Transparência é tendência? Confira índice da moda de 2020 no Brasil
O Fashion Revolution divulgou relatório que analisa dados compartilhados por 40 marcas e varejistas brasileiras
atualizado
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Um dos anos mais desafiadores nos últimos tempos chega ao fim. Ao longo dos 12 meses, o setor da moda enfrentou um cenário tumultuado devido à pandemia da Covid-19. Como de praxe para o período, o Fashion Revolution Brasil anunciou os resultados da terceira edição do Índice de Transparência da Moda Brasil (ITMB), relatório anual que reúne dados divulgados ou omitidos de 40 marcas e varejistas.
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O coronavírus teve seu início na China em dezembro de 2019, e espalhou-se rapidamente para o Ocidente no início deste ano. Não demorou para a indústria da moda começar a sofrer as consequências na cadeia de produção e escassez de matérias-primas. Diante de uma crise econômica que respingou no setor, o Fashion Revolution, mais uma vez, tornou visíveis processos, pessoas e empresas na cadeia produtiva da moda.
No levantamento, são analisados os dados públicos fornecidos pelas etiquetas de moda brasileira sobre suas cadeias de fornecimento. Práticas e planos de negócios também são mensurados, assim como os impactos diretos de suas condutas sobre trabalhadores, comunidades e meio ambiente.
“Para o Fashion Revolution, transparência significa a divulgação pública de dados confiáveis, detalhados e comparáveis sobre políticas, compromissos, práticas e impactos sociais e ambientais de uma empresa em toda a sua cadeia de valor. A instituição acredita que a prática gera maior prestação de contas – o que pavimenta um caminho de mudanças reais e necessárias na moda”, comunicou.
Implementado desde 2018 no Brasil, o relatório tem o objetivo de ser uma ferramenta que incentiva, progressivamente, grandes marcas e varejistas a divulgarem mais informações ao público. A edição de 2020 foi elaborada com colaboração técnica da consultoria ABC Associados, especializada em análise do desempenho e perfil de empresas no ramo da sustentabilidade empresarial.
Segundo a iniciativa, mais da metade das marcas e varejistas brasileiras que foram analisadas são pouco ou nada transparentes em relação às questões ambientais e sociais. De corpo com a publicação, 53% das 40 etiquetas analisadas pontuaram abaixo de 15% no ranking desenvolvido pelo Fashion Revolution. Para estipular a pontuação, considera-se: política e compromissos, governança, rastreabilidade, “conhecer, comunicar e resolver”, e problemas em destaque.
Na escala geral, 32% das marcas divulgam suas políticas e compromissos. Além disso, 24% compartilham as governanças e 25% deixam suas pegadas rastreáveis. Em 2020, o projeto destaca C&A, Malwee, Renner, Youcom e Hering, nesta ordem, como as cinco empresas brasileiras com maior transparência, atitudes sustentáveis e ética na moda.
Para a atual edição, foram adicionadas 10 novas empresas à pesquisa, entre elas: Lupo, Centauro, Netshoes, Puket, Di Santinni, Forum e Lojas Pompéia. No entanto, todas atingiram pontuações abaixo de 10%.
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Fernando Pimentel, presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (ABIT), aponta que os consumidores estão demonstrando mais interesse nos dados das empresas. Ele também destaca que vê “na base dos mais jovens uma preocupação crescente”.
O Fashion Revolution também falou com Cida Trajano, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Vestuário (CNTRV-CUT). A profissional destacou que o relatório é importante, pois incentiva as marcas a adotarem práticas que revelem sobre a origem e o desenvolvimento de um produto. Também é o que classifica como “respeito ao consumidor”, pois ele deve ter acesso às informações sobre aquilo que compra.
Transparência não importa apenas para a moda, mas para todas as áreas. Pimentel a coloca como um pilar fundamental de todas as relações. “Temos que caminhar para um mundo mais verdadeiro, de propósito e de valores”, afirmou. “Não adianta eu só comunicar, se a sociedade não valoriza”, completou.
Entre as áreas destacadas, os trabalhadores do setor também podem ganhar mais atenção das empresas. O ano de 2020 desencadeou consequências e já fragiliza grupos vulneráveis, sobretudo os trabalhadores. Além dos salários, as jornadas do expediente também devem ser analisadas. O Fashion Revolution aponta que a pandemia escancara ainda mais a desigualdade e as injustiças enraizadas na indústria da moda.
“Em São Paulo, por exemplo, a pandemia agravou a exploração de migrantes bolivianos, que se viram obrigados a produzir máscaras a R$ 0,10, enquanto costureiras passaram dois meses fechadas em uma oficina trabalhando 14 horas por dia e recebendo menos do que um salário mínimo. Além de violações trabalhistas, costureiras bolivianas, que geralmente estão sujeitas à violência doméstica, em momentos como este, ainda veem suas famílias correndo o risco de serem despejadas”, pontuou a instituição.
Em 2020, também foram incluídos no relatório novos indicadores para auxiliar no combate ao trabalho escravo. Por meio deles, a iniciativa observa que somente seis marcas divulgam dados sobre a existência de violações relacionados à praticas escravistas nas dependências dos fornecedores de matéria-prima. São analisadas, por exemplo, a liberdade de movimento restrita, a retenção de passaportes ou outros documentos dos funcionários, as horas extras forçadas, os salários retidos e a servidão por dívidas, além das queixas e reclamações de recrutamento.
Colaborou Sabrina Pessoa