Grifes como Dolce & Gabbana, Etro e Jacquemus retomam desfiles presenciais
Etiquetas de luxo optaram por normalizar suas apresentações, recebendo clientes, influenciadores e jornalistas em shows físicos
atualizado
Compartilhar notícia
Após um período de incertezas, as semanas de moda de Paris, Milão e Londres foram a público afirmar que voltarão ao formato presencial em setembro, depois de recorrerem às plataformas digitais para exibir os lançamentos programados para julho. Todavia, algumas etiquetas decidiram não esperar tanto tempo para normalizar suas apresentações. Enquanto as italianas Dolce & Gabbana e Etro investiram em shows físicos, na última quarta-feira (15/7), com dezenas de modelos e convidados, a francesa Jacquemus realizou uma exibição majestosa em um campo de trigo para pelo menos 100 repórteres e influenciadores, no dia seguinte. A Louis Vuitton, próxima casa a recorrer ao formato, projeta seu retorno às passarelas para 6 de agosto, em Xangai.
Vem comigo saber mais!
Com a propagação do novo coronavírus, os eventos dedicados ao menswear e à alta-costura, que normalmente acontecem entre junho e julho, chegaram a ser cancelados. No entanto, após especialistas começarem a questionar a capacidade de reinvenção das semanas de moda, com grifes de grande importância ameaçando abandonar as plataformas, as organizações responsáveis pelas fashion weeks deram o braço a torcer, investindo em ações virtuais.
Em meio ao anúncio das programações on-line, a Federação de Alta-Costura e Moda, na França, e a Câmara Italiana de Moda garantiram o retorno dos desfiles presenciais na próxima temporada de primavera/verão 2020. Porém, etiquetas como Dolce & Gabbana e Etro optaram por reviver os desfiles físicos já durante a versão digital da semana de moda de Milão. Nas redes sociais, a decisão dividiu opiniões. Apesar de a situação da Covid-19 estar menos alarmante na Europa, alguns usuários consideraram a atitude desrespeitosa e irresponsável devido à pandemia global.
Etro
A Etro, marca italiana dirigida por Verónica e Kean Etro, foi a primeira grife do mercado de luxo a realizar um desfile com plateia desde o início do isolamento social. No total, 80 pessoas conferiram a apresentação, que exigiu o uso obrigatório de máscaras, distância entre as cadeiras e medição de temperatura. Não à toa, a etiqueta escolheu fazer o show o ar livre, também como medida de segurança. O local escolhido foi o jardim do Four Seasons Hotel, em Milão.
“Estamos vivos e ao vivo. É um ato de coragem que vem do coração. Quisemos trazer de volta vida e energia à nossa cidade”, declarou Kean Etro em uma coletiva de imprensa após o show. O estilista e sua sócia trabalharam juntos durante a quarentena para desenvolver o compilado apresentado nesta semana. Todas as peças foram fabricadas dentro da Itália, por meio de artesãos que se prontificaram a trabalhar durante a pandemia. “O senso de comunidade foi emocionante”, disse Veronica.
O compilado de primavera/verão 2021 traz o estilo retrô característico da label ao mundo moderno, por meio de truques de styling e modelagens esportivas que dão uma nova cara às produções. A rica paleta de cores e o mood boêmio foram trabalhados no intuito de revelar as diferentes interpretações que as roupas oferecem, de acordo com as pessoas que as usam.
“É como se convidados de diversas procedências estivessem entrando no hotel, com suas histórias únicas e riqueza de memórias, com várias experiências para compartilhar”, explicou Veronica. Dessa forma, cada look foi montado para complementar a personalidade dos modelos.
Focada em peças diurnas, a coleção fugiu da pretensão e buscou refúgio na sustentabilidade. Além de utilizar tecidos feitos de eucalipto e garrafas pet recicladas, a dupla de diretores criativos apostou no upcycling, reaproveitando modelos de arquivo para dar vida às novas criações. “Ninguém quer roupas complicadas agora”, disseram eles.
Apesar dos esforços socioambientais, a marca enfrentou críticas sobre a escolha dos influenciadores que cobriram o desfile. O Diet Prada constatou que não havia nenhum negro entre os 24 nomes selecionados. “Estou farta. Isso tem de parar”, comentou Naomi Campbell na publicação feita pelo perfil do Instagram que denuncia os problemas da indústria têxtil.
Dolce & Gabbana
Aberto a 260 convidados, o desfile masculino de primavera/verão 2021 da Dolce & Gabbana tomou os gramados da Universidade Humanitas, em Milão, também na quarta-feira (15/7). Atualmente, a instituição trabalha no desenvolvimento de uma vacina contra o novo coronavírus, sendo patrocinada pela casa de moda.
Em março, os diretores criativos Domenico Dolce e Stefano Gabbana fizeram uma doação considerável para apoiar o programa de pesquisa do centro de ensino, com o objetivo de esclarecer as respostas a respeito de uma possível cura para a Covid-19. Alberto Mantovani, diretor científico da faculdade, foi um dos profissionais da saúde que abriram o show e tranquilizaram os presentes.
“Quatro meses depois, o programa contribuiu para um maior conhecimento da doença pelos profissionais italianos”, comentou o médico, na abertura do evento, antes de salientar as medidas de segurança impostas para o bem-estar dos clientes e parceiros que ali estavam.
Os espectadores, em sua maioria italianos, foram convidados a manter uma distância de 1 metro, além de se submeterem à aferição de temperatura e ao uso de máscaras e álcool em gel. Contudo, os 103 modelos que participaram do show não usaram o item de proteção durante a entrada a passarela.
