uma lei que busca o compliance no tratamento dos dados pessoais, mais do que estabelecer regras rígidas a serem adimplidas.
Esse fato gera muitas oportunidades aos agentes de tratamento aumentarem seu valor intangível com ações que promovem a confiança do destinatário dos seus produtos e serviços.
Os agentes de tratamento podem melhorar o serviço prestado às pessoas físicas aumentando sua preocupação nos mecanismos de segurança adotados para o tratamento dos dados pessoais e demonstrando a adoção dessas medidas em ações em redes sociais, por exemplo.
Podem, ao fazer o registro das operações de tratamento (RoPA ou Data Mapping), que é uma obrigação legal, perceber que estão tratando mais dados do que o necessário para atingir a finalidade pretendida e informar ao titular proativamente a alteração desse modus operandi (modo de operação), como uma forma de accountability (responsabilidade). Tudo isso é capaz de gerar um marketing positivo a partir da compreensão de valores que importam e de uma chance aproveitada.
Os agentes também podem investir na facilidade e conveniência nas interfaces de aplicativos ou websites tornando-os mais user friendly (amigo do usuário). E principalmente na demonstração das medidas que estão sendo adotadas para melhorar a experiência do cliente, como no que se refere ao canal para atendimento às solicitações apresentadas pelos titulares ou para entrar em contato com o encarregado, gerando confiança e, consequentemente, melhorias na reputação.
Nenhuma empresa ou instituição governamental está isenta de sofrer um incidente de segurança. Existe, inclusive, a premissa máxima de que não se trata de “se”, mas de “quando”.
No entanto, se essa instituição envida esforços para se adequar às melhores práticas de mercado no que se refere à privacidade, proteção de dados pessoais e segurança da informação, provavelmente, ela estará preparada para lidar com um eventual incidente da melhor forma possível e saberá informar, no que for cabível, de forma transparente e segura os caminhos e soluções que estão sendo buscados.
Certamente acolheremos e tomaremos nossas próprias decisões como consumidores com base em tudo o que primamos para que uma empresa conquiste a nossa confiança e a preocupação com como nossas informações estão sendo tratadas internamente devem ser indispensáveis para essa escolha. Então, como a LGPD pode influenciar no sucesso de uma marca?
É importante que os valores da marca condigam com os valores do cliente e do que ele busca. Não basta que a empresa adote medidas de adequação às normas, ela precisa demonstrar o que está por trás dos bastidores e que a política de privacidade não está ali para cumprir uma agenda, mas sim para passar de forma simplificada, destacada e, às vezes (por que não?) gráfica ou audiovisual as informações que são de interesse do titular. E isso não é difícil de ser feito, basta uma estratégia focada na experiência do usuário.
Segundo Baiju Shah, CSO da Accenture Interactive, “as marcas precisam reavaliar e reconstruir sua relevância de acordo com esses novos valores, além de antecipar e atender às necessidades atuais dos seus clientes. Os líderes precisam tomar uma decisão difícil: aceitar as mudanças e criar experiências que realmente importam ou ignorá-las e perder a oportunidade de diferenciação e criação de um crescimento sustentável”.
Não é mais sobre preço e qualidade. Com valores atrelados ao ESG (Environmental, Social and Governance) em alta, as marcas precisam se aventurar pela humanização e empatia pelo seu consumidor.
A LGPD traz uma lista de “todos” no seu artigo 6º, o qual apresenta os princípios balizadores das suas normas. Quem vê nisso a oportunidade de inovar e ganhar vantagem competitiva dos concorrentes não é visionário, só está atento.
Tatiana Campello e Cecília Cunha são advogadas do Demarest Advogados.