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A saída de Maisa do SBT caiu como uma bomba. O mesmo havia acontecido no dia em que Xuxa comunicou que iria para a Record TV. No entanto, o adeus de Maisa tem um enorme significado, pois foi a gota d’água e evidencia a grande crise na TV, além de descaracterizar a emissora como “da família brasileira”
O fim da relação entre Maisa e o SBT não foi anunciado num sábado por acaso. A intenção foi gerar um impacto menor para a emissora com a péssima notícia e ao mesmo tempo alavancar o Ibope do programa dela. A apresentadora era o segundo maior símbolo da emissora, só perdia para o Silvio Santos. Com isso, o término do contrato evidencia uma série de sucessivos erros que estão levando a TV da Anhanguera ao seu pior momento dos últimos 20 anos.
Maisa foi descoberta por Raul Gil, mas teve seu auge ao lado de Silvio Santos. O Brasil parava para ver a artista ainda criança falar todas as verdades na cara do animador. Ela dizia que ele usava peruca e, sem cerimônias, declarava que ele estava ficando “gagá”. A apresentadora ganhou fama graças ao carisma e à inteligência.
O SBT criou um dos grandes ídolos teen do Brasil, uma das adolescentes mais seguidas do mundo nas redes sociais. Quem em sã consciência deixaria alguém que carrega consigo os maiores predicados da TV ir embora? O público da emissora acompanhou Maisa crescer e se tornar uma mulher. O trauma para o SBT vai ser grande.
Mas o que levou Maisa a sair? Para entendermos, precisamos voltar um pouco no tempo e ver o caso de Larissa Manoela. A atriz, que hoje está na Globo, deixou o SBT porque a emissora nunca deu o real valor a ela. Não perceberam que estava amadurecendo e continuavam a oferecer projetos que não condiziam com a realidade.
A verdade seja dita: o SBT tratava muito melhor a Maisa do que a Larissa. Por inúmeros motivos. Larissa tem uma personalidade muito forte para uma emissora que não tem como DNA a contestação. Larissa tem tudo para ser uma das grandes apresentadoras de TV e saiu por falta de projetos pessoais. A emissora de Silvio Santos pagou caro por não ter dado valor. Por que não trataram a Larissa tão bem quanto a Maísa? Não ofereceram para ela nenhum programa, só uma novela teen. Não quero que em nenhum momento isso seja tratado como uma rixa entre Larissa e Maisa, mas qualquer empresa funciona assim. Há sempre aqueles que são mais bem tratados que outros.
O programa da Maisa era um dos poucos que dava lucro para a emissora. Grandes empresas, como a Coca-Cola, voltaram a investir no SBT — depois de anos ausente, após o início do programa da apresentadora teen. Ela é um produto perfeito para anunciantes, além de dialogar com seu público on e off-line.
O comunicado do SBT sobre a saída de Maisa ressaltou que lá ela cresceu como profissional e se desenvolveu. Como se fosse uma saída natural. Acredito em parte nesta explicação. Maísa quer inovar, fugir do clichê, fazer a diferença para o mundo.
Há poucos anos, a apresentadora manifestou o desejo de sair do SBT. Foi um corre-corre, um desespero… Até que ofereceram para ela um programa só seu. Mas com o tempo ela percebeu que estava fazendo mais do mesmo. E Maisa não quer ser óbvia.
O SBT ficou pequeno para Maísa. Ela percebeu que consegue se comunicar com seu público muito mais via internet do que via TV. O público da TV está envelhecendo a passos largos. E Maisa não estava falando com eles. O target (conseguir passar o recado para público que interessa) é o grande segredo.
O fator Silvio Santos
É importante ainda falar do grande fator de decisões do SBT: Silvio Santos. Ele é a principal estrela da emissora, o dono, e, claro, dita as regras. Os limites da insanidade e incapacidade de ouvir a opinião da equipe fazem com que o seu videogame em forma de TV acumule perdas irreparáveis. De Larissa Manoela a Maisa, de Cabrini a Sheherazade… E mais: o SBT acabou com a sua dramaturgia e extinguiu as produções dos programas de Patrícia Abravanel e Raul Gil.
O que restou foi a Taça Libertadores da América. A sua avó deve estar se perguntando por que o SBT decidiu priorizar essa competição? Mesmo sem ter público nem história nem tradição com o esporte. O que está cada vez mais claro é que Silvio quer usar o SBT como um instrumento político (não é uma questão de Bolsonaro ser presidente. Silvio já fez isso na história da emissora).
Fábio Faria, ministro das Comunicações e marido de Patrícia Abravanel, tem alcançado feitos inimagináveis. Ele simplesmente iniciou uma tentativa de paz entre Bolsonaro e a TV Globo. Fábio é um grande estrategista. E ganhou uma enorme importância no governo e no SBT. Não se surpreenda se um dia ele passar a gerir a emissora do sogro. Mas, o mais triste é que todas essas mudanças estejam descaracterizando a imagem do SBT. E se isso é ruim? É péssimo. Há outras empresas que passaram por esse amargo gosto.
Vou trazer uma experiência pessoal para essa questão. Há mais de 10 anos, o Grupo Globo de jornais criou um periódico extremamente popular. O Dia, principal concorrente, que sempre foi um jornal bem popular, decidiu criar o Meia Hora para o povo e se tornar um jornal da elite. O leitor entendeu o recado: O Dia tinha vergonha de ser lido pelo povo. O que aconteceu? Uma linha editorial esquizofrênica. Tal qual acontece com a emissora de Silvio Santos hoje. Qual é o público dele? A quem ele quer atingir? Qual é a identidade?
Falta uma liderança criativa e inovadora. A emissora “mais feliz do Brasil” precisa cortar sua dependência do governo federal. O SBT é gigantesco e não tem a menor linha política. Eles só querem defender o governo, independentemente de quem esteja lá. E isso soa como pequeno, pueril e que só pensa em interesses próprios.
A crise no SBT está instalada e a saída de Maisa, um dos maiores símbolos da emissora, deixa isso ainda mais claro para o telespectador que não se reconhece mais no canal.