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Uma breve reflexão sobre precedentes judiciais e Administração Pública

A quem interessaria um Judiciário lento e atulhado de demandas com similitude entre si? A ninguém

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Estatua da justiça sendo lavada no STF
1 de 1 Estatua da justiça sendo lavada no STF - Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

O sistema de precedentes, fomentado a partir da promulgação do Código de Processo Civil de 2015, ganha relevo destacado sob a visão da Administração Pública. Ao se fazer o confronto entre precedentes e as atividades inerentes à Fazenda Pública, questionamentos podem surgir e, dentre eles, destaco um: seria o precedente judicial um fenômeno jurídico-processual capaz de alterar a cultura arraigada no ventre do Poder Público de recorrer até o fim?

Para tentar respondê-lo, deve-se partir de um breve conceito. De maneira geral, o precedente judicial seria fruto de uma construção judiciária, por seus órgãos competentes, de decisões paradigmáticas com alcance geral e delimitadas pela ratio decidendi. As razões de decidir são extremamente importantes nesse contexto, já que nem todos os precedentes têm serventia por conta de peculiaridades inerentes ao caso concreto.

O tema tem ganhado corpo nos últimos anos, seja com grande número de estudos, monografias, teses e ensaios, seja na prática judiciária. Tal recrudescimento ocorreu sensivelmente após a promulgação do Código Fux (2015).

Certa inquietação sobre o assunto surgiu após as XV Jornadas Brasileiras de Direito Processual, realizadas em setembro deste ano, na cidade de Curitiba (PR). Mais precisamente a correlação entre precedentes judiciais e a administração pública, notadamente a observância pelos seus órgãos de representação jurídica. O tema voltou a ser debatido, em outubro, durante o 2ª Congresso Nacional de Fazenda Pública em juízo, em Maceió (AL).

Neste último evento, o professor Marco Aurélio Ventura Peixoto, advogado da União e doutorando em direito processual pela UERJ, tratou da necessidade de um diálogo entre os precedentes administrativos e as decisões judiciais, bem como entre os precedentes judiciais e as decisões administrativas. Da didática exposição, foi possível tirar algumas conclusões sobre o tema.

É bem verdade que a advocacia pública, numa ótica mais antiga, tinha como mote a interposição sem freios de recursos. Alguns colegas, que viveram naquele tempo, afirmam serem, por vezes, pautados pelo medo de sofrerem consequências disciplinares e, por essa razão, recorriam de tudo, sem qualquer critério, com aquele pensamento: “Vou limpar a mesa interpondo o recurso e, assim, não corro o risco de ser responsabilizado por perda de prazo e descaso com o interesse público”, ou “vou recorrer porque é mais fácil do que representar pela não interposição do recurso, sabendo que a chance de ter a representação acolhida é quase nula.”.

Evolução

Para nossa sorte, a advocacia pública tem evoluído de uma forma consistente e lógica. Ela não parou no tempo. Temos colegas extremamente qualificados, técnicos e proativos na defesa coerente e eficaz do interesse público. Nesse sentido, podemos destacar que algumas Procuradorias levam a sério a temática da consensualidade, de forma a evitar a sobrecarga do Judiciário, a procrastinação processual e, de outra banda, prestando um serviço de primor para a coletividade que lhe remunera.

A quem interessaria um Judiciário lento e atulhado de demandas com similitude entre si? A ninguém, acredito. É neste aspecto que ganha vida o sistema de precedentes, ao menos num aspecto mais palpável, sensível ao operador do direito.

Com base nessa premissa, podemos concluir que, em estrita observância aos preceitos principiológicos da Constituição Federal, especialmente o princípio da eficiência (CF, art. 37, caput), é dever do agente público responsável pela orientação e defesa da Fazenda Pública, nas suas três esferas, internalizar o precedente judicial, a fim de evitar a interposição de recursos ou medidas judiciais fadadas ao insucesso.

Há Procuradorias em que existe a chamada lógica inversa, ou seja, para recorrer o procurador/advogado deve representar para obter autorização. Nesses casos, havendo um precedente judicial que possivelmente se subsuma ao caso, deve o agente público argumentar por meio de distinguishing, tanto na seara interna (representação aos superiores hierárquicos), quanto na externa (nas razões recursais), a fim de deixar cabalmente demonstrado que aquela situação não se amolda à decisão paradigma.

Não se pode esquecer da área consultiva, cuja internalização dos precedentes também é imperiosa porque, sobretudo, tem a função de prevenir futuras demandas judiciais.

De fato, o instituto dos precedentes judiciais, sendo bem utilizado, poderá modificar, de uma vez por todas, aquela ideia vetusta de recorrer por recorrer. O efeito dessa mudança reverbera, ao final, numa prestação jurisdicional eficiente.

Pensamento diverso, a meu ver, o desnatura e contribuirá para abarrotar o Judiciário com demandas falidas, diante de decisões paradigmáticas anteriores, cuja razão de decidir são assemelhadas.

O tema é palpitante e cheio de nuances, detalhes e questionamentos que não se encerram com o presente texto, mas que pode deflagrar o interesse de aprofundamento por parte do leitor.

  • Celso Alves de Resende Junior é procurador do estado de São Paulo com exercício em Brasília; ex-conselheiro da Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo no biênio 2011/2012 e especialista em Direito Processual Civil pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) 

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