No Brasil, conglomerados de moda tentam sobreviver à pandemia
Donos das marcas Ellus, Alexandre Herchcovitch, Bobstore, Rosa Chá, John John, Bo.Bô e Dudalina recorrem a negociações para evitar falência
atualizado
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Os grupos Inbrands e Restoque, proprietários de etiquetas como Ellus, Alexandre Herchcovitch, Bobstore, Le Lis Blanc, Rosa Chá, John John, Bo.Bô, Dudalina, Richards, VR e Salinas, são os mais novos gigantes da indústria têxtil a ruírem perante os efeitos da pandemia. Depois do Inditex, detentor da Zara, anunciar um prejuízo histórico e o fechamento de 1.200 lojas, os maiores conglomerados do Brasil agora recorrem aos acordos financeiros na tentativa de se manterem em pé.
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No início de abril, Fernando Pimentel, presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), adiantou à coluna que a pandemia resultaria em uma crise sem precedentes para o setor, afirmando que “não há dicas” de como superar os impasses gerados pela Covid-19. Dois meses após a análise, os maiores conglomerados do varejo brasileiro já demonstram os primeiros sinais de declínio.
A fim de evitar uma possível falência, tanto o Inbrands (Ellus, Richards, VR, Salinas, Alexandre Herchcovitch, Mandi, Bobstore e Tommy Hilfiger Brasil) quanto o Restoque (Le Lis Blanc, Dudalina, John John, Bo.Bô, Rosa Chá, Individual e Base) decidiram entrar com pedidos de recuperação.
Incertezas no Inbrands
Segundo informações do Estado de São Paulo, o grupo paulistano Inbrands contratou um escritório de advocacia para ajudar na negociação de suas dívidas que, antes mesmo da pandemia, somavam mais de R$ 500 milhões. Na Justiça, o conglomerado deve tentar delongar alguns parcelamentos feitos com instituições credoras e reestruturar um acordo financeiro firmado com os ex-sócios da companhia.
Criada em 2008, a partir da associação dos empresários Nelson Alvarenga e Americo Breia com o fundo de capital privado Vinci Partners, a holding nasceu com o objetivo de liderar a moda nacional por meio da aquisição de labels bem posicionadas no mercado. À época, as classes emergentes se mostravam atraentes em meio ao crescimento econômico.
A equipe de investidores privados liderada por Gilberto Sayão dirigiu os negócios do grupo até 2017, mas a recessão econômica dos anos anteriores deixou a empresa em uma situação insustentável. Os fundadores da Ellus decidiram, então, retomar a administração do negócio, desfazendo a sociedade com a Vinci.
Na transação, ficou estabelecido que o fundo venderia sua parte no Inbrands por R$ 200 milhões, a serem pagos até 2021. No entanto, a pandemia e o distanciamento social renderam prejuízos que impedirão o Inbrands de quitar o débito.
O conselho de diretores do conglomerado estaria tentando renegociar a dívida. Durante as assembleias de acionistas de abril e maio, o quadro administrativo revelou barganhas para postergar pagamentos e amortizações de dívida. Porém, com a ex-parceira resistindo às condições oferecidas, planejar uma reestruturação se tornou uma missão impossível.
Sem sucesso na conciliação, os donos da Ellus podem tentar buscar ajuda na Justiça, noticiou o Estadão. O jornal paulistano apurou que pelo menos dois escritórios de advocacia já foram consultados pelo grupo. Todavia, à coluna Ilca Maria Estevão, o diretor administrativo e financeiro do Inbrands, Luís Carlos Meloni, desmentiu o veículo.
“Tomamos conhecimento da matéria veiculada pelo jornal O Estado de S. Paulo e esclarecemos que não procede a informação de que a companhia está em preparação para um eventual pedido de recuperação judicial. Aproveitamos para reforçar nosso compromisso com a transparência e divulgação de dados sobre nossos negócios e atividades”, respondeu, em nota.
De acordo com o Valor Econômico, as sondagens foram feitas com o objetivo de montar uma reestruturação longe dos tribunais, por meio de negociações extrajudiciais. A publicação econômica lembrou que o Inbrands vinha conseguindo se reerguer após a crise de 2016.
Depois de registrar prejuízos em 2018, o conglomerado reorganizou suas operações, fechou de unidades deficitárias e cortou custos. Como resultado, terminou o ano passado com R$ 25,6 milhões em caixa.
Esperança na Restoque
Presente no mercado brasileiro desde 1982, a Restoque não demorou muito para apostar na recuperação extrajudicial. No início do mês de junho, a dona da Le Lis Blanc divulgou um plano que envolve a renegociação de R$ 1,5 bilhão em dívidas e um aumento de R$ 150 milhões em seu capital.
“Fizemos um trabalho muito artesanal e conseguimos protocolar a primeira recuperação extrajudicial desde que começou a crise”, comemorou o vice-presidente executivo de atacado do Santander, Mário Leão, ao Valor Econômico.
A negociação dá ao grupo mais prazo para o pagamento das despesas, incluindo uma carência de 12 meses para o acerto dos juros. A Planner Trustee é a credora mais impactada pelo acordo, visto que tem mais de R$ 1 bilhão a receber. Os bancos Santander, Bradesco, Votorantim, ABC Brasil, Fibra e Rendimento também são citados no documento que sanciona a negociação.
Curiosamente, a adesão à proposta foi de 70%, 10 pontos percentuais a mais do que apontavam os mais otimistas. “Conseguimos costurar uma saída viável para a empresa, em vez da solução supostamente mais simples, que seria a recuperação judicial. Vamos transformar a Restoque em um case de sucesso”, afirmou o representante do Santander.
A instituição espera que outras companhias vejam no acordo da Restoque uma referência na hora de decidir o que fazer com as finanças. Os advogados do grupo relataram ao Money Times que, graças ao plano, a empresa tem condições de retornar rapidamente à normalidade.
“Com todos esses ativos tangíveis e intangíveis, uma vez retomadas as operações de comércio, a companhia poderá rapidamente voltar a operar um modelo de negócio saudável a longo prazo”, comentou um representante do escritório E. Munhoz Advogados ao veículo.
O Restoque tem 255 lojas próprias e mais de 1,5 mil pontos de venda, além de estar presente em 31 outlets. A empresa revela ter pelo menos 550 mil clientes ativos, tendo 5% de participação no vestuário nacional.
Onda de renegociações
Para Douglas Duek, especialista em recuperação de negócios em crise na Quist Investimentos, os setores de moda, turismo e veículos foram os mais impactados pelo distanciamento social e devem inflar a demanda por renegociações administrativas ou judiciais junto às instituições credoras. “Tenho visto o total de consultas se multiplicar por três. Acredito que, entre agosto e setembro, vamos ver esse movimento se transformar em uma onda de recuperações judiciais. As empresas precisarão de tempo para reorganizar suas operações ”, lamentou ao Estado de São Paulo.
Colaborou Danillo Costa