Criação de conteúdo deve ser um modelo de negócio, afirma Rafa Lotto
Em entrevista exclusiva, especialista aborda importância dos influenciadores nas estratégias das marcas e posicionamento dentro do Metaverso
atualizado
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Em outubro do ano passado, quando o CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, anunciou que a empresa passaria a chamar-se Meta, as marcas começaram a pensar em como deveriam se posicionar no Metaverso.
No entanto, para continuar a ter resultados eficazes, elas precisaram primeiro entender como esse posicionamento deveria ser feito dentro do conceito, que não é uma novidade, ele já existe há anos. Por isso, pensar em mudanças somente nas estratégias de comunicação pode ser um equívoco, deve-se focar em novas ações de negócios, para realmente alcançar resultados no mundo virtual.
Além disso, as marcas precisam entender o papel do Marketing de Influência na estratégia global, como ele contribuirá para os resultados e como as empresas se relacionarão com a comunidade do influenciador.
Para entender essas e outras questões em tudo que engloba o mundo digital, o Metrópoles entrevistou Rafa Lotto, Head de Planejamento e sócia da YOUPIX – empresa de consultoria voltada para Influence Economy, que oferece um olhar estratégico para auxiliar as marcas a terem melhores soluções e aperfeiçoar a presença no ambiente digital em parceria com os creators.
Confira a entrevista na íntegra com Rafa Lotto:
Como as marcas podem atuar no Metaverso?
Acho que primeiro vale lembrar que o Metaverso não é uma tecnologia disruptiva que nasceu ontem, mas um conceito que ganhou essa importância depois que Mark Zuckerberg resolveu se apropriar desse termo para falar dos planos futuros da empresa dele. Se pensarmos no universo dos games, isso é uma realidade bem sólida. Veja o exemplo do League of Legends (LoL), que, apesar de ser gratuito, as vendas dentro dele foram responsáveis por um faturamento de US$ 1,7 bilhão em 2020. As vendas incluem skins com “roupas” de grifes para os personagens, itens que só existem no mundo virtual e uma infinidade de transações que já representam “propriedades” virtuais. Isso é o Metaverso acontecendo faz tempo. Nesse contexto, criadores de conteúdo estão explorando possibilidades e acredito que sim, que devam voltar mais atenção para essas possibilidades depois dos holofotes colocados por Mark nesse conceito, mas para 2022 não vejo nada mudando radicalmente.
Quais serão as principais revoluções que o Metaverso causará na comunicação das marcas?
Aqui está um ponto-chave. Essa narrativa que foi apropriada pelo Facebook e de certa forma “popularizada” pela atenção midiática que teve está fazendo as marcas olharem para o Metaverso de forma superficial. Metaverso já é uma realidade e as marcas devem olhar para isso não com o foco da mudança na comunicação, mas com o olhar da mudança no negócio. É muito mais profundo que isso. Do ponto de vista de comunicação, existem sim oportunidades, mas repito, elas são a camada mais rasa dessa discussão. Em 2019, o Wendy’s fez uma ação no Fortnite que ganhou um GP em Cannes. Se a gente quiser reciclar essa ideia, hoje podemos dizer que foi uma ação de comunicação no Metaverso. Foi legal, ganhou Cannes, mas o Wendy’s continua vendendo hambúrguer na loja física, o negócio não mudou nada. Quando eu vejo a Gucci vendendo skin para personagens do jogo, aí sim estamos falando de mudanças no negócio.
A marca precisa marcar presença no feed e na vida do influenciador frequentemente. Como fazer isso de forma leve?
É importante para qualquer marca mudar esse pensamento de “presença” para o de “conversa”. Antes de qualquer coisa, as marcas precisam amadurecer a ideia de que estão sustentando alguma estratégia por meio do envio de presentes, os famosos “recebidos”. Pensar a influência de forma estratégica é o começo disso. Entendendo o papel do Marketing de Influência na sua estratégia global, como irá contribuir para seus resultados e especialmente como essa marca quer relacionar não só com o influenciador, mas com a comunidade dele, estando presente de forma a valorizar o conteúdo do creator e não ser apenas uma interrupção em forma de #publi.
Como o Metaverso, blockchain e NFT impactam no mercado de Marketing de Influência?
Pra mim, é a mesma discussão sobre as marcas e o Metaverso. Acredito que muita gente vai surfar uma onda na superfície do hype por algum tempo, algumas continuarão nesse lugar, mas à medida que se pensarem negócios a partir disso, o jogo muda. Se expandirmos o olhar de Marketing de Influência para creator economy, consigo vislumbrar negócios nascendo a partir daí.
Como o Marketing de Influência deve se comportar frente ao ano eleitoral? Quais serão as principais tendências?
Acredito que, ao contrário dos anos anteriores em que marcas preferiam trabalhar com influenciadores que não se posicionam, este ano esperamos um efeito contrário. Influenciadores e celebridades estão cada vez mais sendo cobrados por suas audiências para assumirem um lado e o silêncio pode ser interpretado como algo negativo. Mais próximo das eleições, alguns posicionamentos atuais serão reforçados nas discussões. Nesse sentido, marcas tendem a evitar trabalhar com aqueles que de alguma maneira incentivam ou não se posicionam contra pensamentos antivacina, negacionistas, extremistas, preconceituosos em qualquer sentido, com o risco dessas características serem transmitidas para a marca.
Por que investir em Marketing de Influência?
