Saldo DFB 2019: evento pode inspirar empresários do ramo
Edição que comemorou 20 anos do projeto trouxe o entendimento sistêmico que o mercado precisa se encaixar nas mudanças do segmento
atualizado
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Muito se debate sobre a relevância que as semanas de moda têm perante a evolução no mundo fashionista. O sentimento de que tal formato é ultrapassado e já não atende completamente as necessidades do mercado é unânime, mas, em meio aos experimentos praticados nas fashion weeks ao redor do globo, muito pouco se avançou rumo à solução do problema.
Ainda não há uma receita de como adequar os eventos às mudanças no segmento, mas a edição 2019 do Dragão Fashion Brasil mostrou algumas propostas que podem ajudar a indústria têxtil.
Vem conferir os highlights do DFB 2019 comigo!
Entendimento sistêmico
Na sala de imprensa, em meio a uma solenidade de premiação que homenageou os colaboradores do DFB, Claudio Silveira lembrou que a moda não se trata apenas de roupas e tendências. Na visão globalizada do empresário, o segmento têxtil, atualmente, abrange além de suas cadeias produtivas, todos os tipos de artes e expressões.
Ao unir shows, apresentações de dança, exposições, palestras e workshops na programação, o idealizador conseguiu atrelar todas as ramificações do mercado têxtil local em uma só sintonia, movimentando mais de 100 mil pessoas na gigante estrutura erguida no Aterro da Praia de Iracema.
Direta ou indiretamente, as pessoas que frequentaram o evento foram contagiadas pela moda, mesmo aquelas que estavam ali apenas para ver um show ou companhia de dança. O resultado foi a sensação de que tudo e todos, mesmo sem querer, interagem com o mundo fashion. “O Dragão Fashion Brasil não é só moda. É um evento multicultural que engloba a cidade, as pessoas e todas as culturas que nela habitam. É a união de cada parte da cadeia produtiva em uma só iniciativa”, declarou.
A coleção-cápsula Rota Geri exemplifica bem o envolvimento sistêmico executado pelo DFB. Claudio percorreu a estrada até Jericoacoara, conhecendo o trabalho dos artesãos da região. Após selecionar seu favoritos, encomendou um compilado que reunisse estes talentos, o que deu representatividade aos produtores independentes que compõe a base do segmento.
Em um espectro ainda mais amplo, outra novidade desta edição foi o projeto DFB MoveModa, uma mostra competitiva de fashion films e curta-metragens com foco na moda autoral. O objetivo da iniciativa é revelar nomes do audiovisual, solidificando tais profissionais como ferramentas de fundamental importância aos novos moldes do mercado.
Espaço para iniciantes
O Concurso dos Novos, que premia as melhores coleções dos estudantes de moda ao redor do país, existe desde o início do Dragão, mas, em 2019, pode-se constatar um espaço maior destinado aos jovens talentos. Vitor Cunha, grande destaque do primeiro dia de desfiles, é prova disso.
No terceiro semestre do curso de design de moda, o estilista trabalhou na organização do evento em 2018 e, após demonstrar interesse em desfilar uma coleção e apresentar um projeto à curadoria, foi convidado a integrar a programação oficial sem custos.
Trade e business
Com uma estrutura de 27 mil m², a Cidade Autoral recebeu uma feira focada em economia criativa, com 60 expositores de todo o país. No mix de lojas, etiquetas com trabalhos conectados às novidades mais quentes do mercado e à sustentabilidade.
Além de vender os produtos diretamente aos frequentadores do evento, as marcas também atenderam pedidos de multimarcas e encomendas do atacado. Em paralelo, o DFB apoiou o Ceará Fashion Trade, uma feira com foco na interação comercial entre empresas e compradores nacionais e internacionais.
A importância do viés artístico
Uma das grandes críticas relacionadas às semanas de moda diz respeito ao caráter cada vez mais comercial dos eventos. Projetos como o New York Fashion Week e até mesmo o São Paulo Fashion Week são acusados de esquecerem o viés artístico da moda, privilegiando apenas trabalhos voltados ao prêt-à-porter.