Nos bastidores, antes abertos à imprensa, a entrada foi restrita aos cabeleireiros e maquiadores, todos equipados com máscaras e escudos de proteção. “Este dia pode servir como um lembrete de nossa determinação em seguir em frente”, disse um outro médico que introduziu a apresentação, sob uma placa que dizia “tudo vai ficar bem”.
Paul Hunter, professor de medicina da Universidade de East Anglia, relatou ao The Guardian que “todas as etapas adotadas pela Dolce & Gabbana foram sensatas e, certamente, reduziram o risco de infecções” no local. O maior problema, segundo ele, seriam os encontros que este tipo de ação proporciona. “As pessoas tendem a sair do desfile e se encontrar em bares e cafés. Esse tipo de socialização pode aumentar os riscos de transmissão”, afirmou ele, ao comentar sobre um pequeno coquetel realizado na cantina da universidade logo após o show.
“Não podemos imaginar um mundo sem desfiles ao vivo. Essa vitrine é fundamental, faz parte do sonho. Todos nós precisamos da presença dos designers, jornalistas e compradores, mas devemos começar devagar, respeitando totalmente as normas de segurança em vigor”, defendeu Domenico, um dos comandantes da grife, na ocasião.
A nova coleção da etiqueta é uma homenagem ao trabalho de Gio Ponti, arquiteto responsável por dar vida à ambientação do hotel Parco dei Principi, em Sorrento, no início dos anos 1960. Seguindo as tendências que começam a ser apontadas como as queridinhas do consumidor pós-coronavírus, a clássica alfaiataria da casa e as estampas de mosaico que deram o tom da coleção receberam um interessante contraste.
A união entre modernidade e neoclassicismo se deu pela pegada esportiva, ampla e confortável, com uma cartela de cores bem enxuta. Apenas tons de off-white e azul tiveram vez no compilado. Desenhos geométricos e tecidos mais estruturados, como jeans e linho, formaram a “arquitetura em forma de costura” estabelecida pela label.
Jacquemus
Assim como fez na celebração dos dez anos de sua label homônima, a grife Jacquemus levou seus convidados para um cenário campestre. No entanto, o roxo vibrante da plantação de lavandas visto na apresentação comemorativa foi substituído pela sobriedade dos vários hectares de trigo do Parque Nacional Regional Vexin, localizado a cerca de uma hora de Paris.
A locação caiu como uma luva na nova coleção do estilista francês, exibida junto a um toque de piano melancólico e uma cartela de cores naturais. Nos arredores da passarela de 600 metros instalada no campo, os 100 influenciadores e jornalistas presentes foram separados pelos próprios ramos de trigo, como expectadores da história do novo filme de Simon Porte Jacquemus. O designer costuma se inspirar no cinema francês para desenvolver seus compilados.
Batizado de L’Amour, o trabalho é “como um casamento simples no campo ou um festival da colheita”, como explicou Simon Porte Jacquemus à Vogue. Repleto de referências provençais, como cerâmica, toalhas de mesa e talheres de madeira, o trabalho canalizou a “típica indiferença francesa do sul”.
Os tons de sálvia, bege, preto e argila deram um aspecto reconfortante às peças mostradas, enquanto os decotes com alças de sutiã e os comprimentos cropped ressaltaram a feminilidade da mulher Jacquemus. Segundo o estilista, tal persona só é realmente conhecida em apresentações físicas.
“Para mim, a passarela não pode ser um vídeo. Isso está no coração do que fazemos e não é algo superficial. É importante para todos nós continuarmos, assim como um restaurante que reabre. É como um filme de um dia de verão. É a nossa vida”, defendeu Simon.
Louis Vuitton
A próxima casa de moda a revisitar o formato presencial será a Louis Vuitton. O diretor criativo da linha masculina da grife francesa, Virgil Abloh, avisou recentemente que sua nova coleção para a empresa será lançada em um desfile aberto ao público, em Xangai, no dia 6 de agosto.
Ao WWD, o designer adiantou que a grife do grupo LVMH irá entrar em turnê mundial, abandonando o cronograma de moda tradicional. O intuito é poder se libertar da obrigatoriedade de apresentar coleções em janeiro e julho.
O foco da primavera/verão 2021 da etiqueta, chamada de Mensagem na Garrafa, será a sustentabilidade. Trinta visuais serão criados com matérias-primas novas, 25 looks serão confeccionados com materiais reciclados e 25 serão feitos a partir de sobras da coleção anterior.
“O novo programa é, provavelmente, o maior salto que já dei em termos de renovação. É compilado mais artesanal, e mostraremos todo esse processo em um filme. Estamos em uma nova era”, adiantou o estilista.
Embora todas as casas que apresentaram desfiles presenciais no decorrer desta semana tenham alegado ter boas intenções ao retomar os shows físicos, as ações não agradaram a todos. Em uma postagem no Twitter, por exemplo, a blogueira Thereza Cristina, do Fashionismo, questionou as inciativas.
“Polêmica fashion do dia: a italiana Etro voltou com desfiles presenciais e está sendo criticada. Rolou um distanciamento social de leve, foi gente da Europa toda, meia dúzia usava máscara, e a pergunta que fica é: tem necessidade disso agora? Imagina em setembro”, escreveu a influenciadora.
Uma seguidora respondeu a publicação chamando atenção para as áreas onde não houve cobertura fotográfica. “O problema é o backstage. Imagina os maquiadores passando o mesmo pincel em várias modelos. Troca de roupa correndo, aquela aglomeração durante os minutos que o desfile realmente acontece, modelo se trombando…”. Será que o retorno ao formato tradicional será positivo para as etiquetas que investiram na tática?
Colaborou Danillo Costa