As marcas estão cada vez mais maduras no entendimento de que o trabalho com o criador de conteúdo envolve mais do que só o seu espaço como mídia e seu endosso. Um estudo da Nielsen que apresentamos no YOUPIX Summit mostra que o consumidor tem maior recall de propagandas feitas pelos influenciadores do que as vistas nos meios tradicionais, e esses números ajudam muito a comprovar o que as marcas já experimentam, mesmo que empiricamente, nos negócios. O Marketing de Influência tem um ingrediente que nenhuma outra forma de comunicação entre marcas tem, que é a conexão entre as pessoas. É curioso pensar que do lado da operação, marcas estão cada vez mais distanciando o atendimento humano do consumidor, com bots de atendimento e qualquer tecnologia que evite ou adie a necessidade do consumidor falar com uma pessoa real. Enquanto isso, por meio do Marketing de Influência, a comunicação tem a oportunidade de estar mais humana e personalizada, com a intermediação dos influenciadores e não de banners que aparecem pra você porque o algoritmo entendeu que aquilo pode te interessar. Eu acho isso importante demais!
Como aplicar o Marketing de Influência nos negócios?
Olhando para isso de forma estratégica desde o momento zero, tenha o tamanho que tiver, essa é uma disciplina essencial. Vejo hoje marcas pequenas nascendo e ganhando importância tendo o Marketing de Influência como o grande impulsionador, muitas vezes com seus próprios donos à frente dessa construção. A beleza disso é que esses empresários estão virando marcas e passaram a ser concorrentes reais de marcas gigantes. Se olharmos para o segmento de beleza e moda, vemos um “spoiler” do que pode acontecer com muitos outros. Nati Vozza vendeu a marca dela para o Grupo Somma por 120 milhões e hoje é a marca com maior faturamento por metro quadrado do grupo. Boca Rosa Beauty, que é a marca da beleza da influenciadora Bianca Andrade, faturou 120 milhões de reais em 2020. Carol Bassi, outra influenciadora, vendeu a marca dela de roupas para o grupo Arezzo por 180 milhões de reais. Os números impressionam, e comprovam. Influência é um negócio. Essa é uma realidade diferente para uma marca já consolidada, que precisa incluir essa disciplina em uma dinâmica que já acontece de outra forma há dezenas de anos. Como toda grande estrutura, tem dificuldade de se mover nesse sentido, mas eu diria que para 2022, Marketing de Influência tem que ser assunto do CEO.
É possível fazer Marketing de Influência com pouco investimento?
Eu diria que o “pouco investimento” tem que ser sempre relativizado, porque ele é proporcional ao tamanho da empresa. Se você é uma empresa pequena, local, um espaço físico como um restaurante, uma loja, tem muita chance de construir bons resultados através de parcerias com influenciadores locais, com permutas ou cachês menores. Mas eu vejo muita marca grande com esse pensamento de companhias menores, querendo trocar visibilidade por um almoço, por exemplo. O mercado está amadurecendo, os influenciadores se profissionalizando e o mesmo pensamento para marcas de diferentes tamanhos e segmentos não cabe mais, é preciso ser estratégico. Dependendo do contexto, não há como esperar grandes resultados com verbas que não condizem ao tamanho do projeto/campanha.
O ROI do trabalho é um fator importante. Como ele influencia na escolha de um influencer?
As marcas não têm mais dúvidas de que o trabalho com influenciadores é essencial dentro do mix de disciplinas de Marketing. Isso se refletiu no budget: a quantidade de empresas investindo mais de R$ 5 milhões por ano dobrou em relação à 2019, segundo nossa pesquisa “ROI & Influência 2021”. Os fatores que impedem as marcas de investirem mais em influência são a dificuldade de quantificar o ROI e provar a efetividade do influenciador (72%), a dificuldade de encontrar o influenciador certo para a marca (35%), 32% acham muito caro e 27% acreditam que a profissionalização do mercado ainda é baixa. Por outro lado, temos uma pesquisa que revela que 40,6% das marcas não estabelece nem cobra um resultado dos influenciadores e um em cada três não define as métricas e indicativos de sucesso da campanha antes de realizá-la. Ou seja, parte da dificuldade de quantificar o retorno da ação tem a ver com a falta de planejamento das marcas. A definição da atuação do influenciador dentro da estratégia de marketing da marca é ponto-chave para estabelecer a narrativa e as métricas certas de avaliação do resultado da campanha. Isso deve ser feito antes da ação, no momento do planejamento. Se não sabemos onde queremos chegar e como vamos medir, nossa atuação se torna tática e não conseguiremos mensurar nada além de alcance e engajamento de posts. De fato, 82% das marcas ainda têm como principal critério de sucesso a soma do alcance e engajamento dos posts realizados pelos influenciadores. Isso diz pouco ou quase nada sobre o verdadeiro resultado da influência, visto que alcance e engajamento não demonstram o impacto da ação para o negócio.
E neste ano como fica?
Acredito que em 2022 a gente continue com a consolidação de um pensamento de que a criação de conteúdo é um modelo de negócio e que Marketing de Influência é apenas uma das formas de monetização do criador. Nesse sentido, criadores que se monetizam através do Marketing de Influência estão cada vez mais atentos para a entrega que fazem para as marcas, investindo tempo e criatividade para #publis mais distantes daquela fórmula “tira uma foto e copia e cole o texto que a marca mandou”. Do lado das marcas, um entendimento de que o combo “um post no feed e três stories” não necessariamente traz resultado e que as campanhas de Marketing de Influência precisam de um pensamento integrado e um planejamento estratégico. Pra resumir, diria que 2022 será um ano para sairmos do tático e consolidarmos essa disciplina como uma ferramenta estratégica de construção de marca e de resultados de vendas.