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Da Cor do Pecado, novela de 2004, voltou ao ar no canal Viva nesta segunda-feira (19/4). A produção foi um marco na carreira de Taís Araújo, que deu vida à Preta, a primeira protagonista negra da Rede Globo. O papel foi responsável por mudar a visão do público, até então acostumado a torcer apenas por personagens interpretados por atores brancos.
Taís nasceu e foi criada no Méier, bairro do subúrbio do Rio de Janeiro, filha de uma professora e um economista. Ainda na adolescência, despontou para o sucesso em Xica da Silva, novela da extinta TV Manchete. Hoje, casada com Lázaro Ramos e mãe de João Vicente e Maria Antônia, ela é uma das atrizes mais queridas pelo público brasileiro.
Aos 42 anos de idade e 25 anos de carreira, Taís tem muita história para contar. A atriz conversou com a coluna sobre suas personagens mais lembradas, empoderamento feminino, resistência e luta dentro do mercado televisivo e o legado que pretende deixar para mulheres negras. Confira!
Qual foi a importância de Da Cor do Pecado para a televisão brasileira por ter uma protagonista negra?
Eu achei que foi muito importante Da Cor do Pecado acontecer e ter essa protagonista, com aquelas características e ser um sucesso. Tem muitas coisas importantes que fizeram ela cair no gosto do público.
Você sentiu medo da reação do público na época?
Senti. Porque tudo o que é novo dá um receio de ser aceito ou não. Senti medo e, inclusive, nas primeiras semanas, achei que tinha flopado. Mas depois, pegou o voo e foi. Foi uma experiência muito linda essa novela.
Você sentiu uma mudança do público em relação a você?
Sim. Tinha ficado sete anos sem fazer grandes personagens desde Xica da Silva. Foi um momento muito importante para o meu amadurecimento, pois eu era muito nova e inexperiente quando fiz Xica da Silva. O público gostava muito da Preta. E quando eles gostam muito de uma personagem, acabam transferindo para a gente esse sentimento.
Você teve personagens muito marcantes, como Xica da Silva, a Helena, em Viver a Vida, de Manoel Carlos, Preta, Maria da Penha, de Cheias de Charme, e Vitória, de Amor de Mãe. O que cada uma delas trouxe de aprendizado como referência e representatividade?
Sem dúvidas, cada uma me trouxe uma coisa de aprendizado. São personagens muito importantes na minha carreira, na minha construção enquanto atriz. E tem uma coisa que é muito simbólica. Como sou uma profissional que começou a trabalhar muito cedo, essas personagens me ajudaram a construir a mulher que eu sou, com suas histórias, seus dramas, conflitos, dificuldades e alegrias. Começar a trabalhar muito cedo tem a vantagem de vivenciar histórias que não são suas e que nem teria tido tempo de vida para vivenciar. Isso faz com que a gente amplie nosso olhar para a sociedade. É muito interessante.
É verdade que você aceitou fazer a Helena porque na sinopse não dizia que a personagem era negra?
Eu aceitei fazer a Helena sem ler a sinopse, eu acho. Talvez, o Manoel Carlos tenha me falado pelo telefone. Mas eu aceitei por ser ele e por ser essa personagem icônica dele e pelo o que significava. Não considero a personagem ruim. Acho que tem questões de desenvolvimento e de interpretação. Mas a imagem que eu tinha dessa novela se dissipou. Na época, muitas mulheres e meninas vieram conversar comigo para falar que transformaram suas vidas, seus cabelos e se aceitaram por causa da personagem. No fundo, foi um grande sucesso, porque personagem bom é aquele que fica e transforma a vida das pessoas. E a Helena foi assim.
Mesmo com tantos anos de carreira, você ainda sente inseguranças?
Eu sinto muita insegurança. Acho que a segurança faz parte do caminho e do processo. Porque a gente não sabe de tudo, eu não sei de tudo, porque eu não domino nada. Cada personagem é uma personagem, cada história é uma história, e em cada época eu vou estar em um estado de espírito ou passando por alguma situação da minha vida que vai agregar ou não aquela história. Então, não existe segurança nesse trabalho. Não sou segura, jamais serei e nem quero ter essa segurança.
Qual legado você quer deixar enquanto mulher negra?
Sabe que tenho pensado muito sobre isso? Não só para a mulher negra, mas para a sociedade: que eu tentei. Quando eu morrer quero que esteja escrito na minha lápide: “Essa aí tentou fazer alguma coisa para transformar a sociedade.” É a tentativa de transformação, de equidade de gênero, raças e oportunidades iguais que me motiva, me faz seguir e me desafia. Eu gosto de ocupar esse lugar.
Como você vê o futuro? Acredita que as mulheres negras terão um caminho diferente do seu e ocupando ainda mais espaços que no passado não eram ocupados?
A geração da minha filha já vem com outra pegada, outro entendimento de mundo, de país, de sociedade, de mulher. E do meu filho também. Eu acho que as meninas e as mulheres vão ter um caminho diferente. Já tem! E é daí para o caminho da igualdade plena.