Moda sustentável e circular: conheça a marca brasiliense Ponto 1
Com foco na sustentabilidade, a etiqueta produz peças reaproveitando resíduos sólidos da indústria têxtil, calçadista e construção civil
atualizado
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Na última década, a sustentabilidade entrou para a lista de temas que mais engajam a indústria, a economia e os consumidores. Mas o que é, de fato, sustentável? Para a etiqueta Ponto 1, a resposta para o questionamento carrega pouca complexidade: tentativa, erro e muito estudo. Com foco no reaproveitamento de resíduos sólidos da indústria têxtil, calçadista e construção civil, a marca produz peças com design inovador e esbanja originalidade. Na série Moda Brasília deste sábado (18/12), a coluna conversou com Sandra Lima, sócia-fundadora da marca.
Vem conferir!
Os caminhos de Sandra Lima e Lurdinha Danezy foram entrelaçados pelo propósito que partilham: a conscientização na moda. Juntas, fundaram em 2021 a Ponto 1, marca cuja motivação vai além de produzir peças de vestuário feminino. “Eu acredito em uma moda que educa e abre os olhos para os impactos que vão além do consumo”, pontua Sandra.
A dupla soma expertises em segmentos diferentes. Sandra Lima faz parte da safra de talentos lançados pelo Capital Fashion Week. Pedagoga de formação, ela encontrou na moda um lugar para trazer reflexões sobre sustentabilidade. Lurdinha Danezy, por sua vez, é artista plástica e designer de joias. Interessada pelo ciclo de vida dos materiais, iniciou no universo da joalheria pesquisando sobre o processo de deterioração do ferro para a criação de suas peças.
As artistas se conheceram durante um evento de moda em Brasília. Com interesses e trajetórias complementares, a afinidade foi instantânea. Indo além dos pilares que conectam os trabalhos, elas somam conquistas no portfólio: Sandra teve suas obras expostas no Museu de Arte Moderna de São Paulo e Lurdinha foi premiada em Basel, na Suíça, pelas peças de joalheria conceituais.
Unindo arte, economia e comprometimento com a natureza, o duo fundou a Ponto 1. Para a criação das peças, a etiqueta reaproveita resíduos sólidos. “Na confecção das roupas usamos bancos de tecidos e visamos o corte utilizando total reaproveitamento. Os acessórios são criados a partir de materiais diversos descartados no lixo, como metais, plástico e papel”, explica Sandra.
Prenúncio de Eve
No início do mês, a Ponto 1 lançou a coleção “Prenúncio de Eve”. O conceito por trás das peças foi Eve, a mulher que busca se libertar dos padrões estéticos que amoldam o corpo segundo os apelos emergentes da sociedade contemporânea. Para a produção, as artistas foram buscar em seus ateliês tecidos, aviamentos, materiais inusitados e roupas guardadas no fundo do armário.
A linha segue uma paleta de tons sóbrios, como preto e cinza. Com fluidez e movimento, a marca apresentou propostas de blazers desconstruídos, vestidos com recortes e blusas oversized. Arrematando, os acessórios desenhados por Lurdinha Danezy brilharam nas produções.
Confira entrevista com Sandra Lima, da marca Ponto 1:
Como você define a sustentabilidade na moda?
Sandra Lima: É fazer uma peça de roupa que dure mais. Indo além disso, é necessário que tenha um processo mais perene, que a decomposição da peça gere menos impacto e exista uma logística reversa. De nada adianta fazer tudo certinho e não se preocupar em como aquela peça será eliminada. É complexo, exige estudo e muito tempo de testes e adaptações. Em resumo, a sustentabilidade engloba desde o processo de produção até o descarte.
Considerando essa visão, qual a relação da marca com a sustentabilidade?
Primeiramente, acho que sustentabilidade é um termo que traz consigo muitos pilares e questões. É muito mais complexo do que simplesmente utilizar tecidos menos poluentes, por exemplo. Na Ponto 1, temos a autenticidade como assinatura.
Procuramos ser responsáveis em todo o processo da construção da peça e utilizamos a técnica segunda pele, para evitar o desperdício de tecidos. A maior parte da nossa matéria-prima são tecidos que já existem no mundo, sobras de fábricas e outros ateliês. Temos a consciência de que se trata de uma engrenagem complexa, mas estamos tentando subverter a ordem.
Como são pensadas as coleções?
Tanto eu quanto a Lurdinha utilizamos a modelagem de solo na etapa de concepção das peças. Não seguimos um calendário de estação, mas em nossa última coleção, por exemplo, as peças foram pensadas para o outono/inverno. Toda a parte de produção é feita pós-desfile. Como somos uma marca pequena, fazemos as roupas sob encomenda e não produzimos em grande escala — considerando que as nossas matérias-primas são tecidos reaproveitados e toma um tempo maior para a produção.
As peças da Ponto 1 são mais conceituais e possuem modelagens amplas. Como foi definido o estilo da marca?
Consideramos o corpo como um suporte para sustentar as criações. Desde o meu início na moda, sempre tive um perfil mais conceitual. No Capital Fashion Week, por exemplo, o mestre Jum Nakao definiu o meu trabalho como “Roupas-obra”. Continuo a investir nas silhuetas intrigantes, apostando na modelagem tridimensional e agregando texturas com a utilização de materiais inusitados. Mas, na Ponto 1, trago o equilíbrio das minhas referências. Aposto nas modelagens arrojadas, mas busco o meio-termo entre a densidade e a trivialidade com o intuito de apresentar criações mais compreensíveis aos consumidores.
Qual é a assinatura da marca?
O nosso trabalho é um processo de resgate: desconstruímos uma calça, arrancamos uma manga, viramos a gola, aproveitamos um botão. Nós temos a nossa própria identidade, não copiamos outras criações e, quando vamos usar um peça que já existe, repaginamos com a nossa visão. Acredito que isso nos torna mais autênticas e procuramos conquistar um público que tenha essa conexão com as bandeiras que levantamos.
Série Moda Brasília
A coluna Ilca Maria Estevão deu início à série Moda Brasília em 2021. Toda semana, apresentamos marcas, designers e etiquetas locais, a fim de dar ênfase à moda criada no Distrito Federal e no Centro-Oeste.
O objetivo é apresentar iniciativas e empresas que atuam em prol da cadeia produtiva regional de maneira criativa, sustentável e inovadora. Os nomes são selecionados de forma independente pela equipe da coluna, a partir de critérios como diferencial de mercado, pioneirismo e ações que valorizem a comunidade.
Colaborou Marcella Freitas