Sem apresentações conceituais, tais iniciativas acabam perdendo peso, visto que trabalhos ricos em expressão oxigenam o olhar dos críticos e trazem uma nova visão sobre a produção têxtil. No Dragão Fashion, cada dia da programação traz um banquete de reinterpretações e frescor, com coleções lúdicas recheadas de subjetividade. Os fashionistas amam!
Moda como manifesto e expressão ideológica
Como expressão direta de nossa personalidade e sociedade, a moda é uma plataforma ideal para debater dilemas culturais, como vimos na passarela de Viktor & Rolf na Semana de Alta Costura. Contudo, com medo de prejudicar suas vendas, muitas marcas deixam os protestos de lado.
Entre os expectadores do Dragão, as expressões ideológicas são vistas com bons olhos, levantando a plateia. Sempre que um estilista traz um questionamento social em suas peças, os gritos ecoam nas salas de desfiles. Lindebergue Fernandes, presente na programação há 17 anos, é sempre um dos nomes mais aguardados do evento, justamente por sempre criticar o comportamento do brasileiro.
Imprensa e influencers de mãos dadas
Enquanto algumas iniciativas de moda do Brasil se afastam da imprensa especializada para se dedicarem apenas aos influenciadores digitais, a semana cearense consegue contemplar ambos, reconhecendo a importância de cada um e os respeitando como iguais.
De um lado, a rapidez e o impacto dos influencers e blogueiros. De outro, o potencial crítico de quem destrincha, analisa e documenta a evolução da moda brasileira há décadas, sem bairrismos e distinções.
Tendências são um ponto de partida
Ainda na solenidade de premiação, Claudio Silveira definiu autoral como “algo com identidade própria” e isso seu projeto tem de sobra. Em vez de reproduzir tendências, os estilistas que participam do DFB reinterpretam as novidades do mercado com muita brasilidade e personalidade.
Quem foi à semana de moda viu mangas bufantes em rendas e macramês, down jackets em estopa de linho, minibags de palha e um street style carregado com referências do nosso país. Foi revigorante ver a versão nacional das maiores trends da moda internacional.
Sustentabilidade
Transparência é palavra de ordem na indústria têxtil atualmente. Quem não se adapta a esse anseio da geração millennial, dificilmente sobreviverá muito tempo no mercado e o Dragão está atento a essa mudança. Além de destinar seu business às marcas que obedecem critérios sustentáveis de produção e consumo consciente, o evento promoveu ações de limpeza, visto que o Aterro da Praia de Iracema recebeu o projeto este ano.
Em parceria com a Enel, a fashion week realizou a coleta seletiva dos resíduos gerados, durante todos os dias do festival. A renda dos recicláveis foi destinada à ONG Edisca, que transforma a vida de crianças e adolescentes por meio da dança.
Investimentos públicos
Obviamente, o sucesso da edição de 20 anos do Dragão Fashion Brasil se deve à persistência e visão de Claudio e Helena Silveira nessas duas décadas de história, porém, a dupla só consegue colocar seus planos em prática graças ao apoio do Governo do Ceará, presente no projeto.
Élcio Batista, secretário-chefe da Casa Civil, prestigiou todos os dias do evento, enquanto a primeira-dama do estado, Onélia Santana, veste a camisa da moda local, perpetuando projetos com incentivos e colocando o mercado têxtil na pauta da administração pública.
Em seu discurso final, Claudio Silveira disse sonhar grande porque a moda cearense permite e pediu reconhecimento. “O Ceará é grande e merece o respeito do país”, afirmou. De fato, é possível ver como o empresário transformou seu projeto em um exemplo para o setor fashion nacional, deixando a sensação de que a indústria que ele representa, realmente, requer mais prestígio e atenção. Vida longa ao Dragão Fashion Brasil. Que venham mais 20 anos!
Colaborou Danillo Costa