Revendas de sneakers passam por queda; entenda
Altos preços, baixa variedade e produção massiva são causas para um declínio no mercado de segunda mão de tênis
atualizado
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Desde 2020, o mercado de sneakers tem vivido uma grande revolução, desde a produção até a forma de consumo dos calçados. Contudo, na virada de 2023, as revendas apresentaram uma queda considerável. Para algumas empresas, o atual declínio representa um possível fim; para outras, trata-se apenas de uma fase de estabilização.
Vem entender!
Recentemente, o Business of Fashion (BoF), portal de notícias dos negócios no ramo da moda, revelou uma queda no mercado de revendas de calçados colecionáveis. O material apresenta principalmente duas empresas europeias que declararam falência no fim de 2023, a francesa Kikikickz e a Restocks, sediada na Holanda.
De acordo com o BoF, o aumento na produção dos calçados do hype, como o Jordan 1, o Nike Dunk e o Adidas Samba, fez com que o mercado de revendas ficasse sem opções devido à quantidade de pares disponíveis dos mesmos modelos, consequentemente inflacionando o valor de revenda. Antes, a baixa oferta de silhuetas ou variações garantia a justificativa para a alta precificação na revenda dos calçados.
“Antes, era impossível revender Dunks por menos de três ou quatro vezes o preço [original]”, disse Yu-Ming Wu, ex-diretor de marketing da plataforma de revenda Stadium Goods e cofundador da Sneaker Con, ao BoF. “Hoje, você pode entrar em qualquer Foot Locker, em qualquer loja de varejo, e comprar Dunks ou Jordans no varejo – ou melhor ainda, em promoção, o que é uma loucura.”
Marcas contra revendedores
A alta demanda e “viralização” nas redes sociais dos calçados, antes considerados raros, podem ter sido fatores a influenciar as marcas a aumentar a produção dos modelos. Uma tática usada para aumentar o valor dos tênis foram as colaborações com artistas, designers ou marcas parceiras.
As collabs podem influenciar na valorização das peças em mercado, como foi o efeito nas inúmeras versões especiais do Nike Dunk. A publicidade dos relançamentos impulsionou a procura pelo sneaker, fazendo com que uma versão básica, apelidada de “Panda”, atingisse o ápice em 2022.
Nos últimos anos, o mercado de segunda mão, no segmento de tênis, passou por transformações entre os consumidores, principalmente em relação aos propósitos das revendas. Consequentemente, houve mudanças também na produção e na oferta das marcas. É o que explica Ricardo Nunes, colecionador de sneakers e criador do portal SneakersBR.
“Desde quem compra vinho, quem compra bonecos, figuras, cards… todas essas culturas que contêm algum nível de colecionável tem um mercado de venda paralela. No mercado de sneakers, isso sempre aconteceu. Em determinado momento, as marcas passaram a usar como um parâmetro de sucesso”, detalha à coluna. “O que aconteceu, de 2020 para cá, é que o mercado de revenda ganhou uma dimensão maior. Ao longo dos quatro últimos anos, as revendas se sobrepuseram à cultura”, avalia Nunes.
Contudo, o público passou a adquirir tênis como um investimento, não apenas para consumo próprio. Para não serem prejudicas pelo second hand, as etiquetas se adaptaram e tomaram medidas comerciais.
“Com o tempo, os tênis passaram a ser como commodities”, compara Nunes. “Com essa equação de oferta versus demanda, que na maioria das vezes não era tão justa, já que a escassez era um elemento que as marcas usavam para regular esse mercado, os valores aumentaram mesmo com o tênis em larga produção”, relata o colecionador.
Com o aumento da oferta e do valor dos calçados, os modelos que fossem para a revenda chegariam supervalorizados e, ainda assim, poderiam ser facilmente encontrados no preço do retail (primeira venda, no varejo) ou no próprio e-commerce das marcas. Com isso, os consumidores deixaram de procurar os revendedores após o drop dos tênis antes tão desejados, já que o estoque das marcas passou a se manter atualizado.
Desse modo, o valor de revenda ficou impraticável, com os tênis sendo vendidos pelo dobro ou triplo do preço para os consumidores. Em contrapartida, esse movimento possibilitou que varejistas pudessem ter os modelos em tendência nas prateleiras das lojas, aumentando a acessibilidade.
“A revenda é parte da cultura sneaker, acho que vão sobreviver os que se profissionalizaram mais. Estamos vivendo também uma acomodação nesse sentido, em que as pessoas estão priorizando o próprio gosto em vez de ter um tênis ultracaro só para se sentir pertencente a um grupo. Estamos voltando a um estágio em que o tênis é um componente importante na construção geral do estilo”, conclui Ricardo.
O futuro das revendas de sneakers
O impacto da queda não foi suficiente para quebrar os grandes revendedores, porém essas empresas buscaram alternativas para bancar as contas, antes pagas somente pelos sneakerheads. A gigante Stock X , que ficou famosa pela autenticação e revenda, por exemplo, surpreendeu os clientes ao adicionar copos Stanley no catálogo. A novidade também foi levada para outros campos, desde utensílios até eletrônicos.
Isso não significa que as revendas irão de fato acabar ou que os grandes revendedores estão prestes a cair. Neste momento, o mercado está passando por uma fase de estabilização e se reestruturando. Os próprios revendedores passaram a fazer uma curadoria sobre o produto a ser revendido em vez de trabalhar só com as peças do momento, dando espaço para marcas e modelos diferentes.
Variedade de estilos
Por mais que o público geral tenha se acomodado com os mesmos sneakers sendo repaginados, ainda há consumidores que buscam peças variadas e não tão convencionais. Foi assim que marcas como a francesa Salomon e a japonesa Asics ganharam evidência, assim como o retorno de itens clássicos, como a Timberland Yellow Boot.
Como resposta, as empresas que comandam o jogo dos sneakers estão prometendo novas silhuetas, a fim de renovar o estoque e atrair novos consumidores. Na verdade, novos modelos nunca pararam de ser lançados, mas a publicidade nos últimos tempos esteve voltada para os modelos tradicionais.
Após o hype do Samba, do Gazelle e do Campus, a Adidas está inovando com a ajuda do designer Jerry Lorenzo, conhecido pela marca Fear of God Athletics, agora como parte da Adidas. Por sua vez, a Nike parece estar trabalhando em modelos casuais com uma pegada esportiva, como o Air Max DN, que será a comemoração do Air Max Day, no dia 26 de março, e o Air DT Max 96, previsto para abril deste ano.