#MeToo: movimento que ganhou destaque com a moda toma força na China
O caso da jovem Zhou Xiaoxuan se tornou um símbolo da luta contra assédios sexuais no país asiático
atualizado
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A edição de 2018 do Globo de Ouro foi histórica. Na cerimônia, mulheres de Hollywood usaram looks inteiramente pretos como forma de protesto contra o machismo. As reinvindicações foram pelo fim de casos de assédio, estupro e desigualdade salarial. O episódio representou um gesto de sororidade no auge das denúncias contra o criminoso sexual atualmente condenado Harvey Weinstein. Entre as adeptas, estão personalidades como Natalie Portman, America Ferrera, Meryl Streep, Emma Watson, Reese Witherspoon e Eva Longoria.
Desde então, o movimento #MeToo só ganhou força em todo o mundo, inclusive no Brasil. Transformou-se em uma nova era, antecedida pela antiga luta feminista. Recentemente, a China se tornou espaço para diversas alegações de má conduta de homens poderosos de diferentes áreas, como da mídia, moda, dos esportes e negócios em geral.
Ainda incipiente na China, o #MeToo ganhou uma representante corajosa em 2018. Zhou Xiaoxuan – também conhecida como Xianzi – denunciou Zhu Jun, um dos apresentadores de TV mais conhecidos do país, levando-o à Justiça ao acusá-lo por um assédio sexual que teria ocorrido em 2014. Na época, ela era estagiária.
Quando a jovem, que atualmente tem 27 anos, relatou o caso à polícia, ela foi desencorajada e ouviu que poderia prejudicar a imagem de Zhu e “ferir os sentimentos daqueles que o admiravam”, de acordo com o The Guardian. Segundo especialistas ouvidos pela BBC, é raro na China que casos parecidos cheguem a esse patamar, já que os riscos são altos em uma cultura considerada patriarcal.
De acordo com a organização local Centro de Desenvolvimento de Gênero Yuanzhong, de Pequim, apenas 34 processos foram relacionados a assédio sexual entre 2010 e 2017 na China. Desses, somente dois foram trazidos por vítimas que processaram assediadores. Contudo, ambos constaram com “falta de provas”.
No fim de 2020, houve uma audiência não pública para o caso de Xianzi. Ela disse à BBC que nunca se arrependerá de ter tomado uma atitude. “Se eu ganhar, isso vai encorajar muitas mulheres a se apresentarem e contarem suas histórias; se eu perder, continuarei apelando até que a justiça seja feita”, afirmou no dia 2 de dezembro.
Veículos internacionais informaram que mais de 100 pessoas – sobretudo mulheres – reuniram-se em frente ao Tribunal Distrital de Haidian, em Pequim, para declarar apoio à jovem chinesa por meio de manifestações. Depois de cerca de 10 horas no tribunal, o julgamento foi adiado. O apresentador Zhu Jun nega o assédio.
A woman in China who says a TV host sexually harassed her when she was an intern in 2014 took her case to court.
Zhou Xiaoxuan says police asked she drop the claim to save the TV station’s image. She hopes to inspire other survivors: “Whether we win or lose… it has meaning.” pic.twitter.com/BWzB6VDFEn
— AJ+ (@ajplus) December 2, 2020
Today, in Beijing and in Hong Kong, young people outside of the courthouse. (Photos from @roseluqiu) pic.twitter.com/0BqVGu6Lua
— Yaqiu Wang 王亚秋 (@Yaqiu) December 2, 2020
Outside of Haidian People’s Court, Beijing. “We ask for an answer from history”. pic.twitter.com/VKtpRChkWK
— Caiwei Chen (@CaiweiC) December 2, 2020
No processo, Xianzi exige que o acusado peça desculpas publicamente e desembolse US$ 7.600 por danos. “O caso tinha 99% de probabilidade de terminar em derrota, mas como todos estavam persistindo fora do tribunal, os juízes pelo menos atrasaram o resultado, então, temos outra chance de 1%”, disse uma fonte ao Washington Post. “É difícil conseguir um julgamento justo e aberto na China, mas Xianzi mostrou que você pode escolher o caminho legal. Você pelo menos tem uma chance, mesmo que não seja grande”, acrescentou.
Segundo especialistas, o fato de o tribunal ter aceitado o caso já é bastante significativo. Para a militante feminista Lu Pin, ainda há um longo caminho pela frente. “A sociedade chinesa mudou desde o movimento #MeToo? Não sei dizer”, disse ao veículo norte-americano. “Mas, 20 anos atrás, a sociedade era intencionalmente ignorante ou negava agressivamente o assédio sexual e a cultura do estupro. Hoje, pelo menos, forçamos o debate.”
Colaborou Rebeca Ligabue