No Dia do Alfaiate, conheça designers com belos trabalhos no Brasil
Esses profissionais aliam tecnologia e tradição no resgate do ofício
atualizado
Compartilhar notícia
Nesta quinta-feira (6/9), comemora-se o Dia do Alfaiate. A coluna conversou com alguns dos principais brasileiros da indústria para saber um pouco mais sobre a história e o dia a dia desses profissionais, os quais acreditam que os avanços tecnológicos ajudam a manter a atividade viva.
Vem comigo saber mais!
Valorizar a mão de obra é sempre louvável e, quando o assunto é moda, muito devemos aos alfaiates. A pressa do fast fashion, além da produção em grande escala, prejudicou algumas profissões que hoje estão escassas. Com toda a tecnologia atual, esquecemos aqueles responsáveis pelo cuidadoso e delicado trabalho manual. Alguns, encarregados da costura e do desenho sob medida de camisas, ternos, smokings e da maioria das peças formais do armário dos homens, resistem ao tempo e utilizam as novas técnicas como aliadas.
Os alfaiates são a versão masculina das costureiras: consertam peças e trabalham de forma personalizada com estilo e sofisticação. Durante o Renascimento, entre os séculos 14 e 17, trabalhar com roupas exclusivas e de modelagem rente ao corpo se tornou uma arte. No entanto, foi somente no século 18 que a alfaiataria ganhou força, quando os homens passaram a se vestir de forma mais refinada. Grande parte desse crédito vem de Luís XIV, o rei da França que valorizou a moda e “criou” o salto alto.
Com o tempo, o referencial da elegância moderna abandonou as perucas brancas com cachos e ganhou um aspecto menos ostensivo. Os homens passaram a usar cabelos curtos, roupas com menos bordas e babados, cada vez mais próximas do estilo minimalista. Ainda assim, a profissão continuou associada ao status de luxo.
No Brasil, a alfaiataria chegou junto com a corte portuguesa. Um dos maiores movimentos emancipacionistas da história do país, a Conjuração Baiana, em 1798, ficou conhecido como a Revolta dos Alfaiates, graças ao grande número de representantes dessa categoria no levante.
A evolução das tendências desde o início do século 20 contribuiu para que o vestuário masculino se expandisse até opções mais casuais. O traje passeio completo deixou de ser a principal referência da moda entre homens, ficando reservado apenas a ocasiões mais formais. Mesmo assim, há quem não dispense um belo terno no dia a dia.
Hoje, o país tem fortes destaques no ramo. Um deles é o paulista João Camargo, dono da Camargo Alfaiataria. Para ele, o alfaiate é o maior elo que o homem tem com a moda. “Quando o homem se preocupa em se vestir e se olha no espelho, discute sobre a roupa, sobre o corpo e acaba se cuidando mais”, constata.
Camargo veio de uma longa experiência com outras marcas, como Brooksfield, Bruno Minelli e Ricardo Almeida. Em 2005, criou o próprio negócio – Brasília foi a segunda cidade a receber uma loja. O costureiro seguiu o ofício do pai, quem acompanhava desde os 11 anos de idade. Para ele, essa arte sempre foi evoluída no Brasil.
Da década de 1950 até a de 1980, foi o auge desse ofício, pois você só conseguia ter um terno ou costume sendo de um alfaiate
João Camargo
João é o responsável por uma das marcas que agregam luxo ao lifestyle do homem moderno brasileiro. “A Camargo Alfaiataria não foi criada simplesmente para oferecer um terno com ótimo acabamento e bons tecidos. Fazemos roupas para favorecer o cliente, vendendo comportamento, design, estética e, principalmente, cultura de moda masculina”, frisa o estilista.
Uma de suas atuações mais fortes é no mercado para casamentos. A experiência como vendedor foi um dos fatores que trouxeram diferencial para o trabalho do designer, o qual criou uma relação com os clientes e descobriu a melhor forma de atendê-los.
O uruguaio Maurício Placeres também aprendeu o trabalho com o pai. Atualmente, ele é dono da marca homônima, com base em Porto Alegre e sucesso no Sul do país. Ainda na escola, o futuro designer não se incomodava em usar terno e gravata, ao contrário dos colegas. Para ele, era um prazer.
Na sua opinião, a alfaiataria francesa mistura o melhor da britânica e da italiana: a etiqueta e o desejo de estar bonito.
“Hoje, nós vestimos todos os nossos clientes sempre pensando na estética final, não somente em oferecer o que o cliente pede. Muitas vezes, eles desejam algo e termino não fazendo, pois não tem a ver com a minha marca e a identidade que venho construindo”, explica.
Outras grandes influências de Placeres são a máfia, movimentos sociais, militarismo e vilões de cinema. Segundo ele, esses personagens são mais bem-vestidos do que os “mocinhos”. “Tudo isso me nutriu bastante, minha história com a alfaiataria tem um pouco da questão de casa e a vontade de oferecer isso aos demais”, avalia.
De acordo com o estilista, a alfaiataria está bem representada no Brasil, mas há marcas mais interessadas em comercializar do que oferecer bons produtos e trazer algo fora do convencional.
“Os criadores daqui pensam primeiro nos clientes e depois neles, o que torna as coisas perenes. Se você construir uma identidade forte baseada em conhecimento, as pessoas vão continuar seguindo, e vão aparecer outras. Você não precisa fazer um esforço gigantesco de mudar a cada temporada”, assegura.
Além disso, a tecnologia não é inimiga de Placeres. Misturada à tradição, virou seu ideal. Alguns processos ainda precisam do trabalho manual, enquanto as máquinas podem agilizar a finalização das peças e atender a uma demanda maior em menos tempo.
“Se a sua intenção é espalhar a alfaiataria e a ideia de se vestir bem, escolhendo cada detalhe e podendo ter um traje que você diga que foi uma cocriação, com você participando de todo o processo, não tem por que não pensar em tecnologia”, defende.
De acordo com ele, até mesmo os tecidos diferenciados existem devido ao avanço da tecnologia ao longo dos anos. Nesse ponto, Camargo concorda: “Graças à tecnologia, esse ofício está retornando, abrindo novas alfaiatarias, conseguindo ter o primor e o capricho das mãos, remetendo à personalização”.
Placeres acrescenta que entender os clientes é fundamental para a entrega de um bom resultado. “A importância da profissão [de alfaiate] para o homem é algo impagável, e muitos ainda não percebem isso”, observa. Felizmente, ele acha que ainda há uma boa parcela pagando por isso.
“Existem relatos da máfia em que o mafioso pedia conselhos enquanto fazia a prova dos seus trajes. É um momento quando a pessoa se sente vulnerável, porque está de cueca. Isso abre uma porta para confiança”, opina o designer.
“Esse símbolo que era o alfaiate se perdeu porque os vendedores não estão nem aí. Vão pensar na cota e oferecer qualquer coisa, para eles receberem uma meta e uma comissão melhor. Já o alfaiate, não. Isso me apaixona e me leva a ser o que eu sou”, conclui Placeres.
Ternos para a Copa
Ricardo Almeida é o nome mais conhecido da alfaiataria nacional. Atua há mais de três décadas e vestiu personalidades como o ex-presidente Lula, Roberto Justus e diversos atores globais. Já foi um dos principais destaques do São Paulo Fashion Week e o responsável por criar os trajes sociais das aparições oficiais da Seleção Brasileira nas últimas duas Copas do Mundo.
“Esse oficio é a nascente do meu trabalho. Em outros países, principalmente na Europa, a alfaiataria é intrínseca na cultura”, observa. O designer destaca que, no Brasil, a demanda é maior para o ambiente corporativo e ocasiões especiais, mas pode ir além.
“A minha missão é colocar a alfaiataria no dia a dia do brasileiro, mostrar que ela pode ser ressignificada, desconstruída e usada em qualquer momento”, propõe.
Para os ternos da Copa do Mundo 2018, escolheu o azul-marinho como a grande aposta. O trabalho resultou num mix entre descolado e chique. Com referências às formas geométricas do movimento construtivista russo, homenageou os troféus conquistados pelo Brasil nos campeonatos anteriores.
Segundo Ricardo, foi uma honra ser escolhido pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF): “A seleção não se apresentava de forma condizente com a sua importância e grandeza. Sempre quis que passassem a vestir alfaiataria, do mesmo jeito elegante com o qual as seleções europeias se apresentam”.
Tecnologia e moda
Falei tanto sobre tecnologia e, agora, chegou a vez de um bom exemplo do encontro entre alfaiataria e os novos métodos de unir a arte manual e as máquinas. O grupo Reserva lançou em julho a Oficina Reserva, marca que trabalha com camisaria social sob medida a partir de um algoritmo capaz de formatar o melhor desenho de acordo com as medidas de cada cliente. Além do atendimento personalizado, a novidade possibilitou a criação de designs destinados a um número grande de perfis.
“Criamos um algoritmo que faz peças a partir de medidas corporais. Medimos, ao longo de três anos, milhares de clientes, e isso nos deu a base para o desenvolvimento da nossa coleção de produtos ready-to-wear. Nossa modelagem é muito assertiva, pois é baseada na medida de todos esse clientes, que são o perfil real do brasileiro”, explicou Felipe Siqueira, CEO da marca.
Ao longo do processo, Felipe viu a necessidade de roupas básicas como complemento do guarda-roupa masculino. “Nossa produção se divide em produtos sob medida, em que cada peça é produzida individualmente para o cliente. Temos um processo que mistura alta tecnologia e produção artesanal, e resulta em uma peça incrível. Nas peças ready-to-wear, nosso foco de produção está no acabamento, matéria-prima e modelagem.”
O negócio já atua no Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e Brasília. Por aqui, um cliente que desejar o atendimento personalizado pode solicitar uma visita do consultor em casa ou no escritório. A primeira loja abriu na capital fluminense.
Na moda contemporânea internacional, destacam-se Giorgio Armani e Hugo Boss.
Para outras dicas e novidades sobre o mundo da moda, não deixe de visitar o meu Instagram. Até a próxima!
Colaborou Hebert Madeira